24/04/2020 - 9:27
Estudo realizado no Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista (IGCE-Unesp), em Rio Claro, identificou 19 asteroides do tipo Centauro de origem interestelar. Os Centauros são objetos que orbitam o Sol na região compreendida entre os planetas gigantes do Sistema Solar.
Artigo a respeito, intitulado “An interstellar origin for high-inclination Centaurs”, foi publicado nesta quinta-feira (23/04) na revista “Monthly Notices”, da Royal Astronomical Society. A pesquisa contou com apoio da Fapesp.
“O Sistema Solar formou-se há 4,5 bilhões de anos em um berçário de estrelas, com os seus sistemas de planetas e asteroides. A proximidade entre as estrelas favorecia fortes interações gravitacionais que levavam à troca de material entre os sistemas. Assim, alguns objetos atualmente no Sistema Solar devem ter-se formado em torno de outras estrelas. No entanto, até recentemente, não tinha sido possível distinguir os objetos interestelares capturados daqueles formados em torno do próprio Sol. A primeira identificação foi feita por nós em 2018”, diz a autora do estudo, Maria Helena Moreira Morais, à Agência Fapesp.
Graduada em física-matemática pela Universidade do Porto (Portugal) e doutorada em dinâmica do Sistema Solar pela University of London (Reino Unido), Morais é atualmente professora do IGCE-Unesp e realizou o estudo agora publicado em parceria com Fathi Namouni, pesquisador do Observatoire de Nice, na França.
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A primeira identificação a que Morais se refere, a do asteroide Ka‘epaoka‘awela, foi objeto de reportagem publicada na Agência Fapesp em 2018.
Sentido oposto
O nome Ka‘epaoka‘awela significa, em língua havaiana, “O travesso de Júpiter”, porque esse asteroide se mantém sempre próximo de Júpiter, mas orbitando o Sol no sentido oposto ao dos planetas. “Quando o identificamos como um objeto originado fora do Sistema Solar, não sabíamos se ele era um caso isolado ou membro de uma vasta população de asteroides imigrantes. No estudo mais recente, reconhecemos 19 Centauros de origem interestelar”, afirma a pesquisadora.
Assim como o Ka‘epaoka‘awela, os Centauros identificados na pesquisa têm órbitas muito inclinadas em relação ao plano orbital dos planetas. “Para investigar a origem desses objetos, construímos uma simulação computacional que funciona como máquina do tempo, fazendo retroceder suas trajetórias até 4,5 bilhões de anos no passado. Essa simulação permitiu-nos identificar onde esses objetos se encontravam naquela época”, explica Morais.
Os planetas e asteroides originados no próprio Sistema Solar formaram-se a partir de um fino disco de gás e poeira que orbitava o Sol. Por essa razão, todos eles se moviam no plano do disco há 4,5 bilhões de anos. Se os Centauros em questão tivessem se originado no Sistema Solar, eles também deveriam mover-se no plano do disco naquela época. “No entanto, nossa simulação mostrou que, há 4,5 bilhões de anos, esses objetos giravam em torno do Sol em órbitas perpendiculares ao plano do disco. E o faziam em uma região afastada dos efeitos gravitacionais do disco original”, informa a pesquisadora.
Essas duas observações mostram que esses Centauros não pertenciam originalmente ao Sistema Solar e devem ter sido capturados de estrelas próximas durante a fase de formação planetária.
Berçário de estrelas
A descoberta no Sistema Solar de uma população de asteroides de origem interestelar é um passo importante para compreender, por meio de futuras observações astronômicas e possivelmente de missões espaciais, as diferenças e semelhanças entre objetos formados no Sistema Solar e objetos vindos de fora. “O estudo dessa população poderá fornecer informação sobre o berçário estelar em que o Sol se formou, o processo de captura de objetos interestelares no Sistema Solar primordial e a importância do material interestelar no enriquecimento químico do Sistema Solar”, diz Morais.
Com relação ao enriquecimento químico, vale lembrar que o universo primordial era constituído essencialmente de hidrogênio e hélio. Os elementos naturais mais pesados que integram a tabela periódica formaram-se por fusão nuclear no interior das estrelas e se espalharam depois pelo espaço. A região em que se localiza o Sistema Solar foi enriquecida quimicamente por esses elementos, que ajudaram a compor o próprio corpo humano.