Uma batalha cotidiana está ocorrendo em Sydney e em subúrbios de outras cidades de Nova Gales do Sul (Austrália). De um lado, cacatuas que tiram tampas de lixeiras domésticas em busca de alimento. Do outro, humanos que não querem ver seus recipientes de lixo revirados.

A disputa já havia sido estudada em 2021, quando pesquisadores analisaram o comportamento dos pássaros e descobriram que eles aprendem a abrir as lixeiras observando outros que já fazem isso. Agora, os mesmos pesquisadores resolveram analisar o lado humano da questão. Eles descobriram que alguns moradores humanos de Sydney e Wollongong intensificaram seu jogo de proteção contra o lixo depois que as cacatuas-de-crista-amarela (Cacatua galerita) começaram a empurrar pedras e tijolos pesados colocados sobre as latas de lixo para retirar a tampa.

Barbara Klump, ecologista comportamental do Instituto Max Planck de Comportamento Animal (Alemanha) e líder do estudo, publicado na revista Current Biology, surpreendeu-se com as estratégias dos moradores para proteger suas lixeiras das cacatuas. “As cacatuas fazem muita bagunça quando abrem as lixeiras e tiram todo o lixo, então é claro que, compreensivelmente, os moradores locais não se divertem muito com isso.”

Proteção da lixeira, por humanos, contra cacatuas que conseguem abrir as tampas. Crédito: fornecido por Barbara Klump/Current Biology

Aprendizado dos dois lados

A dificuldade é encontrar uma forma de impedir que a cacatua vasculhe o lixo sem interferir no trabalho dos garis – ou seja, a tampa da lixeira ainda deve ser capaz de abrir o suficiente para que seu conteúdo seja despejado no caminhão no dia da coleta. “Assim, os moradores começaram a proteger suas lixeiras e a usar uma variedade de medidas diferentes para tentar manter essas cacatuas fora (…) no que chamamos de ‘corrida armamentista de inovação’ entre as cacatuas e as pessoas”, disse Klump.

Segundo o dr. Richard Major, ecologista do Museu Australiano e coautor do trabalho, o novo estudo mostrou o aprendizado social tanto do lado das aves quanto do humano. “Modificamos um ambiente e as cacatuas exploraram esse ambiente e se adaptaram muito bem à vida com humanos. Agora estamos vendo humanos se adaptando a viver com eles”, afirmou.

O problema não é novo. Em meados da década de 2010, Major notou que estavam colocando pedras em cima de latas de lixo, mas não sabia por quê. “Então, um dia, quando eu estava dirigindo para a estação, vi uma cacatua abrindo uma tampa. E então me dei conta.”

Sapatos enfiados na alça da lixeira: maneira criativa de frustrar os pássaros. Crédito: Barbara Klump/Current Biology

Comportamentos copiados

Klump e sua equipe realizaram então um censo de mais de 3.200 pontos para fornecer o que ela chama de um “instantâneo” de métodos de proteção. “Em um período de tempo muito curto, como algumas semanas, fomos a quatro subúrbios onde sabíamos que as cacatuas abriam caixas e tentamos registrar para cada caixa se estava protegida e, em caso afirmativo, como estava protegida.” Os pesquisadores descobriram que as estratégias para evitar a abertura das tampas incluíam tijolos, manipulação de cordas e garrafas de água amarradas. Alguns moradores enfiavam sapatos nas alças pela dobradiça da tampa.

Eles descobriram que as táticas de proteção tendem a ser agrupadas – por exemplo, ruas dentro de alguns quarteirões podem usar mais tijolos do que sapatos. Isso sugere que tais comportamentos foram aprendidos socialmente com os vizinhos.

Uma pesquisa realizada em 2019 e 2020 com moradores da Grande Sydney e Wollongong deu aos pesquisadores uma ideia de como a abordagem a essa questão mudou nos últimos anos. Do total de entrevistados, 85% deixaram as tampas das lixeiras desobstruídas. Já entre os 172 domicílios que declararam ter protegido suas lixeiras em algum momento, aproximadamente 60% incrementaram seus esforços à medida que as cacatuas superavam os obstáculos colocados anteriormente. Nas áreas onde os pássaros causavam o problema há mais de três anos, os métodos adotados eram mais extremos do que os observados em áreas onde o comportamento de abrir tampas era mais recente.

Garrafas de água amarradas a uma tampa de lixeira para que não possam ser empurradas: exemplo de método de alto nível. Crédito: Barbara Klump/Current Biology

Garrafas de água amarradas a uma tampa de lixeira para que não possam ser empurradas é um exemplo de tática de alto nível. ( Fornecido: Barbara Klump/Current Biology )

Preferência pelo tijolo

Os pesquisadores também observaram que algumas pessoas protegiam suas lixeiras por alguns anos, depois paravam, porque as cacatuas já não investiam mais em seu lixo. Por que as aves mudaram o comportamento ainda é desconhecido, mas isso pode estar relacionado a uma diminuição na quantidade de comida descartada.

Klump considera que as melhores estratégias para as lixeiras dependem de quanto tempo as cacatuas gastam para tentar invadi-las. Os tijolos em geral funcionam bem: seu peso normal é de 2,5 quilos, três vezes mais que o do pássaro. “Você vê o quão duro [as cacatuas] têm de trabalhar”, observou ela. “E [um tijolo] ainda parece funcionar, porque vemos muito isso. No geral, foi o método de proteção mais observado. As pessoas não continuariam fazendo isso se não funcionasse.”

E quanto às estratégias mais complexas, como encaixar sapatos na área da dobradiça ou prender uma corda para que a tampa não abra muito? “Não observamos cacatuas resolvendo os métodos de nível superior – ainda”, afirmou Klump.