13/01/2021 - 15:36
Banimento de Trump do Twitter causou controvérsias. Para especialistas, exclusão pode ajudar a reduzir propagação de discurso de ódio e não necessariamente reforçar a polarização.As hashtags #AfDRausAusTwitter e #AfDTwitterBanNow ficaram entre as mais usadas no fim de semana na Alemanha. Inspirados no banimento de Donald Trump do Twitter, surgiram pedidos no país europeu para que contas de integrantes populistas de direita e extremistas de direita do partido Alternativa para a Alemanha (AfD) fossem apagadas da plataforma.
As redes sociais, especialmente o Twitter e o Facebook, engrandeceram atores políticos como Trump e a AfD. O presidente americano alcançava 88 milhões de seguidores com seus tuítes. A AfD também se beneficiou enormemente com o Twitter e outras plataformas, principalmente nos primeiros anos após a criação do partido, afirma o especialista em comunicação Jonas Kaiser à DW.
“No início, quando a legenda ainda não tinha uma presença muito forte, as redes sociais foram muito úteis na mobilização de pessoas”. Esse foi o caso durante a crise de refugiados de 2015, acrescenta Kaiser.
Nesse ínterim, a AfD se estabeleceu firmemente no sistema político alemão. No Parlamento alemão (Bundestag), a legenda é o maior partido de oposição. Com frequência, no entanto, membros da sigla chamam a atenção nas redes sociais, por exemplo, quando polarizam temas e desacreditam adversários políticos e jornalistas.
Depois da invasão do Capitólio, a conta de Trump no Twitter foi bloqueada na semana passada “devido a riscos de novas incitações à violência”, segundo a rede social.
Muitos especialistas, como Jonas Kaiser, avaliam o banimento de Trump das redes sociais como “correto e importante”. O risco para democracia devido à disseminação permanente da alegação de suposta fraude eleitoral seria muito grande.
Ato de censura?
Ao mesmo tempo, bloquear um importante canal de comunicação de um presidente eleito é um passo problemático. A chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, expressou ceticismo sobre o banimento de Trump do Twitter. “O direito fundamental à liberdade de expressão é de importância elementar”, afirmou seu porta-voz, Steffen Seibert.
Intervenções só poderiam ocorrer nos moldes de leis e não deveriam depender do julgamento das operadoras de redes sociais, acrescenta Seibert. “Nesta perspectiva, a chanceler federal considera problemático o bloqueio permanente das contas do presidente americano”.
O líder opositor russo Alexei Navalny se expressou de maneira semelhante. Ele classificou o bloqueio um “ato de censura”, alimentado por razões emocionais e politicamente motivadas. Navalny criticou ainda que não é transparente quem toma essas decisões no Twitter, quais bases para isso e por que outros atores, como o presidente russo, Vladimir Putin, ainda não foram banidos da mesma forma.
A ação do Twitter parece, pelo menos, ter afetado indiretamente outros conservadores que usam a plataforma. Alguns perderam milhares de seguidores ao longo do final de semana. Não está claro se isso se deve ao fato de muitos conservadores estarem saindo do Twitter ou se a perda de seguidores está relacionada às regulamentações pouco transparentes da rede social.
Exclusão funciona
Independentemente disso, estudos mostram que a chamada deplatforming – o processo técnico de bloquear contas de redes sociais e tornar o conteúdo inacessível a outros usuários – funciona, pelo menos, para usuários claramente extremistas de direita. Esse foi o resultado de uma pesquisa do Instituto para Democracia e Sociedade Civil (IDZ), de Jena, divulgado em dezembro do ano passado. De acordo com o estudo, a deplatforming restringiu significativamente a força de mobilização de atores centrais da extrema direita na Alemanha e “priva-os de um recurso central visado por sua encenação: a atenção”.
A AfD não foi diretamente analisada no estudo, afirma à DW o coautor da pesquisa Maik Fielitz, pois é bastante improvável que um partido inteiro seja excluído de redes sociais como Facebook e Twitter. “A AfD é também um partido de Facebook, com muitos seguidores, que sabe exatamente a importância desta plataforma para a legenda”. Assim, a sigla age de maneira cautelosa e adapta sua linguagem.
Nos EUA, a situação é outra. O especialista em comunicação Jonas Kaiser remete neste contexto o exemplo do extremista americano e propagador de teorias de conspiração Alex Jones. Antes dele ter sido bloqueado no Youtube, Jones tinha 2,3 milhões de seguidores na plataforma. Ele mudou então para o portal de vídeo Bitchute, onde, segundo Kaiser, alcança 11 mil pessoas, ou seja, muito menos do que antes. Muitas vezes se supõem que extremistas levam seus seguidores para outras plataformas, diz Kaiser. Na realidade, porém, apenas poucos seguem esse passo. Nos EUA, surgiram várias redes alternativas para extremistas de direita e ativistas de direita.
Alternativa para extremistas
Essas alternativas, plataformas pequenas, são escolhidas como substitutas. Desde que Trump foi bloqueado no Twitter, serviços de streaming de vídeos ao vivo, como o Dlive, registraram um aumento significativo.
Alguns dos extremistas que invadiram o Capitólio transmitiram ao vivo a ação pelo Dlive. Serviços como o Dlive são frequentemente menos regulados do que Twitter ou Facebook. Eles propagam que tudo pode ser dito ali, sem restrições. Como resultado, os conteúdos nestas plataformas são substancialmente mais radicais do que nos operadores já consolidados. Isso poderia contribuir para uma radicalização ainda maior daqueles usuários que viraram as costas para redes sociais mais conhecidas e transparentes, como Twitter. Ainda assim, até mesmo o Dlive baniu o negacionista do Holocausto Nick Fuentes.
No entanto, quanto mais Twitter e Facebook bloqueiam contas, maior a ameaça do surgimentos de mundos digitais paralelos. As redes sociais já funcionam de acordo com o princípio de filtragem de bolhas: para manter o usuários mais tempo na rede, o algoritmo busca conteúdos emocionantes e adaptados para ele – criando assim uma bolha onde nada que contradiga as crenças do usuário entra.
Pelo menos até agora, atores políticos contrários ainda estão nas mesma redes sociais. Assim, há, ao menos em teoria, a possibilidade de encontros e trocas.
Fielitz do IDZ não avalia como algo negativo a separação das esferas na internet. Redes sociais já vivem da polarização, uma troca verdadeira jamais ocorreria. “Haverá locais suficientes onde trocas acontecerão”, acrescenta o especialista. Meios de comunicação clássicos, como jornais e emissoras de rádio, desempenham também um papel. Segundo Fielitz, eles precisam reproduzir um discurso diversificado para que as redes sociais possam se tornar cada vez mais aquilo que pretendia ser originalmente: um local de conexão privado.