25/11/2025 - 19:52
Ex-presidente passa cumprir pena na sede da PF em Brasília. Condenado por trama golpista, Bolsonaro deve ficar inelegível até 2060. Defesa exige prisão domiciliar e aliados pressionam por anistia.O 38.º presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, se tornou o primeiro a ser preso por tentativa de golpe de Estado. A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes despachada nesta terça-feira(25/11) encerra algumas das principais disputas abertas nos bastidores desde a condenação, entre elas, onde seria cumprida a prisão. Contudo, deixa questões em aberto que podem mudar a expectativa de cumprimento da pena de 27 anos e três meses de prisão imposta por crimes contra a democracia.
Onde Bolsonaro vai cumprir pena?
Por determinação de Moraes, Bolsonaro inicia o cumprimento de sua pena em regime fechado na sede da Superintendência da Polícia Federal (PF) do Distrito Federal, em Brasília.
Ele ficará custodiado em uma Sala de Estado, um quarto com ar-condicionado, cama, frigobar, televisão e banheiro privado. Se os parâmetros de sua prisão preventiva forem mantidos, ele terá direito a duas visitas separadas, às terças e às quinta-feiras, entre 9h e 11h. Médicos e advogados devem ter trânsito livre sem necessidade de autorização judicial.
Na decisão, Moraes citou como jurisprudência o inquérito que levou à prisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em abril de 2018, à época condenado em segundo instância por corrupção passiva. O petista ficou detido na sede da Polícia Federal em Curitiba, onde o processo começou a ser julgado.
Havia um receio de apoiadores de Bolsonaro de que o STF conduzisse Bolsonaro ao Complexo Penitenciário da Papuda. Por isonomia em relação a Lula, a proposta a princípio foi descartada por Moraes. Em 2019, a Corte derrubou uma decisão judicial que transferia o petista ao presídio do Tremembé, em São Paulo, por entender que não havia cela adequada para abrigá-lo.
Prisão domiciliar é possível?
A pena de Bolsonaro precisa começar a ser executada em regime fechado em respeito ao Código Penal, que exige este tipo de encarceramento para detenções que superam oito anos.
A defesa rejeita a manutenção da prisão em regime fechado para Bolsonaro. A alegação é que há risco à sua vida devido ao seu estado de saúde, fragilizado após diversas cirurgias decorrentes da facada sofrida em 2018.
Antes mesmo da execução da pena e da anterior prisão preventiva de Bolsonaro, seus advogados haviam listado um quadro diário de soluços gastroesofágicos, falta de ar e uso de medicamentos com ação no sistema nervoso central.
Por isso, a defesa exige que o ex-presidente cumpra pena em casa, nos moldes do que foi concedido ao também ex-presidente Fernando Collor. Moraes permitiu o benefício a Collor uma semana após ele ser detido em um presídio comum. A justificativa foi que a continuidade da prisão em regime fechado poderia agravar os problemas de saúde do ex-presidente, acometido pela doença de Parkinson.
Contudo, Moraes decidiu não apreciar esta primeira demanda da defesa de Bolsonaro por entender que a possibilidade de prisão domiciliar foi “prejudicada” pela prisão preventiva.
O despacho ainda pode ser revisto posteriormente ou em novos pedidos da defesa. A decisão dependerá tanto de manifestação da Procuradoria-Geral da República, quanto da Superintendência da Polícia Federal. Isto porque, assim como no caso de Collor, o presídio deve informar à Justiça se possui condições de prestar atendimento médico diante do quadro do preso.
Por ora, Moraes determinou a presença de um médico em tempo integral para atender possíveis problemas de saúde de Bolsonaro. Também exigiu a realização de “exames médicos oficiais para o início da execução da pena, inclusive fazendo constar as observações clínicas indispensáveis ao adequado tratamento penitenciário”.
A tentativa de violar a tornozeleira também pode minar a concessão de prisão domiciliar.
Como fica a progressão de pena?
Segundo a Lei de Execução Penal, se não houver determinação judicial por motivos humanitários, a progressão de pena para regime semiaberto só pode ocorrer após atingidos critérios objetivos (como tempo mínimo de detenção) e subjetivos (como comportamento na prisão).
No caso dos critérios objetivos, ao menos 16% da pena precisa ter sido cumprida quando o crime for cometido sem violência ou grave ameaça. Caso contrário, o piso para progressão de regime é de 25% do total da condenação.
Essa redação penal foi estabelecida após a aprovação do pacote Anticrime, sancionado pelo próprio Jair Bolsonaro em 2019.
No caso do ex-presidente, o cálculo se impõe sobre a totalidade de sua pena, que soma 27 anos e três meses. Contudo, alguns dos crimes cometidos por ele se enquadram no dispositivo que endurece a progressão em caso de violência.
Os crimes de condenação por organização criminosa armada, dano qualificado por violência e grave ameaça, golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito agregam qualificantes de violência e exigem 25% da pena para progressão ao regime semiaberto.
Sobre o crime de deterioração de patrimônio tombado, incide um piso menor, de 16%.
Com isso, o cálculo é que, mesmo diante de bom comportamento – como estudo, trabalho e leitura na prisão – Bolsonaro deve permanecer em regime fechado por ao menos seis anos e sete meses.
Segundo levantamento da Folha de S.Paulo, esse cálculo pode reduzir para seis anos se o crime de dano qualificado não for considerado, já que a pena é inferior a oito anos.
O período total de prisão também pode ser abatido, uma vez que a defesa provavelmente pedirá que o STF desconte o período já cumprido em prisão domiciliar desde agosto.
Até quando Bolsonaro está inelegível?
Com a condenação, Bolsonaro fica inelegível com base na Lei da Ficha Limpa. De acordo com a atual redação da norma, quem é condenado por decisão judicial colegiada fica impedido de disputar as eleições pelo prazo de oito anos após o cumprimento da pena.
Dessa forma, o ex-presidente está inelegível até 2060. Nesse pleito, Bolsonaro terá 105 anos. Atualmente, ele tem 70.
Bolsonaro também já está inelegível até 2030 por ter sido condenado pelo TSE em 2023 por abuso de poder político e econômico.
O processo se debruçou sobre a reunião realizada com embaixadores, em julho de 2022, no Palácio da Alvorada, para atacar o sistema eletrônico de votação.
Anistia é possível?
Após a condenação, aliados de Bolsonaro voltaram a pressionar o Congresso para passar um projeto de lei que conceda anistia ampla aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro.
O senador Flávio Bolsonaro já afirmou que fará o possível para que o PL da Anistia seja apreciado no Congresso e se estenda ao ex-presidente, condenado como líder da tentativa de ruptura democrática.
Líderes da oposição na Câmara defendem que a Casa aprove um perdão total, rejeitando a chamada “anistia light” – termo usado para designar um projeto que excluiria Bolsonaro. Apoiadores prometem trabalhar apenas por uma versão de perdão irrestrito.
Contudo, após os Estados Unidos arrefecerem as sanções impostas contra o Brasil, a anistia irrestrita perdeu força no Legislativo. Hoje, a discussão se concentra no chamado PL da Dosimetria, que diminuiria o peso das penas aos envolvidos nos atos do 8 de janeiro. A proposta tem apoio maior no Congresso.
Mesmo que avance, o texto ainda precisa passar pelo Senado e pela sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Se chegar a essa etapa, Lula pode vetar a proposta, mas a Constituição permite que o Congresso derrube o veto. A medida, no entanto, ainda poderia ser questionada no STF, última instância provável de análise.
Eleições de 2026 podem virar o jogo?
Juristas ouvidos pela DW também afirmam que o futuro da condenação de Bolsonaro pode ser incerto. Isso porque o novo pleito presidencial, de 2026, pode trazer um aliado do ex-presidente à Presidência, que poderia articular não apenas um “indulto” presidencial, mas também conquistar uma revisão da sentença diante de uma futura nova composição do STF.
A expectativa dos apoiadores é que a atuação do ministro Alexandre de Moraes, em um processo em que também foi vítima, abra brechas para contestações futuras. A defesa rejeita a atual decisão pela execução da pena, uma vez que o prazo para protocolar embargos infringentes ainda não havia se encerrado.
jps/gq (OTS, Agência Brasil)
