Método raro de caçar: correr atrás dos animais até matá-los de exaustão. Abaixo, as sandálias invejadas.

Conhecido pelas cores da natureza e pela alegria de seus habitantes – um povo para quem até o Dia de Finados é motivo para festejar o reencontro com os antepassados –, o México é muito mais do que cenários paradisíacos pontilhados por restaurantes, onde se toma tequila e se comem tacos ao som de mariachis. O país sede dos próximos Jogos Pan-Americanos guarda em sua cultura singular também um patrimônio atlético: os índios tarahumaras são considerados os melhores corredores de maratonas do mundo, segundo estudos da Universidade do Arizona.

Embora suas longas corridas feitas com pés descalços ou com uma simples sandália artesanal de solado de borracha tenham inspirado a indústria esportiva e o best-seller Nascido para correr (Ed. Globo), do norte-americano Christopher McDougall, os tarahumaras parecem personagens de ficção. Os últimos sobreviventes da grande cultura mesoamericana pré-hispânica integram um povo que quase nunca é visto. Mas eles existem, sim. Segundo o Censo Supremo Tarahumara de 2005, 105 mil desses índios vivem em um território de 54 mil km², isolados ao redor de cânions, desfiladeiros e picos rochosos das montanhas da Sierra Madre Ocidental, no Estado de Chihuahua, noroeste do México.

A cada dia a civilização global empurra a tribo para lugares ainda mais remotos da serra, onde vive em cavernas sem luz e água corrente, em condições adversas. Não há estradas que conduzam até eles. Como se não bastasse, a região ainda é controlada pelos cartéis de drogas. “O caminho era difícil e perigoso. A sorte foi que encontrei alguém para me guiar”, conta McDougall no livro. “Nunca pensei que teria de atravessar um lugar chefiado pelo narcotráfico.”

Alheios à violência do mundo, os tarahumaras amam o silêncio e vivem isolados no território de difícil acesso. Por isso mesmo sobreviveram aos ataques dos conquistadores espanhóis, ao contrário dos maias e astecas, dizimados por eles, e dos seus inimigos apaches, que vivem do outro lado da fronteira, nos Estados Unidos. Sua filosofia de vida consagra a comunhão com a natureza. Vivem à base de milho e mantêm um idioma próprio, transmitido oralmente de mãe para filho, o rarámuri, nome pelo qual a tribo também é conhecida.

Rarámuri pode ser traduzido como “aqueles que funcionam” ou “o povo corredor, os que caminham bem”. Possivelmente, a primeira tradução é a mais correta. No entanto, a segunda se difundiu devido à extraordinária capacidade física do povo tarahumara para correr longas distâncias. Basta dizer que um dos seus métodos de caça é perseguir os animais até eles caírem de exaustão.

As sandálias famosas ja foram estudadas pela indústria de equipamentos de corrida e inspiram vários tipos de calçados inovadores. Eles também já convenceram muitos corredores a correr descalços.

McDougall sabe muito bem o que significa essa habilidade: “Homens de 50 anos correm como adolescentes. São capazes de correr megamaratonas de 160 ou de 240 quilômetros, sem problemas aparentes nem lesões.” Além dessa performance, a pequena comunidade tribal nas montanhas desconhece o que é obesidade, diabetes, depressão, crime e assaltos. Ao contrário do que acontece em muitas outras sociedades.

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