O Carnaval na Alemanha não é festejado em todo o país e tem nuances diferentes em cada região. Embora as origens sejam semelhantes, as tradições foram mudando ao longo dos séculos.O Karneval renano, a Fastnacht suábio-alemânica e o Fasching bávaro são apenas algumas das diversas modalidades regionais da festa que os alemães apelidaram de “quinta estação do ano”. Mas, seja qual for o nome dado, o Carnaval nos países de língua alemã representa originalmente o período anterior à abstinência, ou seja, antes da Quaresma, os 40 dias que precedem a Páscoa.

Por muito tempo se questionou a origem do termo – se remonta a ritos pagãos de fertilidade, a rituais de exorcismo de demônios ou mesmo a festividades romanas, como as saturnais e os bacanais. Mas seu sentido vem em grande parte da tradição religiosa cristã. Só mais tarde é que ganhou influências patrióticas, por exemplo, no escárnio das tropas francesas durante a ocupação da Renânia por Napoleão, ou dos prussianos, que vieram a seguir.

Festejos medievais eram pura diversão

Os primeiros registros da Fastnacht nas regiões de língua alemã datam do século 13. Já naquele tempo, era comum festejar e ingerir grandes quantidades de carne, queijo, manteiga, banha e ovos. A intenção era consumir os mantimentos que haviam sido armazenados para o inverno. Daí vieram as procissões e o costume de arremessar ovos.

Na Alta Idade Média, era comum festejar dentro de casa. A partir do século 13, cada vez mais se começou a preferir os festejos ao ar livre, pelo menos nas grandes cidades. E a comilança era sempre acompanhada pelos foliões, em festejos com música, dança e apresentações teatrais. Torneios e corridas eram também muito apreciados.

Surgiu então a moda das encenações alegóricas, com o combate entre personificações da Fastnacht e da Quaresma, representadas por animais e alimentos. Até o final do século 14, os festejos permaneceram lúdicos e despreocupados: o importante era se divertir.

Igreja condenou a Fastnacht

A partir do século 15, tudo mudou. A Igreja passou a condenar a Fastnacht e teólogos a censuraram como ímpia e infame, com base na doutrina dos dois reinos de Santo Agostinho. Oposta ao reino de Deus, a Fastnacht passou a ser associada ao reino do pagão Baco e do rei Nabucodonosor. Os foliões medievais passaram a ser vistos como a personificação do mal.

Até hoje, tanto em Colônia, quanto em Munique, continuam existindo príncipes, arautos e parlamentos de 11 foliões. O 11 é tido como número do folião; por isso, em muitas regiões se costuma iniciar a temporada de Carnaval oficialmente em 11/11 às 11h11.

A demonização do Carnaval pela Igreja é perceptível até hoje nas máscaras e fantasias que proliferaram desde o século 15. O diabo corre pelas ruas, junto a bruxas, demônios e selvagens. Mas também adeptos de outras religiões foram satirizados, como mouros. E animais simbolizavam os pecados capitais: o urso e o porco representavam a gula; o galo e o bode, a luxúria; o burro, a preguiça; e o dragão, a inveja.

Protestantismo e Iluminismo: menos empolgação

Os séculos 15 e 16 assistiram a um apogeu da Fastnacht. Inclusive acontecimentos cotidianos viraram tema de sátira e encenações teatrais se tornaram mais comuns.

Com o afrouxamento da moral medieval, o folião, que questionava a ordem vigente e satirizava tudo o que imperava, tornou-se a figura carnavalesca central, com sua roupa de retalhos que lembra o figurino do Arlequim da Commedia dell'Arte italiana.

Mas a Reforma Protestante e o Iluminismo significaram um corte profundo nos festejos de Carnaval. Só o Romantismo, no século 19, reacendeu o interesse por velhos costumes e festas populares.

São muito variados os ritos praticados durante a festa – de queimar bonecos a deixar rolar um roda em chamas do alto de um morro – e igualmente numerosas as superstições populares: na Terça-feira de Carnaval, por exemplo, não se deve casar pois o diabo estaria à solta, mas tomar banho em estado sóbrio ajudaria a curar dor nas costas. E as antigas tradições carnavalescas continuam vivas em praticamente todas as variantes regionais na Alemanha.

Após a Segunda Guerra Mundial, a comemoração da Fastnacht viveu uma enorme popularização. Desde então, é regra todo ano – seja por escapismo, por uma legítima crítica à política através de bonecos e máscaras, pelo puro prazer de se fantasiar ou como simples válvula de escape para o espírito.