Partido Comunista se reúne em Pequim para decidir os rumos da economia chinesa pelos próximos cinco anos. Diante da atual situação geopolítica, consumo interno deve continuar em segundo plano.Aproximadamente 200 membros do Comitê Central do Partido Comunista Chinês se reúnem nesta semana em Pequim para a quarta sessão plenária do órgão. O encontro a portas fechadas de 20 a 24 de outubro tem no topo da agenda a discussão do próximo plano quinquenal, pensado para o período de 2026 a 2030 e com aprovação oficial prevista para o início do ano que vem.

Os planos quinquenais têm uma longa tradição, que remonta quase à fundação da República Popular da China, com o primeiro vigorando de 1953 a 1957. O próximo será o décimo quinto desses programas, cujo objetivo é regular o desenvolvimento econômico chinês em nível nacional.

Atualmente, há muitos problemas estruturais na economia chinesa que precisam ser resolvidos. Durante décadas, a segunda maior economia do mundo foi impulsionada pelo comércio exterior e pelo investimento em infraestrutura, ao tempo que o terceiro pilar — o consumo interno — foi constantemente negligenciado.

“Se observarmos os últimos anos, ainda vemos um crescimento de dois dígitos no investimento no setor manufatureiro”, afirma Alexander Brown, analista do think tank Instituto Mercator de Estudos da China (Merics), com sede em Berlim. “No entanto, os setores de serviços não estão recebendo tanto dinheiro. Essa é a razão do clima bastante pessimista entre os consumidores chineses. Mesmo assim, Pequim deverá continuar priorizando os gastos com política industrial, dada a atual situação geopolítica e o objetivo de resiliência da China.”

Foco na competição geopolítica

Essa resiliência — a de sua própria economia — é muito importante para Pequim. Tal meta ganha ainda mais apoio após episódios como o de dias atrás, quando o presidente dos EUA, Donald Trump, ameaçou novamente impor tarifas massivas sobre importações vindas da China e endurecer as restrições à exportação de produtos essenciais de alta tecnologia. Pequim vê isso como prova de que tais preocupações são justificadas.

Chen Bo, pesquisador no Instituto do Leste Asiático da Universidade Nacional de Singapura, explica que os chineses atualmente se preocupam mais com a competição geopolítica do que com problemas estruturais. “O novo plano quinquenal dará forte ênfase à promoção da pesquisa de alta tecnologia e do desenvolvimento industrial. A manufatura continua sendo o fator mais importante para o poder político do país. Em caso de conflito, afinal, seria a manufatura, e não o setor de serviços, que teria extrema importância”, afirmou em entrevista à agência de notícias Reuters

Em um discurso em julho, o presidente Xi Jinping enfatizou que “o mundo está vivenciando as mudanças mais profundas em um século, com a revolução científica e tecnológica e a competição entre as grandes potências se tornando cada vez mais interligadas”. Na ocasião, ele também reiterou seu objetivo de que a China assuma uma posição de liderança estratégica na competição científica e tecnológica global.

O país já ascendeu à vanguarda global em áreas como eletromobilidade e energias renováveis. Com exceção de alguns setores — como semicondutores e aviação comercial —, a China concentra quase toda a sua cadeia de suprimentos dentro de suas fronteiras. Pequim também tem aumentado continuamente seus investimentos em indústrias de alta tecnologia, a fim de fortalecer ainda mais sua soberania econômica e reduzir ainda mais sua dependência.

Quando o consumo será contemplado?

A China, contudo, não abandonou completamente os esforços para resolver seus problemas estruturais. Em uma reunião em setembro, o Congresso Nacional do Povo discutiu como aumentar a renda disponível das famílias e, consequentemente, a participação do consumo na economia. Atualmente, o consumo privado na China representa cerca de 40% da produção econômica, muito menos do que a média de 60% nos países ocidentais. Nos EUA, essa participação chega a 70%. Alguns think tanks chineses propõem aumentar o consumo privado para 50% em dez anos.

Nos últimos meses, Pequim já anunciou diversas medidas neste sentido, tais como subsídios ao consumo, aumentos de aposentadorias e auxílios para cuidados de crianças, além de modestas melhorias na seguridade social. Para o analista Alexander Brown, do Merics, está claro que tais ações foram praticamente “forçadas” diante de problemas como a mudança demográfica, excesso de capacidade produtiva e queda nas exportações. “Acredito que medidas desse tipo – ainda que não muitas – continuarão a surgir repetidamente nos próximos cinco anos. ”

Larry Hu, economista-chefe para a China do Macquarie Group, afirma que somente em um modelo de crescimento orientado pelo consumo poderiam ser criado empregos suficientes em setores de serviço altamente qualificados e bem remunerados, para os quais milhões de jovens chineses foram treinados. “Se depender exclusivamente da demanda externa, sem estimular o consumo interno, a China enfrentará desemprego e deflação. Se essa situação durar apenas um ou dois anos, é suportável. Mas a longo prazo, ela definitivamente causará problemas”, disse à Reuters.

No entanto, Larry Hu acredita que Pequim só considerará estimular o consumo interno quando a demanda externa cair de forma tão acentuada a ponto de comprometer suas metas de crescimento.

Primeiro o topo do mundo; depois o consumo interno

Com os motores de exportação e infraestrutura vacilantes, impulsionar o consumo interno é mais urgente do que nunca. Mas isso não é nada barato, especialmente em um momento em que a margem de manobra fiscal de Pequim já é limitada devido à crise imobiliária, à alta dívida e à menor taxa de crescimento.

De acordo com o Citigroup, um dos principais bancos americanos, o governo chinês precisaria investir 20 trilhões de yuans (aproximadamente R$ 15 trilhões) nos próximos cinco anos para lidar efetivamente com o desequilíbrio entre oferta e demanda na economia chinesa. Essa quantia corresponde a 15% do Produto Interno Bruto chinês em 2024.

Alexander Brown prevê, portanto, que os governantes em Pequim provavelmente darão continuidade à sua atual estratégia econômica. “Eles continuarão priorizando o investimento de recursos em setores tecnológicos, onde há chances de alcançar a liderança global. A expectativa é que essas conquistas gerem muito dinheiro. Esse dinheiro — ou melhor, a arrecadação fiscal resultante — poderá então ser distribuído por todo o sistema econômico.”