08/04/2022 - 13:39
Duas equipes internacionais de pesquisadores afirmam ter descoberto mutações genéticas que influenciam fortemente a probabilidade de uma pessoa ter esquizofrenia e dezenas de genes que poderiam desempenhar um papel no desenvolvimento da doença. As descobertas foram divulgadas em dois artigos publicados na revista Nature.
Um deles, considerado o maior estudo genético sobre esquizofrenia já realizado, foi conduzido pelo Consórcio de Genômica Psiquiátrica (PGC, na sigla em inglês), liderado por cientistas da Universidade de Cardiff, no Reino Unido.
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Eles adotaram uma abordagem muito ampla, investigando todo o genoma, ou seja, todo o material genético do organismo, para procurar variações genéticas específicas que aumentem o risco de uma pessoa desenvolver esquizofrenia.
Analisando o DNA de cerca de 77 mil pessoas com esquizofrenia e cerca de 244 mil sem o distúrbio, eles descobriram quase 300 partes do genoma que poderiam ser ligadas ao risco de ter esquizofrenia. Dentro dessas regiões, eles descobriram 120 genes que poderiam influenciar o desenvolvimento da doença.
O outro estudo foi conduzido pelo consorcio internacional Schema (Schizophrenia Exome Meta-Analysis), liderado por pesquisadores do Instituto Broad, do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT) e da Universidade Harvard (EUA).
Os pesquisadores descobriram dez genes com mutações raras que parecem aumentar o risco de desenvolver esquizofrenia, e outros 22 genes que poderiam desempenhar um papel nesse processo.
“Todos nós temos 1% de chance de desenvolver esquizofrenia”, disse Benjamin Neale, coautor do Schema e membro do Consórcio de Genômica Psiquiátrica, em um comunicado à imprensa. “Mas, se você tiver uma dessas mutações, a chance passa a ser de 10%, 20%, até 50%.”
As mutações genéticas ajudam a traçar um mapa das origens da esquizofrenia no cérebro.
Desenvolvimento de novos remédios
A esquizofrenia é uma condição mental caracterizada por alucinações, períodos de psicose e um distanciamento da realidade. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a doença afete uma em cada 300 pessoas em todo o mundo. Só que até agora não se sabe realmente o que acontece no cérebro para desencadeá-la.
Os cientistas afirmam que as novas descobertas não devem ter impacto imediato na vida de pacientes com esquizofrenia, mas podem ajudar a melhorar o tratamento com medicamentos num futuro próximo.
Já existem medicamentos para a esquizofrenia, mas eles não atacam a raiz do distúrbio. As drogas em uso apenas atenuam os efeitos ou sintomas, sem tratar ou curar a doença em si.
A medicação mais comum para esquizofrenia é a clorpromazina, originalmente desenvolvida como anestésico, mas depois os médicos descobriram que ela ajuda a prevenir alucinações em pacientes psiquiátricos. “Foi um achado acidental. Não veio da pesquisa psiquiátrica”, diz Stephan Ripke, pesquisador do hospital universitário Charité, de Berlim, e coautor de um dos dois artigos publicados na Nature.
Ripke e os demais cientistas acreditam que, além de ajudar a determinar o risco de uma pessoa ter esquizofrenia, as novas descobertas podem contribuir para o desenvolvimento de medicamentos para atacar especificamente a raiz da doença.
Por que é difícil estudar a esquizofrenia
A esquizofrenia geralmente começa a se manifestar em pacientes no final da adolescência, por volta dos 20 anos de idade.
Pesquisadores já conseguiram estudar o aspecto ambiental da doença: eles descobriram, por exemplo, que o ambiente onde uma pessoa cresce, o uso de maconha na adolescência e a alimentação da mãe durante a gravidez podem aumentar a chance de desenvolver o distúrbio.
Embora cientistas saibam que a esquizofrenia é de 60% a 80% hereditária, eles tinham pouco conhecimento sobre a genética da doença até agora.
Isso se deve em parte ao fato de a esquizofrenia não poder ser diagnosticada por meio de um exame de sangue ou cerebral. Ripke aponta que o que se faz é conversar com os pacientes. “Basicamente, precisamos saber se as pessoas têm alucinações, se elas ouvem vozes”, diz.
Isso significa que a pesquisa sobre esquizofrenia tem que ser feita em humanos. Preocupações éticas impedem cientistas de simplesmente coletar as amostras de que precisam para facilitar análises genéticas, mas isso é possível quando pacientes se voluntariam, diz Ripke.
“Nosso estudo nunca teria funcionado sem a confiança de milhares e milhares de pacientes que nos deram suas informações genéticas”, diz o especialista. “Estamos muito gratos a todas as pessoas que nos confiaram seus dados.”