20/05/2025 - 7:29
Virginia e seus amigos influenciadores (ou seriam exploradores?) lucram e riem do sofrimento de seus seguidores enquanto repetem: “joga no Tigrinho, joga no Tigrinho”.Nas redes sociais, Virginia Fonseca, a maior influenciadora do Brasil, com quase 53 milhões de seguidores, mostra sua vida em família e uma rotina de luxo, com direito a viagens de jatinho e exibição de bolsas e roupas de grife que chegam a custar R$ 1 milhão. É dela a frase: “me mimei”, usada para mostrar que tinha comprado um presentinho para si mesma, uma bolsa da Hermés de R$ 500 mil.
Virginia é a representante do momento de uma categoria que abarca várias celebridades das redes sociais com milhares de seguidores: a dos ” influenciadores do Tigrinho”, aqueles que usam a fama para ganhar milhões anunciando de forma irresponsável jogos online com o Tigrinho ou as chamadas bets.
O vício nesse tipo de aposta é um problema de saúde pública seríssimo no Brasil. De acordo com pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), cerca de 11 milhões de brasileiros fazem uso “arriscado” dos aplicativos de apostas. Outra pesquisa mostra que 22 milhões de brasileiros haviam apostado em bets em apenas um mês.
O problema é muito sério. Há quem gasta todo dinheiro que guardou na vida, quem rouba dos pais idosos, quem perde tudo e depois comete suicídio. E também quem deixa de comprar comida. Um estudo da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), em parceria com a AGP Pesquisas, mostrou que 63% dos apostadores no país tiveram parte da renda comprometida com as bets. Outros 19% pararam de fazer compras no mercado e 11% não gastaram com saúde e medicamentos.
Ignorando a epidemia
Mas os “influenciadores do Tigrinho” parecem não estar nem aí para nada disso. Na verdade, eles fingem nem saber que o Brasil vive uma epidemia de vício em apostas online e que eles, influenciadores anunciantes das apostas, têm, sim, participação nisso. Não adianta usar a desculpa de “só estou fazendo o meu trabalho” quando você está levando gente vulnerável a se endividar com a oferta tentadora de que há maneira fácil e rápida de ganhar dinheiro, o que é uma ilusão.
Semana passada, Virginia chocou parte do país ao comparecer à “CPI das Bets” no Senado em Brasília e se comportar como se não tivesse ideia do que estava fazendo. A CPI investiga os impactos das plataformas de apostas e jogos online no orçamento das famílias brasileiras, além de crimes como lavagem de dinheiro e evasão de divisas envolvendo apostas.
“A senhora não tem conhecimento de pessoas que tiraram suas vidas, de separações, de famílias indo à bancarrota de agiotas?”, perguntou a senadora Soraya Thronicke. “Não”, respondeu a influenciadora, como se vivesse em outro planeta. Ela também disse que não se arrepende de “absolutamente nada que já fez na sua vida”.
A participação de Virginia na CPI gerou revolta e fez com que ela perdesse seguidores (o drama máximo para uma influenciadora). Mas, pelo jeito, ela não ligou. Neste sábado (17/05), ela foi filmada pulando e cantando com alegria um trecho de uma música composta por seu marido, Zé Felipe, em parceria com o trapper Oruam, que diz: “Tá doida com o dinheiro do Tigrim”.
O vídeo foi filmado durante participação em reality produzido por outro mega “influenciador do Tigrinho”, Carlinhos Maia. Ou seja, em outras palavras, Virginia e seus amigos influenciadores lucram e riem do sofrimento enquanto incentivam seus seguidores a ficarem doidos com o dinheiro do tigrinho.
Ela não é a única a divulgar esse tipo de coisa e ostentar riqueza nas redes. São muitos os influenciadores que fazem isso. Entre eles, há nomes bilionários como Neymar.
Essas pessoas vivem de influenciar as pessoas, diz o nome da profissão, mas o que fazem não é influência, mas exploração. E muitos dos seus seguidores ainda os defendem: “Cada um faz o que quer”, “as pessoas têm inveja porque elas são ricas”, muitos repetem, em coro. Onde foi parar a ética? Essa postura do “não estou nem aí” não devia ser “tendência”.
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Nina Lemos é jornalista e escritora. Escreve sobre feminismo e comportamento desde os anos 2000, quando lançou com duas amigas o grupo “02 Neurônio”. Já foi colunista da Folha de S.Paulo e do UOL. É uma das criadoras da revista TPM. Em 2015, mudou para Berlim, cidade pela qual é loucamente apaixonada. Desde então, vive entre as notícias do Brasil e as aulas de alemão.
O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.