02/09/2025 - 12:32
Reações no exterior ao julgamento do ex-presidente por tentativa de golpe de Estado são positivas, o que finalmente melhora a imagem e revigora o soft power do Brasil.É surpreendente como o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro é acompanhado com atenção no exterior. Amigos meus na Alemanha que pouco se interessam pelo Brasil me escrevem para dizer que admiram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva por ele desafiar o presidente dos EUA, Donald Trump, em vez de adotar uma postura submissa, como os líderes europeus.
O mesmo vale para o julgamento de Bolsonaro. Veículos de imprensa como a revista britânica The Economist dedicam várias páginas para explicar e detalhar o processo. A capa para as Américas da atual edição do semanário, O que o Brasil pode ensinar aos EUA, já diz tudo.
O jornal americano The Washington Post vê no julgamento de Bolsonaro e seus cúmplices até mesmo um ponto de virada histórico para o Brasil. Segundo o diário, é a primeira vez que os participantes de um golpe de Estado vão a julgamento no país. Além disso, acrescenta, a Justiça brasileira não se deixa intimidar por Trump e seus aliados das big techs.
É surpreendente como o Brasil soma pontos com democratas de todo o mundo por ter levado a julgamento um presidente que, como mostra a investigação, tentou se manter no poder por meio de uma revolta após ter perdido a eleição nas urnas.
Uma explicação para isso pode ser o fato de que, nos EUA, o maior modelo de democracia no mundo, isso não ocorreu. Ao contrário: lá há um presidente no poder (Trump) que tentou algo semelhante a Bolsonaro. Ambos tentaram mobilizar seus apoiadores para ameaçar a ordem constitucional e assim continuar no poder mesmo depois de perderem uma eleição.
Quem poderia imaginar que o Brasil um dia seria um modelo para os Estados Unidos devido ao respeito aos princípios democráticos?
Reviravolta positiva?
Acho que isso é um enorme ganho de imagem para o Brasil que pode ter efeitos positivos duradouros. O que o Brasil está acumulando é soft power.
Soft power se baseia em poder de atração e de persuasão por meio da cultura, de valores ou da diplomacia, em oposição ao hard power, por meio do qual os países impõem seus interesses com violência ou coerção militar ou econômica.
Por décadas o Brasil foi a nação do soft power. Pessoas em todo o mundo amavam o Brasil por causa da cultura, da música, do estilo de vida, do futebol, da descontração e da natureza, e não por causa de sua reduzida força econômica ou militar.
Em 2010, isso começou a ir água abaixo. A corrupção nos governos do PT exposta pela Operação Lava Jato, o impeachment de Dilma Rousseff, a miséria econômica, as queimadas na Amazônia e depois Bolsonaro com sua política cínica e desumana, mas aprovada pela metade dos brasileiros.
Será que agora haverá uma reviravolta positiva – lá onde ninguém esperava? Num mundo onde a democracia perde força e influência, o Brasil segue exatamente o caminho oposto e fortalece sua democracia?
O efeito positivo desse novo soft power pode ser visto no dossiê da Economist, uma revista liberal que costuma ser cética e não otimista. Só que, diante das surpreendentes qualidades democráticas do Brasil, os jornalistas da revista estão convencidos de que a condenação de Bolsonaro terá efeitos políticos positivos.
A polarização da sociedade poderia diminuir, e o centro político seria fortalecido. Assim, mesmo os grandes desafios, como as reformas necessárias do Supremo Tribunal Federal, do Congresso e da economia e suas inúmeras subvenções, não seriam mais um problema.
Será que é o novo soft power brasileiro que deixa até mesmo a Economist tão otimista?
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Há mais de 30 anos o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul. Ele trabalha para o Handelsblatt e o jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente da DW.