A presença do Estado nas comunidades não pode se resumir à ação policial; é preciso investir também em políticas eficazes de educação, cultura e lazer.Outubro de 2025 será sempre lembrado como o mês da operação policial mais letal da história brasileira, pelo menos até então. Mais de 100 jovens perderam suas vidas e no dia seguinte, por ação dos próprios moradores da comunidade da Penha, seus corpos sem vida estavam nas ruas.

A foto dos corpos rapidamente viralizou nas redes sociais e os comentários, como já esperado, sinalizaram não apenas a gravidade da polarização que assola o país, mas também algumas questões que merecem reflexão.

Entre os comentários, houve quem comemorasse as mortes. Esse ponto não pode ser naturalizado. Não se trata de “defesa de bandido” ou “debate ideológico”: celebrar a morte de qualquer pessoa, jovem ou policial, revela o grau de desumanização a que chegamos.

Precisamos falar sobre segurança pública

A problemática é complexa e precisamos analisar de forma racional. Eu genuinamente entendo quem simplesmente está exausto de ter medo de andar nas ruas e não apenas ter o celular roubado, como também correr o risco de apanhar ou perder a própria vida. É frustrante saber que, no fundo, esses jovens sabem que nada irá acontecer com eles.

Mas aqui, pensando em soluções, precisamos ser racionais, maduros e, acima de tudo, manter a nossa humanidade. Concordo que precisamos de políticas públicas de segurança mais eficientes, mas elas não passam por ceifar vidas e tampouco por prisão perpétua.

Em relação à segurança pública, dada a complexidade do tema e a minha limitação de caracteres, limito-me aos comentários acima.

Mas também precisamos de educação

A percepção simplista via redes sociais é a de que a galera da direita acredita que a solução se concentra apenas na área da segurança, através de medidas punitivas, enquanto quem é de esquerda acredita que educação e cultura são as únicas soluções. É quase como se precisasse ser um ou outro, mas as políticas devem coexistir.

Precisamos de políticas que verdadeiramente farão o jovem pensar, antes de roubar um celular, se vale a pena ou não. Ao mesmo tempo, precisamos de políticas que trarão para as futuras gerações outras perspectivas, para que saibam que existem outras possibilidades de mobilidade social para além do crime, de modo que roubar um celular nem seja uma possibilidade a ser cogitada.

Só a educação e a cultura têm esse poder. A presença do Estado nas comunidades não pode ser apenas em dias de ações policiais, mas também através de escolas com boa infraestrutura e projetos de cultura, esporte e lazer.

A educação é mágica?

Educação e cultura são poderosos instrumentos para o desenvolvimento de qualquer país, mas não são mágicos. Ou seja: teremos um Brasil de conto de fadas só criando políticas de incentivo à cultura e à educação? É óbvio que não.

Ainda que o país esteja operando em pleno potencial nessas duas áreas, ainda haverá problemas, como desigualdade e criminalidade. A questão é que, sobretudo em comunidades carentes, a cultura e a educação estão a quilômetros de distância de operar em pleno potencial.

Faço aqui uma provocação: tente se lembrar de você quando era criança ou adolescente. Em que mundo você iria preferir aprender a roubar, fugir da polícia ou matar em vez de poder apenas ser criança e adoscelente e se preocupar com as coisas com as quais usualmente nos preocupamos nessa fase? Acha mesmo que alguma criança faz essa escolha?

Não podemos falar que um jovem escolheu seguir a vida do crime quando essa foi a única vida que lhe foi apresentada.

Não podemos falar de falta de interesse, em um cenário de falta de informação, oportunidade e investimentos em cultura e em educação.

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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1.

O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.