Seul busca aumentar seu potencial militar diante do avanço da Coreia do Norte nesse campo, acirrando corrida armamentista. Em visita à região, presidente americano Donald Trump deu aval à ideia.Com os Estados Unidos ansiosos por redefinir os termos de suas alianças na Ásia, o presidente Donald Trump endossou publicamente na semana passada a ideia de a Coreia do Sul construir e operar submarinos nucleares, acrescentando que a primeira embarcação será fabricada em solo americano.

“A Coreia do Sul construirá seu submarino nuclear nos estaleiros da Filadélfia”, escreveu Trump em sua plataforma de rede social.

Seul foi rápida em elogiar essa decisão. O ministro da Defesa sul-coreano, Ahn Gyu-back, disse no mesmo dia, durante reunião com parlamentares, que um submarino movido a energia nuclear teria um significado militar “enorme”.

Atualmente, a Coreia do Sul opera submarinos convencionais, que funcionam com uma combinação de diesel e energia elétrica. Mas as embarcações movidas a energia nuclear ofereceriam maior velocidade e resistência para fazer frente às capacidades da Coreia do Norte, de acordo com Ahn.

Embora Pyongyang ainda não tenha se pronunciado oficialmente, analistas afirmam que o regime de Kim Jong Un certamente revidará a mudança de submarinos do Sul com outras medidas militares.

Corrida armamentista

Especialistas alertam que a Coreia do Norte e a Coreia do Sul estão intensificando rapidamente uma corrida armamentista, e outras nações do Nordeste Asiático também estão aumentando os gastos com defesa.

“Não acho que haja dúvidas: já estamos em uma corrida armamentista”, disse Andrei Lankov, professor de história e relações internacionais da Universidade Kookmin, em Seul.

“Há um medo crescente entre os aliados da região em relação ao compromisso dos EUA com a segurança”, disse à DW.

“Trump parece não se cansar de dizer que está farto de seus aliados parasitas, ou seja, Coreia do Sul e Japão, e que a qualquer momento pode anunciar que os EUA vão fazer as malas e partir.”

“Para ambos os países, isso seria uma ameaça real, mas especialmente para a Coreia do Sul, que tem um inimigo com armas nucleares que já atacou várias vezes sua fronteira no passado”, disse Lankov.

“Portanto, é natural que Seul aumente drasticamente seu potencial militar e, possivelmente, se torne uma potência nuclear”, acrescentou.

O segundo fator é o desenvolvimento militar “extremamente rápido” da Coreia do Norte na última década, aponta Lankov, que viu o regime obter mísseis balísticos intercontinentais de combustível sólido e expandir seu arsenal de ogivas nucleares.

Mais recentemente, esse salto militar foi auxiliado pela Rússia. Há indícios de que Moscou esteja fornecendo a Pyongyang os reatores miniaturizados necessários para alimentar seus próprios submarinos nucleares planejados.

O terceiro fator inevitável é o armamento da China, que está dedicando enormes esforços para expandir suas forças armadas e equipá-las com os sistemas militares mais avançados disponíveis.

Pyongyang mostra sua força

“A China quer reafirmar seu antigo papel no Leste Asiático como o grandioso centro de poder que ninguém mais é capaz de desafiar”, disse Lankov.

Ao mesmo tempo, os EUA estão cada vez mais buscando se “desligar” da região, de acordo com Lankov, o que representa um sério desafio, mesmo que algumas tropas americanas permaneçam na Península Coreana.

Além disso, quaisquer ameaças à Coreia do Sul tornam-se mais graves devido ao aprofundamento da aliança de Pyongyang com a Rússia e a um entendimento mais duradouro com a China.

Essas alianças também permitem que Pyongyang seja mais agressiva.

O regime disse que testou um míssil hipersônico na semana anterior à chegada de Trump à Coreia do Sul, antes do fórum da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec), em 1º de novembro, e disparou uma bateria de mísseis de cruzeiro ainda mais perto de sua chegada.

Pyongyang também realizou lançamentos de mísseis e artilharia na segunda-feira (03/10), no mesmo dia em que o secretário de Defesa dos EUA, Pete Hegseth, visitou a Zona Desmilitarizada.

Taipei e Tóquio investem mais em armas

Em outras partes da região, a China está realizando testes marítimos com seu terceiro porta-aviões, o Fujian, ao mesmo tempo em que testa cada vez mais as defesas aéreas e marítimas do Japão — ao redor das ilhas de Okinawa — e das Filipinas no Mar da China Meridional.

Pequim também tem ambições de longo prazo de obter o controle sobre Taiwan, que considera uma província separatista – a nação insular se vê como independente, com sua própria Constituição e líderes democraticamente eleitos. Taipei tem ampliado seus gastos militares, principalmente com a compra de 66 caças F16V e bombas planadoras dos EUA.

O Japão também encampou um significativo aumento de sua defesa, investindo pesadamente em ativos marítimos e aéreos, com novos mísseis avançados, uma força submarina maior e drones marítimos e aéreos.

A primeira-ministra japonesa, Sanae Takaichi, disse a Trump durante reunião em Tóquio, no fim de outubro, que o Japão estava aumentando os gastos com defesa de 1% do PIB para 2% até o início do próximo ano fiscal, que começa em 1º de abril.

O Japão também assinou um acordo para fornecer à Austrália 11 fragatas da classe Mogami e está em negociações com o governo da Nova Zelândia sobre outro acordo para navios de guerra.

Ao mesmo tempo, Tóquio concordou em fornecer às Filipinas aeronaves de patrulha costeira e sistemas de radar avançados para ajudar as forças de Manila a monitorar melhor os navios chineses que operam em águas disputadas no Mar do Sul da China.

Fim de período de paz relativa

Dan Pinkston, professor de relações internacionais no campus de Seul da Troy University, disse que as nações asiáticas desfrutaram de décadas de relativa paz, mas que essa estabilidade está se desintegrando.

Pinkston disse à DW que muitos países do Leste Asiático se desenvolveram economicamente e agora têm fundos suficientes para investir em suas forças armadas.

Ele também alertou que a compra de submarinos nucleares pode ser um trampolim para a Coreia do Sul obter armas nucleares, independentemente do apoio de Seul ao Tratado de Não Proliferação Nuclear.

“Nunca podemos ter certeza, sob o governo Trump, sobre os detalhes dos acordos que ele faz ou o que ele vai propor a seguir”, disse Pinkston, citando o apoio inesperado do presidente dos EUA em relação à Coreia do Sul e aos submarinos nucleares.

“Mas depois disso, a Coreia do Sul fará tudo sozinha?”, questionou.

“Eles estão planejando comprar urânio enriquecido dos EUA para os reatores, mas a Coreia do Sul tem seus próprios reatores e poderia enriquecer seu próprio combustível. E por que parar por aí, já que a próxima etapa é desenvolver suas próprias armas nucleares?”, apontou o professor.

“Se o plano é que esses submarinos tenham mísseis com ogivas convencionais, não é um grande passo projetar uma ogiva nuclear que Seul decida que precisa para sua própria segurança”, disse Pinkston. “Esse é o potencial ao qual já estamos nos aproximando.”