O país mais poluidor na Europa planeja flexibilizar sua lei ambiental e acabar com as metas por setor – depois de ter obtido diferentes graus de sucesso. Acompanhe a evolução desde 2010.O governo alemão planeja descartar uma importante cláusula de sua lei climática que obriga os ministérios a reduzirem a emissão de gases do efeito estufa nas áreas que controlam.

O país é atualmente obrigado por uma lei federal a reduzir essas emissões a 65% dos níveis de 1990 até o final da década, com metas anuais para cada setor – energia, edifícios, transporte, indústria, agricultura e resíduos.

Mas, após pressão do Partido Liberal Democrático (FDP), parceiro menor da coalizão governamental, que controla os ministérios das Finanças e dos Transportes, o governo alemão concordou em junho de 2023 em abandonar as metas setoriais e, em vez disso, mirar apenas na meta mais abrangente de 2030.

A lei havia sido modificada pela última vez em 2021, depois que o mais alto tribunal do país decidiu que a legislação estava empurrando muito o fardo de impedir as mudanças climáticas para as gerações futuras.

Os cientistas temem que aliviar a pressão sobre setores individuais – permitindo que o progresso em alguns compense as falhas em outros – atrase as correções e torne a meta de 2030 mais difícil de atingir. Em sua última revisão, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), órgão de pesquisa ligado à ONU, apontou que todos as rotas para limitar o aquecimento global a 1,5 graus Celsius precisam de “reduções de emissões de de gases de efeito estufa que sejam rápidas, profundas e, na maioria dos casos, imediatas em todos os setores”.

O progresso no corte de emissões da Alemanha, maior e mais poluidora economia da Europa, é crucial para o sucesso do Acordo Verde Europeu – uma tentativa de tornar a Europa o primeiro continente com impacto climático neutro. Em 2022, o país ainda emitiu um total de 746 milhões de toneladas (Mt) de gases de efeito estufa em seis setores-chave.

Veja abaixo a velocidade com que o país reduziu as emissões em cada área de sua economia desde 2010 e quanto ainda precisa reduzir para atingir suas metas climáticas.

Energia

A Alemanha tem que reduzir a poluição no setor de energia para 108 Mt até o final da década. Até agora, as emissões caíram de 369 Mt em 2010 para 256 Mt em 2022.

O setor de energia é a maior fonte de emissões da Alemanha. Ele emite quase tanta poluição quanto os próximos dois maiores setores juntos. Mas ao fechar usinas de carvão e construir turbinas eólicas e painéis solares, o país limpou rapidamente uma rede elétrica suja.

A Alemanha superou suas metas do setor de energia nos últimos anos – compensando o lento progresso em outras áreas da economia – impulsionada em parte por uma queda na atividade econômica durante os lockdowns da pandemia de covid-19.

Em 2022, depois que a Rússia invadiu a Ucrânia, a Alemanha queimou mais carvão para substituir o déficit de gás importado. As emissões do setor aumentaram, mas ainda assim ficaram abaixo do limite legal.

Indústria

A Alemanha deve reduzir a poluição no setor industrial para 119 Mt até o final da década. Até agora, as emissões caíram de 186 Mt em 2010 para 164 Mt em 2022.

A indústria alemã – que cobre tudo, desde a produção de vidro e papel até produtos químicos para fertilizantes – depende fortemente de gás fóssil. A queda mais acentuada nas emissões industriais ocorreu em 2022, depois que as tensões com a Rússia dispararam os preços do gás e os temores de um déficit levaram algumas empresas a cortar a produção e usar o gás com mais eficiência.

As emissões industriais estão entre as mais difíceis de corrigir porque os principais processos químicos usados no setor liberam CO2. As tecnologias mais promissoras nas duas indústrias mais sujas – fabricar aço com hidrogênio verde e capturar carbono de fábricas de cimento – estão apenas começando a ser incorporadas.

Ainda assim, algumas correções de curto prazo são possíveis. Ao aumentar a eficiência, as emissões industriais podem cair antes mesmo que as novas tecnologias estejam prontas para o mercado. Cortar a demanda por produtos-chave – por exemplo, fabricando carros menores ou alterando os códigos de construção para usar menos concreto – também ajudaria.

Edificações

A Alemanha deve reduzir a poluição no setor de edificações – que inclui a calefação dos prédios – para 66 Mt até o final da década. Até agora, as emissões caíram de 148 Mt em 2010 para 111 Mt em 2022.

Existem várias tecnologias poderosas para limpar o setor de edificação – de bombas de calor elétricas a isolamento de paredes –, mas implantá-las em milhões de residências em todo o país é mais complicado.

Nas últimas semanas, os partidos disputaram ferozmente sobre um plano estabelecido no acordo de coalizão do governo para proibir novas instalações de calefação a óleo e gás a partir de 2024, em favor de sistemas de aquecimento que funcionem com pelo menos 65% de energia renovável.

O projeto de lei agora foi enfraquecido para permitir algumas novas caldeiras de combustível fóssil até 2028 e abre brechas para a queima de gases como o hidrogênio, que podem ser produzidos de forma limpa, mas são hoje escassos.

Transporte

A Alemanha tem que reduzir a poluição no setor de transporte para 84 Mt até o final da década. Até agora, as emissões caíram de 153 Mt em 2010 para 148 Mt em 2022.

O setor de transportes foi o que menos avançou. Apesar de algumas variações no meio do período, as emissões em 2019 foram as mesmas de 1990 em 164 Mt. Elas caíram repentinamente durante os lockdowns da pandemia de covid-19, quando as pessoas foram forçadas a ficar em casa, mas aumentaram lentamente desde então.

O Ministério dos Transportes foi criticado por ativistas e cientistas por se recusar a criar um plano viável para atingir suas metas – uma exigência para setores que falham em suas metas. No ano passado, o Conselho de Especialistas em Mudanças Climáticas nomeado pelo governo disse que os planos do Ministério dos Transportes eram fracos demais até para justificar uma avaliação formal.

Agropecuária

A Alemanha tem que reduzir a poluição no setor agrícola para 57 Mt até o final da década. Até agora, as emissões caíram de 66 Mt em 2010 para 62 Mt em 2022.

O setor agrícola da Alemanha cumpriu suas metas climáticas nos últimos três anos, embora as emissões estejam caindo lentamente.

As fazendas têm muitas fontes de poluição além dos combustíveis fósseis queimados para operar as máquinas. Animais ruminantes expelem metano, um gás 80 vezes mais forte que o dióxido de carbono em um período de 20 anos, e fertilizantes à base de nitrogênio geram óxido nitroso, que é 273 vezes mais forte. Mudanças na forma como a terra é usada – particularmente transformando florestas em pastos – liberam CO2 e impedem que a natureza o sugue tanto da atmosfera.

Embora as emissões da agricultura sejam difíceis de reduzir a zero do ponto de vista tecnológico, as mudanças na demanda podem ter um impacto descomunal. Desperdiçar menos comida em casa – e regras mais rígidas para impedir perdas na cadeia de abastecimento – reduz a quantidade de terra que deve ser dedicada à agricultura. Comer menos carne e laticínios faz o mesmo e reduz o número de animais que precisam ser criados.

Resíduos

A Alemanha tem que reduzir a poluição no setor de resíduos para 5 Mt até o final da década. Até agora, as emissões caíram de 11 Mt em 2010 para 4 Mt em 2022 – e assim já ultrapassou sua meta legal.

Os resíduos representam apenas uma pequena fração das emissões da Alemanha. Ainda assim, alimentos que apodrecem em aterros liberam metano, e lixo queimado em incineradores libera CO2. Em cidades densamente povoadas, conectar apartamentos ao aquecimento distrital alimentado por incineradores de resíduos pode ser uma solução útil se o carbono puder ser totalmente capturado e armazenado. Além disso, estratégias para gerar menos resíduos podem ter um efeito maior sobre o clima ao evitar a produção desnecessária de bens.

Meta para 2030

Em 2030, de acordo com a lei atual, a Alemanha não deve emitir mais de 440 Mt de gases de efeito estufa – abaixo dos 746 Mt em 2022.

Nesse ponto, as emissões do setor de energia devem ter diminuído o suficiente para torná-lo o segundo maior poluidor, atrás da indústria. Os dois setores juntos seriam responsáveis por quase tanto quanto os setores de transporte, construção, agricultura e resíduos combinados.

Mas mesmo esses níveis de poluição não são suficientes para evitar que o planeta aqueça 1,5 grau Celsius, de acordo com o Climate Action Tracker, um projeto de duas organizações alemãs de pesquisa ambiental. Para fazer sua parte de forma justa, a Alemanha precisaria cortar suas emissões em pelo menos 69% – em vez de 65% – e dar mais dinheiro a outros países que poluíram menos.