09/05/2025 - 13:49
Aves migratórias percorrem grandes distâncias para se alimentar e reproduzir, às vezes cruzando continentes e oceanos em tempo recorde. Será que elas estão sendo impactadas pelo aumento das temperaturas globais?As aves sempre foram uma fonte de inspiração para a humanidade, com os aviões sugerindo um desejo humano de imitá-las. No entanto, elas têm mais a ensinar do que o poder de voar. Duas vezes por ano, quando animais em hibernação, como ursos e esquilos, se aconchegam para um sono profundo que pode se esticar até a primavera, as aves migratórias se preparam para embarcar em jornadas épicas por terra e mar.
Ao fazê-lo, desempenham um papel crucial na manutenção do equilíbrio da natureza. Durante o voo de um lugar para outro, polinizam plantas, espalham sementes e controlam pragas ao se alimentar de insetos e outros invertebrados, ajudando a manter a saúde dos ecossistemas, o que, por sua vez, contribui para a segurança alimentar.
Mas isso não é tudo. Francisco Rilla, biólogo da vida selvagem e consultor da ONU com foco em conservação de espécies migratórias, lembra que essas aves também servem como “bioindicadores”: como tendem a evitar áreas poluídas, seus movimentos fornecem informações úteis para a avaliação da qualidade da água e do ar.
Ida e volta aos confins da Terra
Em sua jornada de outono, as aves migratórias observam a luz do dia minguante, que compreendem como um sinal de que os alimentos essenciais logo estarão em falta, e de que está hora de rumar para o sul.
Algumas, como a pequena andorinha do Ártico, deixam o escuro e frio Polo Norte durante o inverno e voam até o Círculo Antártico, numa viagem de ida e volta de cerca de 90 mil quilômetros. Essa longa jornada a torna recordista da rota migratória mais longa do reino animal.
Outro campeão é o fuselo, que voa do estado do Alasca, no norte dos Estados Unidos, até a ilha australiana da Tasmânia. Um espécime de cinco meses de idade detém o recorde do Guinness para o voo sem escalas mais longo, tendo percorrido 13.560 quilômetros em 11 dias e uma hora.
Os fuselos, que se alimentam por dois meses no Alasca, podem reduzir o tamanho de seus órgãos internos para criar espaço para as reservas de gordura ricas em energia, necessárias para mantê-los vivos durante sua longa jornada. Mas, para algumas espécies, as mudanças climáticas estão tornando esses feitos cada vez menos prováveis.
Impactos da atividade humana
As aves migratórias usam o sol, as estrelas, o litoral e grandes massas de água para se guiar em suas jornadas pelo mundo. Contudo, alguns locais onde param para descansar e reabastecer ao longo da costa estão sendo alterados por enchentes relacionadas à elevação do nível do mar.
Pequenos crustáceos, que são uma importante fonte de alimento, podem ter dificuldade para construir suas conchas e esqueletos em oceanos que ficam mais ácidos ao absorverem mais dióxido de carbono. Isso gera um efeito cascata sobre as aves migratórias.
Sem alimento suficiente, elas têm menos probabilidade de sobreviver a jornadas árduas ou se reproduzir com sucesso. Assim como os humanos, as aves também são ameaçadas pela crescente intensidade e frequência de eventos climáticos extremos, como tempestades. Ventos fortes podem arrastá-las para baixo e matá-las.
E as mudanças climáticas podem impactar como as aves migratórias se comportam. Temperaturas mais altas agravam a ameaça da escassez de alimentos, forçando-as a encurtarem suas rotas ou impedindo-as de retornar a seus habitats originais.
Isso, por sua vez, pode gerar conflitos por alimento entre as aves migratórias e os animais locais. Enquanto algumas, como a andorinha do Ártico, compensam os ventos fortes gastando mais energia em suas jornadas, outras espécies sucumbem às pressões da atividade humana. Uma delas foi o fuselo, declarado extinto em 2024. Pesquisadores deduzem que a espécie não se adaptou à perda de habitat.
Como ajudar as aves migratórias
Os humanos que tentam ajudar, alimentando as aves, podem estar fazendo mais mal do que bem, alerta Rilla: consumindo pão e sementes que fazem parte da dieta dos humanos, elas podem ficar saciadas demais para buscarem os alimentos que lhes fornecem nutrientes essenciais. Além disso, depositar comida em locais de fácil visualização pode expô-las a predadores.
Em vez disso, Rilla recomenda ajudar os viajantes celestes instando os governos a expandirem a rede de áreas protegidas com tratados internacionais, como a Convenção sobre a Conservação das Espécies Migratórias da Vida Selvagem. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) concorda com essas recomendações, e sugere ir além, criando locais mais “favoráveis às aves”.
O Dia Mundial das Aves Migratórias, comemorado em 10 de maio, enfatiza neste ano a promoção da coexistência entre humanos e aves. A mensagem principal é incentivar a criação de habitats saudáveis, reduzir a poluição e evitar edifícios de vidro, que representam um risco significativo de colisão para as aves.
Se as aves migratórias começarem a desaparecer, isso poderá impactar a agricultura e a cadeia alimentar. E, como diz Rilla, “o que acontecer com elas também poderá acontecer conosco”.