29/10/2025 - 11:08
A recente descoberta de mosquitos na Islândia é apenas uma das formas pelas quais a crise climática ameaça à saúde. Um novo estudo afirma que a humanidade está diante de riscos sem precedentes.As consequências do mudanças climáticas nunca foram tão perigosas para a saúde humana. É o que alertam os 128 principais cientistas por trás do Lancet Countdown Report, considerado um indicador renomado das conexões científicas entre saúde e aquecimento global.
De ataques cardíacos e exaustão pelo calor a problemas de saúde mental e à disseminação de doenças tropicais, a crise climática está ameaçando cada vez mais pessoas ao redor do mundo, segundo um relatório publicado nesta terça-feira (28/10).
“O balanço de saúde deste ano pinta um quadro sombrio e inegável dos danos devastadores à saúde que estão alcançando todos os cantos do mundo”, disse Marina Romanello, diretora executiva do Lancet Countdown, uma colaboração internacional independente de pesquisa, sediada na University College London.
As mortes relacionadas ao calor aumentaram 23% desde os anos 1990 e já passam de meio milhão por ano. A fumaça de incêndios florestais foi associada a um recorde de 154 mil mortes em 2024, enquanto a poluição do ar causada pela queima de combustíveis fósseis mata 2,5 milhões de pessoas todos os anos.
Riscos à saúde aumentaram no último ano
“Estamos vendo milhões de mortes todos os anos por causa da nossa persistente dependência de combustíveis fósseis, por causa do atraso na mitigação das mudanças climáticas e dos atrasos na adaptação às mudanças que não podem mais ser evitadas”, disse Romanello.
As conexões entre saúde e aquecimento global estão se tornando mais evidentes à medida que as mudanças climáticas, impulsionadas pela queima de carvão, petróleo e gás, continuam causando devastação no planeta.
O ano passado foi o mais quente já registrado, e os níveis de CO₂ na atmosfera atingiram novos recordes. Em 2024, devido às mudanças climáticas, o mundo enfrentou em média 16 dias adicionais de calor extremo prejudicial à saúde. Para os grupos mais vulneráveis da sociedade, como bebês e pessoas acima de 65 anos, esse número subiu para 20 dias extras de ondas de calor.
Segundo o relatório, 13 dos 20 indicadores que representam riscos à saúde humana aumentaram significativamente no último ano. O aspecto mais preocupante é que quase todos os indicadores estão indo na direção errada, explicou Romanello.
Custos para a saúde e para a economia
As mudanças climáticas estão intensificando eventos climáticos extremos, que estão se tornando mais frequentes e intensos ao redor do mundo.
Ondas de calor – a forma mais mortal de evento climático extremo – podem superaquecer o corpo, sobrecarregar órgãos vitais e dificultar o sono. Inundações podem contaminar a água potável e espalhar infecções, enquanto as secas estão agravando a desnutrição e a fome com a perda de colheitas. A fumaça dos incêndios florestais – que em 2024 corresponderam a uma área maior que a Índia – prejudica os pulmões, o coração e até bebês ainda no útero.
Na sequência de desastres climáticos, a interrupção do fornecimento de energia e os danos na infraestrutura também dificultam o acesso a suprimentos e cuidados médicos. Segundo Romanello, a maioria dos afetados por eventos climáticos extremos no mundo não tem seguro de saúde, o que os torna ainda mais vulneráveis aos riscos à saúde.
Esses riscos não custam apenas vidas humanas, mas também têm impacto econômico. A escassez de água ou alimentos e as condições sanitárias precárias após desastres custam centenas de bilhões de dólares por ano. Segundo estimativas, o calor extremo custou mais de um trilhão de dólares em 2024 – cerca de 1% da produção econômica global – devido à perda de produtividade por doenças e ausências no trabalho.
Dengue e doenças tropicais estão se espalhando
Mosquitos, carrapatos e mutucas – alguns dos quais transmitem doenças infecciosas mortais – também estão se espalhando para mais regiões à medida que as temperaturas se elevam.
Em outubro, mosquitos foram documentados pela primeira vez na Islândia, o que pesquisadores associam às mudanças climáticas. Com o aumento das temperaturas abrindo novos habitats para insetos, o número de infectados com dengue, malária, leishmaniose e outras doenças está crescendo no mundo todo.
Em 2024, o número de casos de dengue no mundo bateu recorde, com mais de 7,6 milhões de infectados. Segundo o relatório, o potencial médio global de transmissão da dengue aumentou 49% desde os anos 1950. “Sabemos que as mudanças climáticas estão alimentando pelo menos parte dessa disseminação”, diz Romanello.
Mesmo que nem todas essas infecções sejam fatais, quem adoece muitas vezes fica semanas sem poder trabalhar, gerando consequências econômicas negativas.
Saúde mental também é impactada
As mudanças climáticas também estão aumentando o risco de doenças mentais. Pessoas que vivenciam eventos climáticos extremos como incêndios florestais, furacões ou enchentes severas podem sofrer transtorno de estresse pós-traumático, afirma Jenni Miller, diretora executiva da Global Climate and Health Alliance, uma ONG dos Estados Unidos.
Perdas na colheita devido à seca, escassez de água ou perda de meios de subsistência podem causar ansiedade e levar direta ou indiretamente a problemas de saúde mental. Isso é agravado pela falta de sono causada por noites excessivamente quentes, segundo o relatório.
Como prevenir mais doenças e mortes
Os autores do relatório recomendam três medidas principais para mitigar as consequências da crise climática sobre a saúde.
Primeiro, é preciso expandir a produção de energia renovável para conter o aumento das temperaturas globais. O boom de energia limpa ajudou a reduzir a poluição do ar e evitou mais de 160 mil mortes entre 2010 e 2022, segundo Romanello.
Medidas de adaptação às mudanças climáticas, como tornar edifícios residenciais e infraestrutura pública adequados às condições climáticas extremas, também precisam ser aceleradas. E, por fim, os cientistas alertam que os sistemas de saúde globais precisam ser urgentemente adaptados e equipados para enfrentar os desafios adicionais que as mudanças climáticas apresentam.
