14/04/2025 - 11:11
Aprender novas línguas altera conexões cerebrais e aumenta habilidades cognitivas. Mas isso significa que poliglotas são mais inteligentes?Há inúmeras razões para aprender um novo idioma: trabalho, amor, ou interesse pessoal pela cultura ou povo de uma região. Pesquisas também mostram que aprender idiomas beneficia a saúde geral do cérebro.
Aprender uma nova língua é como exercitar o cérebro. Da mesma forma que os músculos se fortalecem com o treinamento físico, as vias neurais se remodelam quando aprendemos um novo idioma.
É isso que os neurocientistas querem dizer quando afirmam que falantes de vários idiomas processam informações de forma diferente daquelas que falam apenas um. Mas o que realmente acontece no cérebro quando aprendemos uma nova língua, e isso pode aumentar a inteligência?
As áreas da linguagem no cérebro
Antes de responder a essas perguntas, é necessário entender alguns princípios básicos sobre como a linguagem envolve muitas partes distintas do cérebro.
O processamento da linguagem envolve dois circuitos principais: um para perceber e produzir sons, que formam a base da linguagem, e outro para selecionar os sons que serão usados, explica Arturo Hernandez, neurocientista da Universidade da Califórnia em San Diego, nos Estados Unidos.
“Esses circuitos são reconectados à medida que aprendemos e alternamos entre idiomas. Trata-se de mapear sons e decidir em qual idioma operar”, detalha Hernandez.
As áreas sensoriais como o córtex auditivo processam os sons da fala, e as motoras coordenam os músculos envolvidos na fala, como aqueles que controlam a língua, os lábios e as cordas vocais. Isso vale para todos os idiomas, mas mudanças em áreas de “alto processamento” do cérebro são necessárias para aprender um novo idioma.
Por exemplo, a área de Broca é a principal responsável pela sintaxe – a maneira como estruturamos as frases. Ela ajuda a construir frases gramaticalmente corretas e a compreender suas estruturas. Essa região também é fundamental para a produção da fala e facilita o controle motor necessário para a articulação das palavras.
Outras regiões do cérebro, como a área de Wernicke, desempenham um papel importante na compreensão do vocabulário e na recuperação de palavras. Ela ajuda a compreender o significado de cada termo e a armazená-los na memória de longo prazo.
Aprender um novo idioma muda fisicamente o cérebro
Um mediu a atividade cerebral de refugiados sírios antes, durante e depois de aprenderem alemão. Os pesquisadores descobriram que o cérebro dos participantes se reconectava à medida que eles se tornavam mais proficientes no idioma.
Quando as estruturas neuronais do cérebro mudam fisicamente, fala-se em uma “reestruturação cerebral”. Este processo – também conhecido como neuroplasticidade – é a base da aprendizagem. Aprender um novo idioma, portanto, exige do cérebro encontrar novas maneiras de codificar, armazenar e recuperar novas informações linguísticas.
“Estruturalmente, [aprender uma língua] envolve o aumento da estrutura da massa cinzenta em áreas relacionadas ao processamento da linguagem e à função executiva”, explica Jennifer Wittmeyer, neurocientista cognitiva do Elizabethtown College, na Pensilvânia, nos Estados Unidos.
Mudanças estruturais no cérebro também alteram a maneira como ele funciona, pois modificam fisicamente a maneira como os neurônios se comunicam. Essa chamada “plasticidade neural” ajuda a lembrar de determinadas palavras mais rápido, a reconhecer novos sons com mais facilidade e melhorar a pronúncia, controlando os músculos da boca.
“Funcionalmente, [a aprendizagem de línguas] melhora a conectividade entre regiões do cérebro, permitindo uma comunicação mais eficiente entre redes envolvidas na atenção, memória e controle cognitivo”, afirma Wittmeyer.
As vantagens de aprender idiomas na infância
Estudos apontam que usamos as mesmas redes cerebrais para todos os idiomas, mas o cérebro responde de forma diferente à nossa língua materna. Um estudo constatou inclusive uma diminuição da atividade cerebral quando os participantes ouviram seu idioma materno. Segundo os pesquisadores, isso sugere que a primeira língua aprendida é processada de forma diferente no cérebro e com um esforço mínimo.
Pesquisas também sugerem que aprender novos idiomas é muito mais fácil para crianças pequenas do que para adultos.
Isso acontece porque o cérebro na infância ainda está em desenvolvimento, sendo, portanto, mais adaptável à plasticidade neural e ao aprendizado. Ao contrário dos adultos, elas não precisam traduzir a partir de sua língua materna, tornando mais fácil o aprendizado de sons, da gramática e das palavras.
“Cedo na infância, não há tanta rigidez no cérebro. Cérebros adultos já estão estruturados em torno de uma primeira língua, então um segundo idioma precisa se adaptar ao conhecimento existente, em vez de se desenvolver de forma independente, pois depende de redes neurais previamente estabelecidas”, disse Hernandez.
Aprender um idioma torna alguém mais inteligente?
De acordo com algumas pesquisas, o multilinguismo tem um efeito positivo sobre habilidades cognitivas, como memória e capacidade de resolução de problemas. Mas isso significa, automaticamente, que poliglotas são mais inteligentes?
Difícil dizer, mas provavelmente não, avalia Hernandez. “Se alguém fala mais de uma língua, seu repertório verbal aumenta. Eles têm mais palavras em todas as línguas, mais itens, necessariamente mais conceitos”, disse Hernandez.
Mas não está claro se ter um vocabulário maior se deve a uma reserva cognitiva maior ou apenas a ter mais palavras armazenadas nos bancos de memória do cérebro.
Para testar se, de fato, os poliglotas são mais inteligentes, os cientistas precisariam “encontrar uma tarefa que não esteja relacionada à linguagem”, disse Hernandez.
Até o momento, não há evidências claras de que poliglotas tenham melhor desempenho em tarefas não relacionadas a idiomas.
Tampouco se sabe ao certo se as mudanças nas habilidades cognitivas em falantes de diversos idiomas se devem a esse aprendizado ou a outros fatores, como educação ou o ambiente em que cresceram.