31/07/2025 - 17:31
Ao taxar produtos brasileiros, Trump pode estar errando o alvo e acabar ajudando o governo Lula a recuperar popularidade, afirmam analistas.A imposição de tarifas punitivas à economia brasileira e as sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), provocaram fortes reações no Brasil. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva condenou a interferência dos EUA no Judiciário brasileiro como “inaceitável”. A motivação política por trás das medidas, afirmou Lula, mina a soberania nacional do Brasil e a relação histórica entre os dois países.
O governo de Donald Trump impôs tarifas de 50% sobre as importações brasileiras para os EUA a partir de 6 de agosto. No entanto, surpreendentemente, cerca de 700 produtos foram isentos das tarifas. Segundo especialistas, isso ainda coloca a tarifa média sobre produtos brasileiros em torno de 30%, enquanto a UE e o Japão foram cobrados em 15%.
Além dos supostos desequilíbrios no comércio bilateral, os EUA também citam o julgamento de Bolsonaro, presidido por Moraes, como motivação para as sanções.
“Trump rasga fundamentos da Lei Magnitsky”
As sanções pessoais impostas a Moraes estão previstas na Lei Magnitsky, que até então só era aplicada contra criminosos e ditadores. Moraes é o primeiro brasileiro entre os punidos por essa legislação e pode enfrentar, entre outras coisas, o congelamento de seus bens nos Estados Unidos. Antes, Washington já havia revogado os vistos de entrada de Moraes e de outros juízes do STF.
“A Lei Magnitsky já foi aplicada antes contra inimigos dos Estados Unidos, mas continuava tendo um fundo de direitos humanos. Mas quando Trump utiliza a Lei Magnitsky agora pela primeira vez contra um juiz de uma democracia, ele está rasgando os fundamentos de direitos humanos dessa lei”, disse o sociólogo e jornalista Demétrio Magnoli à DW.
Segundo Magnoli, Trump costuma usar as tarifas como arma na guerra comercial. “Mas, no caso do Brasil, ele usa tanto as tarifas quanto a Lei Magnitsky por razões políticas e ideológicas. Um caso único no mundo e um ataque direto a um país democrático e aliado aos Estados Unidos.”
Moraes tem sido uma pedra no sapato da direita de Donald Trump nos EUA desde que sancionou a plataforma X por várias semanas em 2024. Ele exigiu o fechamento de várias contas de usuários que violavam a lei brasileira. Por isso, o dono do X, Elon Musk, chegou a pedir o impeachment do ministro.
Moraes está na mira de Trump por causa do julgamento de seu aliado Bolsonaro. O ex-presidente é acusado de planejar um golpe contra seu sucessor, Lula, no final de 2022. Bolsonaro e seus co-réus negam, enquanto Trump fala em “caça às bruxas”. Bolsonaro pode pegar até 40 anos de prisão.
Nos últimos anos, Moraes já havia investigado Bolsonaro por, entre outras coisas, espalhar notícias falsas. Também condenou vários de seus apoiadores pela invasão das sedes dos Três Poderes, em Brasília, em janeiro de 2023. Celebrado como defensor da democracia pela esquerda em torno de Lula, Moraes é, para a direita brasileira, a personificação do diabo – e agora, também, para os Estados Unidos.
O fato de Trump, ao contrário do que anunciou há duas semanas, agora permitir inúmeras isenções tarifárias demonstra que o Brasil vem negociando bem com os americanos, avalia Guilherme Casarões, cientista político da Fundação Getúlio Vargas. “Isso mostra também claramente que a motivação do Trump é menos comercial e muito mais política. Até mesmo porque o Brasil tem um déficit comercial com os Estados Unidos.”
Segundo Casarões, há três fatores políticos principais por trás do ataque de Trump ao Brasil: primeiro, os laços estreitos do Brasil com a China, o que o torna um campo de batalha no conflito geopolítico entre China e EUA. O segundo motivo é ideológico: Trump precisa apoiar seus aliados ao redor do mundo. E terceiro, os interesses econômicos das big techs. “Elas não querem a regulamentação das redes sociais.”
Onda de nacionalismo
No Brasil, o ataque de Trump desencadeou uma onda de nacionalismo, especialmente nas redes sociais. Não sem razão, disse o sociólogo Celso Rocha de Barros à DW. Ele descreve a “intervenção americana contra o Supremo brasileiro” como uma “agressão imperialista inaceitável”. Daqui em diante, a regra para negociar com os Estados Unidos deveria ser essa, afirmou: “Negociar acordos econômicos sem ceder um centímetro que seja na questão democrática e política”.
Para Rocha de Barros, Alexandre de Moraes sai mais forte deste episódio. Mesmo ministros da Suprema Corte com posições mais favoráveis a Bolsonaro, segundo ele, podem não querer dar a impressão de que apoiam uma intervenção estrangeira, liderada por Trump, contra a corte da qual fazem parte.
Mas para Demétrio Magnoli, os ataques a Moraes fazem sentido para muitos brasileiros. Ele destaca que existe um mal-estar de uma grande parte da população brasileira em relação ao STF por causa dos super-salários do Judiciário, mas também pelas “sentenças aos idiotas úteis de Bolsonaro do 8 de Janeiro de 2023”, que Magnoli considera exageradas. Além disso, outro motivo seria, conforme o analista, que Moraes “tem concentrado poderes extraordinários nos processos contra Bolsonaro”.
Enquanto isso, o ataque de Trump ao Brasil representa uma oportunidade para o presidente Lula, que antes vinha enfrentando dificuldades nas pesquisas, de acordo com Magnoli. “Se Lula conseguir persuadir o Congresso a apoiar medidas de auxílio à economia afetada pelas sanções de Trump, isso poderá ajudar sua popularidade em declínio.” Seria o oposto do que Trump esperava com o ataque.