08/12/2025 - 15:38
Entre as ruínas da Europa e o avanço implacável do Exército Vermelho em 1944, milhares de menores se viram sozinhos, famintos e sem identidade. São as chamadas “crianças-lobo” (Wolfskinder), órfãos da antiga Prússia Oriental que tiveram de lutar pela sobrevivência em florestas e vilarejos estrangeiros após o fim da Segunda Guerra Mundial.
Cerca de 20 mil crianças alemãs fugiram sozinhas para a Lituânia;
Para sobreviver, muitas tiveram que adotar novos nomes e esquecer a língua materna;
Relatos envolvem cenários de guerra, fome extrema e violência sexual.
À medida que as tropas soviéticas avançavam, buscando vingança brutal pela invasão nazista de 1941, famílias inteiras foram separadas e casas destruídas. As crianças, até então protegidas, foram lançadas em um mundo hostil.
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“Eu me lembro de uma vez ter rastejado por cima de uma pilha de cadáveres humanos, e estava sozinha, rastejando sozinha. Só eu”, conta a sobrevivente Luise Quitsch.
“Na família, a primeira regra era: proibido falar alemão, só lituano. Mas às vezes eu falava escondido com meu ursinho de pelúcia”
O fim do paraíso e a fuga Para Johanna Rüger, outra sobrevivente, a infância foi interrompida abruptamente. “Até 20 de outubro de 1944, todos nós tivemos uma infância como o paraíso na Terra. Mas a partir de 21 de outubro, tivemos que fugir em carroças puxadas por cavalos”, relembra.
O destino de cerca de 20 mil desses menores foi a Lituânia. Luise tinha apenas 4 anos quando fugiu de Königsberg (atual exclave russo de Kaliningrado). Ela foi acolhida por uma família lituana, um ato de compaixão que envolvia grandes riscos. Como as forças nazistas haviam devastado o país durante a ocupação, o alemão era a língua do inimigo.
Identidade apagada
Para se integrar e sobreviver, Luise recebeu um nome lituano e foi proibida de falar sua língua materna. “Na família, a primeira regra era: proibido falar alemão, só lituano. Mas às vezes eu falava escondido com meu ursinho de pelúcia, que finalmente ganhei em algum momento. Havia muitas crianças da Prússia Oriental na Lituânia, e todas nós éramos vistas como fascistas”, diz Luise.
Além da supressão cultural e da fome, a fuga expôs essas crianças a traumas profundos, incluindo o testemunho de violência sexual cometida por soldados. As cicatrizes moldaram suas vidas adultas.
“Eu nunca quis me casar. Sempre senti que tudo aqui era provisório para mim. Eu não pertenço a esse círculo. Sou uma estranha e, em algum momento, algo vai mudar”, desabafa Luise.
Reencontro com o passado
Após a guerra, os destinos se dividiram: Johanna foi levada para a Alemanha Oriental, enquanto Luise permaneceu na Lituânia. Oitenta anos depois, elas se reuniram no país báltico — o local que, apesar das dificuldades e da hostilidade inicial, salvou suas vidas.
