Não é todo dia que surge um anúncio imobiliário desses: uma propriedade com mais de 136 mil metros quadrados, incluindo 11.664 metros quadrados de área útil e 130 quartos. As freiras beneditinas da abadia de St. Erentraud, perto de Kellenried, no sul do estado alemão de Baden-Württemberg, entre o Lago Constança e Ulm, estão procurando alguém para comprar seu convento. Preço: pouco menos de 5 milhões de euros (R$ 32,2 milhões).

A irmã Eva-Maria confirma o anúncio por telefone, mas não quer dar detalhes. “No momento, não estamos falando muito sobre isso”, diz. O convento tem um site simpático e informativo, com uma foto principal mostrando muito mais irmãs do que as cerca de uma dúzia que vivem lá hoje. Em 2018, ainda havia 19 freiras no convento.

As primeiras freiras chegaram lá em 1924, e o convento foi oficialmente fundado dois anos depois. Agora, uma descrição de como foi a comemoração do centenário em 2024 aparece ao lado de uma nota informando que a ala para hóspedes foi fechada. Segundo especialistas, mesmo a venda do prédio não trará muito lucro para a ordem, pois construir acomodações adequadas para as freiras restantes será cara.

Mudança drástica em vinte anos

A vende do convento de Kellenried está sendo conduzida por um corretor especializado. O caso chama a atenção, mas não é o único desse tipo. Todos os anos, dezenas de mosteiros e conventos na Alemanha, grandes e pequenos, estão sendo fechados.

Segundo dados da Conferência das Ordens Religiosas da Alemanha (DOK), o número de conventos na Alemanha caiu de 1.627 para 964 de 2012 a 2022. O número de mosteiros caiu de 461 para 385 no mesmo período. Tradicionalmente, sempre houve mais freiras e conventos do que monges e mosteiros na Alemanha, principalmente porque na Igreja Católica as mulheres são impedidas de serem ordenadas diaconisas, sacerdotisas ou bispas.

Em 2004, as ordens femininas do país tinham 26.370 membros e as ordens masculinas 5.108, de acordo com a DOK. Dez anos depois, havia 17.513 mulheres e 4.370 homens, e em 2024, apenas 9.467 mulheres e 3.161 homens. O ápice das ordens femininas após a Segunda Guerra Mundial foi 1960, quando tinham mais de 93 mil freiras.

O que explica o fenômeno

A vice-presidente da DOK, Maria Thoma Dikow, acredita que há várias razões para a queda nos números. Por um lado, disse à DW, a força da igreja para conectar pessoas diminuiu. Ela também disse que agora é raro encontrar famílias com muitos filhos, que costumavam fornecer um número considerável de freiras.

E há outro fator que ela acredita ser importante. “Antigamente, as mulheres mal podiam estudar e era difícil para elas encontrarem um emprego em empresas privadas que lhes conferisse responsabilidade”, disse, enquanto nas ordens religiosas elas tinham essas oportunidades. Há dez anos, ela própria é superiora geral de uma ordem dedicada à assistência social, a Heiligenstädter Schulschwestern.

Dikow disse que sua ordem também atuou em Moçambique por um longo tempo. “Muitas jovens ingressam lá”, disse. “E lá, tenho a impressão de que esse passo é uma chance real para as jovens de hoje se emanciparem, para evitar um casamento que se resume principalmente a ter muitos filhos e, em vez disso, ter uma profissão.”

O número de mulheres em ordens religiosas caiu em muitos países, disse, citando França, Espanha, Polônia, Canadá, Estados Unidos e Austrália, entre outros. Embora um segundo papa consecutivo tenha surgido de uma ordem religiosa, tais organizações católicas parecem estar em crise.

O rápido declínio na Alemanha, que levou muitas ordens à beira da extinção, também tem algumas consequências para a sociedade em geral. Nos últimos anos, as ordens têm transferido escolas ou hospitais que administravam há muito tempo para dioceses, ou mesmo para associações de caridade ou organizações privadas.

Particularmente em áreas rurais na Alemanha de predominância católica, como Eifel, Westfália, Baviera e Baden-Württemberg, numerosos conventos e mosteiros foram dissolvidos nas últimas décadas. Entre eles estão alguns muito conhecidos, como a abadia trapista Mariawald, em Eifel, o mosteiro franciscano Hardenberg-Neviges, a nordeste de Düsseldorf, e o mosteiro franciscano em Werl, destino de peregrinação na Westfália.

É importante notar que essa tendência também é observada nas igrejas protestantes, que têm apenas algumas comunidades monásticas. Hoje, a casa das diaconisas de Kaiserswerth, no norte de Düsseldorf, é um hotel quatro estrelas.

A despedida de um convento ou mosteiro costuma ser dolorosa para os afetados. O padre franciscano Damian Bieger, que viveu no mosteiro de Hardenberg-Neviges, resumiu isso há anos para o meio de comunicação católico katholisch.de: “Em Neviges, conheci os franciscanos. Entrei para a ordem lá; fui capelão lá; fui ministro lá. Doeu terrivelmente.”

Às vezes, vender o prédio pode ser “libertação”

A irmã Maria Thoma não vê as coisas de forma tão drástica. Ela reconhece que a despedida das freiras costuma ser dolorosa. “É necessário um apoio muito bom, sensível e demorado”, disse. Mas a madre superiora destaca que a venda de um prédio às vezes pode ser também “uma libertação”.

Ela conhece exemplos muito bem-sucedidos de irmãs que dizem: “ficamos muito felizes quando vendemos nossa última propriedade, muitas preocupações foram tiradas de nossos ombros.” Ela disse que seu próprio convento em Heiligenstadt estava pronto “para tentar algo novo” e já havia esvaziado um andar e o alugado a um provedor de cuidados para pessoas com deficiência.

Esse exemplo se encaixa bem com as ideias de Ulrike Rose, especialista na preservação de edifícios. Sua empresa é especializada em conventos. Ela trabalhou com a grande abadia beneditina de Santa Hildegarda em Eibingen, que já teve mais de cem irmãs e atualmente tem 33, além do convento das franciscanas de Oberzell em Würzburg, bem como outros conventos da Baviera. “Vale muito a pena pensar no futuro dos edifícios com as irmãs e trabalhar em soluções sustentáveis”, disse.

Se é possível preservar a essência básica de um convento, isso pode ser benéfico para toda a região, afirmou. Muitos moradores das vizinhanças têm carinho por conventos e mosteiros, independentemente de estarem envolvidas com a igreja ou não. Projetos residenciais comunitários iniciados por associações, espaços para atividades culturais e educacionais ou acomodações adequadas para pessoas que buscam paz e apoio espiritual podem ser bem estabelecidos em um complexo desse tipo.

“Estamos falando sobre as propriedades valiosas das ordens, as grandes casas-mãe, bem como mansões ou pequenos castelos” que as pessoas doaram ou cederam às ordens, disse.

“É preciso abertura das irmãs”

A viabilidade da comunidade que morava no convento seguir existindo apesar das mudanças nas circunstâncias “não tem nada a ver com a idade das irmãs, mas sim com sua abertura”, disse Rose.

Ela afirma que, para muitas irmãs, é mais fácil abrir mão completamente de um complexo de prédios para pôr fim a uma situação angustiante do que permitir que estranhos usem o edifício junto com elas. A grandiosidade de certos prédios, muitas vezes, é um fardo, disse. “É importante que as pessoas estejam abertas a receber ajuda”, disse Rose.

Também é necessário tempo para trabalhar em soluções. Muitas vezes, foi possível criar projetos que levaram em consideração os desejos do convento e mantinham o bem comum em vista. “Soluções arquitetônicas inteligentes podem servir para preservar o espaço de vida das irmãs e dividir o fardo da manutenção”, disse.