05/02/2025 - 10:59
Decisão segue decreto que impõe impostos sobre a importação de produtos de menor valor. Regra foi estabelecida por Trump em disputa comercial com a China. Pequim acusa EUA de “repressão irracional”.O Serviço Postal americano (USPS) afirmou nesta quarta-feira (05/02) que suspenderá temporariamente o recebimento e envio de encomendas oriundas de China e Hong Kong. A decisão segue uma medida tomada nesta semana pelo presidente dos EUA, Donald Trump, que encerrou uma cláusula comercial usada por varejistas chinesas como Temu e Shein para enviar pacotes de baixo valor com isenção de impostos para os Estados Unidos.
No decreto que entrou em vigor na terça-feira, Trump eliminou um imposto conhecido como “de minimis” que permitia consumidores dos EUA a não pagar tarifas em remessas abaixo de 800 dólares (R$ 4,6 mil). O modelo é similar ao brasileiro, que há 6 meses instituiu imposto para produtos de até 50 dólares, regra que ficou popularmente conhecida como “taxa das blusinhas”.
Nos EUA, Trump também impôs uma tarifa adicional de 10% sobre produtos chineses. A Casa Branca diz que as novas regras foram impostas para conter o fluxo de fentanil para os EUA. A agência de notícias Reuters revelou que fornecedores chineses usavam essa isenção para exportar materiais químicos para a produção de fentanil, disfarçando-os como eletrônicos e outros produtos de baixo custo.
“Isso é enorme… Pessoas que estão esperando pedidos da Amazon, Shein e Temu não têm como saber quando os receberão”, disse Ram Ben Tzion, fundador da Ultra Information Solution, uma empresa responsável por uma plataforma de verificação de remessas por correio.
“Espero que isso seja uma medida de curto prazo, substituída por uma solução mais equilibrada a longo prazo”, acrescentou.
Tempo para se adequar às novas regras
O USPS afirmou que a mudança não afetará o fluxo de cartas e “flats” – correspondências de até 38 cm de comprimento ou 1,9 cm de espessura – vindas da China e de Hong Kong.
“O USPS precisará de tempo para entender como aplicar os novos impostos antes de permitir a entrada de pacotes chineses novamente nos EUA”, disse Chelsey Tam, analista sênior de ações da Morningstar. Segundo ela, 4 milhões de pacotes nesta categoria entraram nos Estados Unidos em 2024.
Em resposta, Pequim acusou os EUA de “politizar questões comerciais e econômicas”. Prometendo “tomar as medidas necessárias para proteger resolutamente os direitos e interesses legítimos das empresas chinesas”, o porta-voz do Ministério so Exterior da China, Lin Jian, disse que Washington institui uma “repressão irracional”.
A pasta pediu diálogo e negociações entre Pequim e Washington, ressaltando que reduzir a demanda por drogas internamente e fortalecer a cooperação na aplicação da lei seria a solução fundamental para a crise do fentanil nos EUA.
Desdobramentos comerciais
A empresa de logística Easyship alertou seus clientes que agora enfrentarão uma fiscalização muito mais rigorosa. Outras transportadoras internacionais, como FedEx e SF Express – maior empresa de entrega expressa da China –, afirmaram que continuarão enviando pacotes para os EUA.
As varejistas Shein e Temu, que vendem desde brinquedos até smartphones, cresceram rapidamente nos EUA, em parte graças à isenção destes impostos. Segundo um relatório do comitê do Congresso dos EUA sobre a China, publicado em junho de 2023, Shein e Temu representavam juntas mais de 30% de todos os pacotes enviados diariamente para os EUA sob essa isenção.
O relatório também apontou que quase metade de todos os pacotes enviados sob esta regra vinha da China.
“Preencher a documentação para declarações alfandegárias não era algo com que essas empresas precisavam lidar frequentemente antes”, disse Basile Ricard, diretor de operações da Ceva Logistics Greater China.
“É um processo muito novo para elas. Se for um processo manual, será incrivelmente difícil… Neste momento, não está claro como elas vão gerenciar isso”, completou.
A Amazon também tem uma grande base de vendedores na China. De acordo com a consultoria de e-commerce Marketplace Pulse, estimativas de fevereiro indicam que vendedores baseados na China representam quase metade dos 10 mil principais vendedores na Amazon dos EUA.
Regra não deve impactar volume de remessas
A repressão de Trump à isenção “de minimis” tornará os produtos vendidos por Shein e Temu mais caros, mas provavelmente não impactará drasticamente o volume de remessas, segundo especialistas.
“O volume de comércio eletrônico da China cresceu entre 20% e 30% no ano passado, então seria necessário um golpe muito maior para desacelerar esse nível de demanda do consumidor – e não sei se apenas o ‘de minimis’ é suficiente para isso”, disse Niall van de Wouw, chefe de frete aéreo da plataforma de logística Xeneta.
“Eles ainda serão mais baratos do que comprar por meio de varejistas nos EUA. Os atrasos na entrega, devido a interrupções operacionais, podem ter um impacto maior do que o preço”, acrescentou.
A Shein já declarou anteriormente que apoia a reforma da isenção “de minimis”.
Tanto a Temu, subsidiária da gigante chinesa PDD Holdings, quanto a Shein, sediada em Cingapura e com planos de abrir capital em Londres este ano, têm realizado medidas para reduzir o impacto do fim da isenção, que já era esperado antes da posse de Trump. Essas ações incluem buscar mais fornecedores fora da China, abrir armazéns nos EUA e atrair mais vendedores americanos para suas plataformas.
Em outro possível revés para as duas empresas de e-commerce fundadas na China, porém, os EUA estão discutindo se devem incluir Shein e Temu na lista do Departamento de Segurança Interna de empresas envolvidas com “trabalho forçado”, segundo um relatório publicado na terça-feira.
Temu e Shein também estão na mira da Comissão Europeia. As empresas são acusadas de não impedirem a venda de produtos ilegais e potencialmente perigosos nas plataformas.
gq/cn (Reuters, AFP)