23/04/2022 - 7:47
Os seres humanos não são as únicas criaturas que se interessam por seus semelhantes para, digamos, explorar seus corpos. Tirar um cravo, apertar uma espinha, procurar um pelinho encravado, contar as dobras da orelha, dar um apertão no joelho para ver a perna do indivíduo saltar longe. Quem não fez ou não faz isso no seu namorado ou namorada, marido ou mulher, irmão ou irmã? Pois é, os macacos fazem a mesma coisa. E são eles os culpados. Herdamos tudo isso de nossos ancestrais chimpanzés, capazes de ficar horas futucando uns e outros, catando pulgas, piolhos, procurando coisas onde não existem.
A razão para tanta atividade exploratória, no homem como no chimpanzé, é simplesmente a curiosidade. Somos curiosos em relação ao nosso corpo, aos outros e ao mundo. Queremos saber como as coisas funcionam, e para isso meninos quebram brinquedos, meninas desmembram bonecas, adultos descobrem o Novo Mundo.
Esse não é um traço exclusivo dos humanos nem dos chimpanzés, entre os animais. Há felinos e caninos quase tão curiosos quanto eles. Mas nos humanos e chimpanzés a curiosidade evoluiu. Entre nós, um pouco mais: está na base da ciência, da tecnologia, da filosofia, das grandes descobertas. Sem ela, a humanidade não andaria o que andou: todo avanço, toda invenção, toda especulação filosófica tem a curiosidade como seu primeiro motor.
Entre nós, a curiosidade ganhou status de instrumento do saber, uma ferramenta que aprendemos a disciplinar, organizar e focar. É um dom que nasce conosco, como a visão, a audição e os outros sentidos. Mas, enquanto esses não precisam ser “trabalhados”, a curiosidade se educa, desenvolve, orienta e dirige. Eis aí nosso sexto sentido.
Característica de gênios e pessoas comuns
Cristóvão Colombo descobriu a América de curioso. Nem sabia onde estava. Avistou terra no meio do caminho para as Índias e pensou que tinha chegado lá. Alberto Santos Dumont não teria criado o avião e o relógio de pulso se não fosse curioso. E Leonardo da Vinci teria sido inventor, pintor, escultor, arquiteto, engenheiro, matemático, músico e anatomista se não fosse curioso? Alguns séculos depois, Steve Jobs achou computadores fora de uso na garagem de sua casa e pôs-se a desmontá-los. Se não fosse curioso, não teria lançado o Apple I, seu primeiro computador, no ano em que completou 21 anos de idade (1976). Seguiram-se o iMac, o iPod, o iTunes, o iPhone e quantos mais “is” sua imaginação o levasse a inventar.
Craig Venter, considerado o guru da genética atual, atribuiu à curiosidade sua decisão de estudar durante anos o DNA humano. No ano passado (2009), publicou o mapa completo de seu patrimônio genético, ou seja, a sequência dos seus 46 cromossomos. E em seguida anunciou que está próximo de produzir um cromossomo inteiramente em laboratório.
Mas a curiosidade não é exclusividade dos gênios. Quando alguém está lendo o jornal do seu lado, no metrô, as páginas abertas na sua frente, o que você faz? Se no restaurante a mesa atrás de você está animada, o que você faz com as orelhas? Quando o maridão chega do escritório, deixa o paletó no sofá da sala e você, mais tarde, vai guardá-lo no closet, o que você faz ali no último reduto da casa? E quando o Correio entrega uma caixa misteriosa em nome dele? Ou uma correspondência que você vê que não é de cobrança nem de propaganda? Ou, ainda, quando o celular dele está dando sopa na mesinha de cabeceira e ele dorme o sono dos anjos?
Papel da fofoca
As mulheres são muito curiosas, mas os homens não deixam por menos. As fofocas num salão de barbeiro não devem nada aos mexericos do salão de beleza. Os assuntos podem não ser os mesmos, mas a bisbilhotice… Fofocar não é uma coisa ruim em si. Se casual e inofensiva, é divertida e faz bem à saúde. A fofoca malévola é diferente: seu objetivo é destruir o outro e esse tipo de fofoqueiro tem vida curta, pois acaba sendo rejeitado pelo grupo.
Fofocas e fofoqueiros sempre existiram. Talvez o documento mais antigo de uma fofoca esteja num hieróglifo do médio império egípcio, por volta do ano 1300 a.C. Os egiptólogos descobriram numa sequência de imagens e símbolos que o autor estava contando os amores proibidos da corte do faraó. Os pintores da Renascença também tinham por hábito insinuar em suas pinturas os segredos mais bem guardados de sua época. Símbolos de organizações secretas e alusões a teorias proibidas aparecem em obras célebres. E, mesmo onde não parece existir coisa alguma, os mexericos proliferam, desta vez por parte do público. Dinheiro, família e amores secretos são as curiosidades mais presentes.
O mexerico teria uma função afetiva, segundo os psicólogos. Acompanhar a vida de uma celebridade, nos dias de hoje ou nos tempos mais remotos da história, é uma forma de demonstrar ou desenvolver nossos sentimentos. Não seria por outro motivo que os fãs colecionam retratos de seus ídolos, sejam artistas, sejam top models ou santidades como Madre Teresa de Calcutá, revolucionários como Che Guevara e políticos como Nelson Mandela.
Disposição para aprender
Queremos mostrar que os amamos e isso é bom não só para eles. É uma forma de celebrarmos a vida e o sucesso, mesmo que alguns sejam modelos equivocados para nossas vidas. Também nos ajuda a sublimar a inveja. O fotógrafo italiano Massimo Sestini, que fez a primeira foto de Lady Di de biquíni, diz mais: “Queremos ver como são nossos ídolos longe das câmeras de televisão, porque é nesses momentos que eles nos parecem de carne e osso.” Temos necessidade de desmitificar os mitos, e a fofoca, que está sempre ligada à curiosidade, tem um papel importante nesse processo.
A bioquímica explica, em parte, por que somos tão curiosos. Exames de sangue feitos em pessoas que se proclamam extremamente curiosas mostraram níveis elevados de ocitocina e vasopressina, os hormônios da sociabilidade. Essas pessoas estão sempre atentas ao que se passa ao seu redor, gostam de coisas novas, são conversadoras e observadoras.
A curiosidade também ajuda a crescer na vida. Numa empresa, as pessoas mais curiosas são as que estão sempre dispostas a aprender técnicas novas, não reclamam de mudanças e gostam de variar suas atividades. Aceitam as rotinas, mas se mostram muito mais vivas e atuantes quando estão fazendo coisas novas. Pessoas assim sobem mais rapidamente na hierarquia do trabalho. Elas são do tipo que “topa tudo”: gostam de correr riscos, de aprender. E ficam longe da zona do estresse, um mal que vai barrar o caminho dos outros e comprometer o futuro da carreira deles.