01/04/2013 - 17:00
Quem aperta o interruptor da luz da sala quando chega em casa geralmente não faz ideia de como a energia foi parar ali. Tudo que sabemos é que sem a eletricidade não haveria vida moderna. Praticamente todos os itens que garantem conforto e sobrevivência hoje precisam de energia elétrica para funcionar ou serem fabricados.
O modo como produzimos essa energia, porém, está se tornando cada vez mais crucial. Isso porque a vasta maioria da eletricidade gerada no mundo provém de combustíveis fósseis como o carvão, o gás natural e o petróleo, que emitem grandes quantidades de CO2, o poluente gás carbônico, conhecido por agravar o efeito estufa que está elevando a temperatura do planeta.
De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), quase 70% da eletricidade produzida no mundo provém da queima de combustíveis fósseis, enquanto menos de 20% advém de fontes renováveis, como hidrelétricas, usinas solares e parques eólicos. É muito pouco.
Vale ressaltar que essa conta leva em consideração o uso da energia só para geração de eletricidade, e não a energia gerada por combustíveis, como a gasolina e o diesel, ou a combustão da lenha. Se esses fossem considerados, o cenário ficaria ainda pior.
Tamanho é documento
Em termos de tamanho e de capacidade instalada, as usinas hidrelétricas são as maiores estruturas para a geração de energia elétrica do planeta. A maior de todas, a usina de Três Gargantas, na China, supera em quatro vezes a maior termelétrica já construída. Sendo assim, por que a hidreletricidade responde por apenas 16% da produção mundial? “Nem sempre maior quer dizer melhor”, afirma Ennio Peres da Silva, pesquisador do Instituto de Física Gleb Wataghin e professor da Unicamp. “Enquanto as hidrelétricas precisam ser erguidas diretamente num rio propício, de forma a aproveitar todo o seu potencial, as termelétricas podem ser implantadas em praticamente qualquer lugar. Desse modo, o melhor é construir unidades menores mais próximas das áreas onde há demanda, perto do mercado consumidor.”
Mas se a grandiosidade das hidrelétricas não oferece garantia de sustentabilidade – muito pelo contrário, dados os impactos das inundações dos reservatórios e do barramento do rio –, também não se pode afirmar que a capacidade reduzida das usinas solares e eólicas significa irrelevância. “Essas são as chamadas fontes distribuídas, disponíveis em quase todo o planeta, e não concentradas numa área, como uma jazida de petróleo, por exemplo”, explica Ennio Silva. “Em compensação, a intensidade da energia produzida é mais fraca e intermitente, porque não venta nem faz sol regularmente o tempo todo.” Não é possível suprir boa parte da demanda mundial de eletricidade usando apenas sol ou vento. Mas um número relevante de pequenas usinas pode ser construído.
Quem leva a sério a opção pelas energias renováveis são os países europeus. Na Alemanha existe um programa que permite aos cidadãos equipar suas casas com painéis fotovoltaicos praticamente a custo zero. O valor da instalação e dos equipamentos é pago com o excedente de energia gerado na casa. Desde que haja sol, é claro.
Já no Brasil, quem quer instalar placas solares para gerar eletricidade em casa vai ter de pagar pelo menos R$ 15 mil. Mesmo assim, as perspectivas são positivas para essa modalidade de energia, dado que há muito mais sol no Brasil do que na Alemanha.
“Há um conceito-chave, o de curva de aprendizagem”, explica o professor Sergio Pacca, do programa de pós-graduação em sustentabilidade da USP. “Quanto maior a capacidade de geração elétrica, mais barata a tecnologia se torna. Estamos investindo em energia solar há apenas 40 anos, enquanto a tecnologia do carvão é centenária. Portanto, há espaço ainda para a energia solar ser aprimorada e barateada.”
Discurso afinado
Para salvar o mundo da poluição, cientistas, governos e ambientalistas terão de chegar a um consenso. Isso porque nem todos concordam com a definição do termo “energia renovável”. A própria IEA admite, em seu último relatório, que há países que consideram grandes hidrelétricas, usinas geotérmicas e usinas baseadas em lixo industrial como geração renovável, enquanto outras nações discordam.
“O termo renovável se refere às fontes que não vão se esgotar na natureza. Já o petróleo, o carvão e o urânio, usado na energia nuclear, existem em quantidade limitada no planeta. É como ter uma dada quantia numa conta no banco e só retirar dinheiro, sem nunca repor. Um dia a conta vai estar zerada”, afirma Pacca.
Mas desacordo não implica paralisia. O relatório Investing in Climate for Change (Investindo no Clima para a Mudança, em tradução livre), do Programa da ONU para o Meio Ambiente, avaliou a atual onda de investimentos em energia renovável entre 2004 e 2010, gerados pela necessidade de diminuir a queima de energias fósseis e o impacto da poluição do gás carbônico no aquecimento do planeta. Nos países desenvolvidos, o valor já passou de US$ 15 bilhões para US$ 70 bilhões. Nos países em desenvolvimento o cenário é ainda mais positivo: passamos de US$ 4 bilhões, em 2004, para US$ 72 bilhões, em 2010, superando o valor investido pelos países ricos.
“Se olharmos do ponto de vista técnico, já existe conhecimento suficiente para abastecer toda a humanidade com energia renovável”, diz Pacca. Mas o caminho não é simples. “Foram feitos investimentos nas fontes poluentes, e dificilmente esses países voltarão atrás. A própria China construiu muitas termelétricas recentemente; ela não vai simplesmente destruir essas usinas. Mas podemos pensar que as termelétricas têm uma vida útil limitada”, completa.
O mundo está longe de equacionar sua dependência de energia elétrica, que aumenta sem parar. Mas, se os governos continuarem a aumentar os investimentos em recursos menos poluentes, como a energia dos rios, do sol, do vento e da biomassa, a era do carvão, do óleo e da fumaça pode, eventualmente, chegar ao fim.