As águas subterrâneas que circulam pelo subsolo como resultado do derretimento do permafrost podem transportar dióxido de carbono e metano para os lagos do Ártico e, por sua vez, serem emitidos para a atmosfera. Esse processo de transporte de gases de efeito estufa aumenta os efeitos das mudanças climáticas e agora está sendo quantificado pela primeira vez por pesquisadores das universidades de Umeå, Linköping (ambas na Suécia) e Barcelona (Espanha). O estudo foi publicado na revista Nature Communications.

O permafrost é o solo que permanece congelado durante todo o ano em diferentes partes do planeta, como o Ártico e a Antártida, bem como em altas montanhas e planaltos. O estudo atual se concentra nos lagos do Ártico localizados na região do permafrost no norte da Suécia. Nessa área – um típico ecossistema de tundra –, entre 10% e 50% dos solos estão permanentemente congelados. A camada superior do solo acima do permafrost, a camada ativa, congela e descongela anualmente.

Nessa região, a temperatura média anual aumentou consideravelmente nos últimos anos e agora está acima de 0 grau Celsius. Isso faz com que o permafrost – com sua abundante matéria orgânica rica em carbono e gases de efeito estufa – descongele. Através da circulação das águas subterrâneas, o permafrost atua como uma nascente que abastece os lagos hidrologicamente conectados da região com gases de efeito estufa. Os gases são finalmente emitidos dos lagos para a atmosfera.

Até o momento, pouco se sabe em detalhes sobre a importância das águas subterrâneas nas emissões de gases de efeito estufa dos lagos do Ártico. Para responder a perguntas sobre esse processo, a equipe de pesquisadores hispano-suecos usou no presente estudo o radônio – um gás abundante nas correntes do subsolo – como um marcador de descarga de águas subterrâneas nos lagos.

Dificuldades técnicas

No entanto, a quantificação de radônio em águas superficiais e subterrâneas para estimar o transporte de gases de efeito estufa do degelo do permafrost para os lagos apresentou dificuldades técnicas e operacionais.

“O radônio é um gás radiativo, desintegra-se muito rapidamente e, portanto, tivemos de instalar equipamentos de medição na estação científica de Abisko para medir as amostras no mesmo dia em que foram coletadas”, disse Carolina Olid, professora da Universidade de Barcelona e ex-professora assistente da Universidade de Umeå.

“As concentrações de radônio e metano na água do subsolo são muito variáveis, o que significa que foi necessário trabalhar com um grande número e volume de amostras para poder determinar sua magnitude com boa precisão”, afirmou Valentí Rodellas, pesquisador de pós-doutorado da Universidade Autônoma de Barcelona. “Além disso, os solos dessas regiões ricas e densas têm uma grande capacidade de retenção de água, o que dificultou ainda mais a obtenção de um volume de água suficiente para realizar as análises.”

Mais emissões no verão

O estudo revelou que a entrada de gás metano através das águas subterrâneas para os lagos é mais intensa no verão do que no outono devido à maior abundância de água circulando no subsolo (derretimento, chuva, etc.). As temperaturas mais altas no verão também favorecem a produção de metano no subsolo e, portanto, enriquecem o conteúdo gasoso das águas subterrâneas que vão para os lagos.

“As mudanças climáticas e o derretimento acelerado do permafrost aumentarão a quantidade de gases de efeito estufa que podem ser transportados para os lagos através das águas subterrâneas. O aumento da precipitação – até 40% no Ártico na próxima década – também aumentará o fluxo de águas subterrâneas e, portanto, a descarga de metano nos lagos”, disse Carolina Olid.

A maior emissão de gases de efeito estufa na atmosfera não é o único efeito causado pelo derretimento do permafrost. “A água do permafrost contém altas concentrações não apenas de gases como dióxido de carbono ou metano, mas também de outros compostos como nutrientes, mercúrio e outros poluentes”, afirmou Gerard Rocher-Ros, pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Umeå. “A presença desses compostos nos lagos pode gerar impactos prejudiciais ao ambiente natural e aos organismos que vivem em ecossistemas lacustres , bem como em sistemas terrestres.”

“São efeitos com implicações para toda a cadeia trófica aquática tanto do próprio lago quanto da rede de rios e córregos interligados, que impactam nos serviços ecossistêmicos prestados pelos recursos naturais à sociedade”, acrescentou Carolina Olid.

Melhor previsão de mudanças climáticas

Ainda é difícil determinar as áreas do planeta onde o processo de derretimento do permafrost será mais pronunciado ou mais rápido. Em algumas áreas, os lagos secarão porque a água fluirá pelos drenos ou novos canais formados pelo derretimento. Em outros casos, os lagos expandirão suas margens à medida que o derretimento avança – um processo conhecido como termocarste – e novos lagos surgirão em depressões de relevo.

Nesse cenário de incerteza climática, a introdução de descargas de águas subterrâneas em modelos climáticos melhorará as previsões de futuras emissões de metano dos lagos.

“Isso nos permitirá avaliar o real papel dos lagos no ciclo do carbono e se eles realmente funcionam como fontes ou como possíveis reservatórios de gases de efeito estufa. Essa informação é fundamental para podermos desenvolver políticas de conservação adequadas para mitigar as mudanças climáticas”, disse Carolina Olid.