Iconografia alienígena evoluiu ao longo das décadas. Ideia de extraterrestres reflete a forma como definimos o medo, o fascínio e os “outros” entre nós.O que lhe vem à mente ao ouvir a palavra “alienígena”? Homenzinhos verdes com antenas e trajes prateados? Seres de pele cinza e olhos esféricos? Óvnis brilhantes pairando no céu? Chupa-cabra ou ET de Varginha?

Para Christian Peters, cientista social e político, a evolução da iconografia alienígena na cultura pop reflete uma combinação de relatos de testemunhas oculares, discurso cultural e cobertura da mídia.

Peters, diretor da Escola Internacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade de Bremen, na Alemanha, explica como os homenzinhos verdes e os alienígenas de traje prateado da década de 1950 foram sucedidos pelos extraterrestres cinzentos que também figuram no universo dos emojis atuais.

Ele citou o exemplo do livro Communion (1987), o best-seller em que o autor de terror americano Whitley Strieber relata seus supostos encontros com alienígenas. O livro foi posteriormente adaptado para o cinema em 1989, originando o filme Estranhos Visitantes, com Christopher Walken no papel principal.

“A capa do livro apresentava o agora icônico rosto cinza – o tipo de rosto visto por pessoas que afirmam ter tido experiências de abdução ou primeiros contatos [com alienígenas]”, ressaltou Peters.

A mídia também ajudou a consolidar imagens recorrentes de alienígenas. Em 1947, o piloto americano Kenneth Arnold descreveu nove objetos brilhantes cruzando o céu perto do Monte Rainier, no estado de Washington, EUA, dizendo que se moviam “como pires deslizando sobre a água”. Os jornais descreveram as naves como tendo formato de pires, o que deu origem ao termo “disco voador”. A imagem moldou décadas de iconografia dos óvnis.

De invasores a empáticos

A falta de provas definitivas da existência de forças vitais extraterrestres deu aos cineastas liberdade criativa na representação de alienígenas e a capacidade de usá-los como uma representação simplificada das ansiedades sociais.

Na década de 1950, a paranoia da Guerra Fria impregnou filmes como Vampiros de Almas (1956), onde os alienígenas eram amplamente interpretados como infiltrados comunistas. No final da década de 1970 e na década de 1980, o foco se voltou para a exploração corporativa e o medo ecológico.

No filme de ficção científica Alien, de Ridley Scott (1979), uma empresa movida pelo lucro planeja produzir armas usando a composição biológica de um alienígena assassino que ataca os funcionários humanos da empresa.

Já E.T. O Extraterrestre (1982), de Steven Spielberg, apresentou o alienígena como um forasteiro gentil em busca de conexão. Enquanto isso, na década de 1990, a série de televisão de enorme sucesso Arquivo X sugeriu uma conspiração na qual um grupo de elites humanas e uma raça de extraterrestres buscavam colonizar e escravizar a humanidade.

Após o 11 de setembro, o remake Guerra dos Mundos (2005), baseado em obra de H.G. Wells, reimaginou a invasão alienígena como uma catástrofe repentina que causa trauma e deslocamento.

Filmes mais recentes como A Chegada (2016) e Não! Não Olhe! (2022) foram mais introspectivos, explorando o luto, a linguagem e nossa obsessão pelo espetáculo.

Embora muitos filmes de ficção científica com alienígenas tenham sido centrados nos EUA, Distrito 9 (2009), produzido por Peter Jackson, retratou alienígenas como refugiados discriminados em favelas segregadas da África do Sul. Enquanto isso, o filme indiano Você Não Está Sozinho (2003) explorou a exclusão social e a aceitação, através da amizade entre um alienígena e um humano neurodivergente.

Iguais, mas diferentes?

Curiosamente, na maioria das representações ou filmes, muitos desses extraterrestres andam eretos, têm olhos e membros e demonstram emoções suficientes para que os humanos os compreendam. Essa tendência antropocêntrica de ver e interpretar através de uma lente humana ficou evidente no grotesco ser alienígena de Alien, uma criatura inspirada na pintura surrealista de H.R. Giger, Necronom IV.

“Ele é bípede, tem olhos, boca e orelhas”, disse Christian Peters. “Não se diria que é humano, mas é uma espécie de interpretação demoníaca da natureza terrestre – o pior predador que poderíamos conceber.”

A palavra “alienígena” é anterior à ficção científica. Vinda do latim “alienus”, significa “pertencente a outro”, “estrangeiro” ou “estranho”. Em inglês, o termo pode ser usado também para descrever alguém que não é cidadão ou nacional. Em muitos países, a palavra evoca exclusão, suspeita e alteridade, especialmente no contexto dos debates atuais sobre migração e integração.

IA: alienígena criado por nós?

Por fim, a inteligência artificial (IA) – não humana, não biológica e frequentemente descrita como uma espécie de mente alienígena – está remodelando a vida como a conhecemos. Como disse o professor de Harvard, Chris Dede, em uma entrevista de 2023 para a publicação TechTrends sobre chatbots de IA como o ChatGPT: “A IA não é uma forma fraca de inteligência humana. É uma inteligência alienígena.”

Concordando que “a IA é muito alienígena”, Peters acrescentou: “A maneira como a tecnologia que inventamos chega ao resultado final que produz é uma situação historicamente nova que nunca existiu antes.”

À medida que os sistemas de IA se tornam mais complexos e difíceis de interpretar, eles evocam um certo desconforto – algo semelhante à perspectiva de extraterrestres, migrantes ou outros seres percebidos como forasteiros. Talvez esse desconforto não provenha do que esses “outros” são, mas sim de quão pouco realmente entendemos sobre eles.