08/07/2022 - 22:35
1) Com a vitória na Revolução de 1930, Getúlio Vargas assumiu a presidência do Brasil deixando de lado promessas que havia feito antes. Uma delas era a elaboração de uma nova carta constitucional, reivindicada por paulistas, mineiros (ambos dominantes na política brasileira até então) e gaúchos. O progressivo mal-estar com as decisões federais forneceu combustível à Revolução Constitucionalista de 1932.
2) Um fator fundamental para a revolta foi a morte, em 23 de maio de 1932, de cinco jovens no centro da cidade de São Paulo, assassinados a tiros por integrantes da Legião Revolucionária, grupo partidário do governo Vargas criado pelo tenente pernambucano João Alberto Lins de Barros (interventor federal no governo de São Paulo entre 1930 e 1931) e orientado pelo major Miguel Costa (comandante da então Força Pública de São Paulo, que depois se tornaria a Polícia Militar do estado).
O então interventor estadual Pedro de Toledo, nomeado em 7 de março de 1932, tentava formar um novo secretariado, independente das pressões exercidas pelos tenentes ligados ao governo de Getúlio Vargas, quando chegou a São Paulo o então ministro da Fazenda, Osvaldo Aranha, para realinhar o estado às diretrizes federais. A resposta popular foi a realização de grandes comícios e passeatas, em meio às quais tentou-se invadir a sede da Legião Revolucionária.
Ao subirem as escadarias do edifício, os manifestantes foram recebidos a tiros. Cinco jovens tombaram baleados na ocasião: Mário Martins de Almeida (Martins); Euclides Bueno Miragaia (Miragaia); Dráusio Marcondes de Sousa (Dráusio); Antônio Américo Camargo de Andrade (Camargo); e Orlando de Oliveira Alvarenga (Alvarenga). Os quatro primeiros dessa lista morreram naquela ocasião, e os nomes pelos quais eram mais conhecidos deram origem à sigla MMDC. Alvarenga ficou ferido e morreria em 12 de agosto daquele ano.
O quinto morto
3) Diferentemente de Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, Orlando de Oliveira Alvarenga não estaria entre os manifestantes atacados em 23 de maio de 1932. Escrevente, ele voltava do trabalho quando foi atingido por uma bala disparada por integrantes da Legião Revolucionária, de acordo com Manuel Octaviano Marcondes de Souza, pai de Dráusio Marcondes Souza, em seu livro “Fomos Vencidos?”, de 1933.
Em 1993, o pesquisador Hely Felisberto Carneiro descobriu que Alvarenga fora o quinto morto na tentativa de invasão da Legião Revolucionária. A partir disso, Carneiro corrigiu os registros históricos sobre a Revolução de 1932 e, em setembro de 1993, convenceu a diretoria da Sociedade Veteranos de 1932 a reconhecer a omissão.
Em memória de Alvarenga, o governo paulista oficializou, pelo Decreto 46.718, de 25 de abril de 2002, o Colar Cruz do Alvarenga e dos Heróis Anônimos. Em 2004, por meio da Lei Estadual nº 11.658, foi instituído o “Dia dos Heróis MMDCA”, a ser comemorado anualmente em 23 de maio, como memória e homenagem aos cinco jovens mortos naquela data.
4) Após a morte de Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, organizou-se um movimento clandestino denominado MMDC que começou a conspirar contra o governo de Getúlio Vargas, articulando junto com outros agrupamentos políticos um levante de grande porte. A revolta começou de fato em 9 de julho de 1932.
5) Ao iniciarem a revolta contra o governo provisório de Getúlio Vargas, os líderes paulistas esperavam a adesão de outros estados brasileiros, baseados em manifestações prévias de solidariedade das elites políticas de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Mato Grosso. Mas apenas a parte sul deste último se tornou de fato aliada de São Paulo.
O estado de Maracaju
6) Em 10 de julho de 1932, a fatia sul de Mato Grosso que deu apoio aos paulistas tornou-se um estado federativo sem reconhecimento da União, denominado Maracaju. O nome é o mesmo da serra que corta o território. Maracaju existiu até 2 de outubro de 1932 e foi o embrião do atual Mato Grosso do Sul, surgido em 1979.
7) O general Bertoldo Klinger, comandante da Região Militar de Mato Grosso que se tornaria comandante supremo do Exército Constitucionalista, teve relação direta com o início da revolta. Em 1º de julho de 1932, ele havia mandado uma carta em termos intencionalmente duros e ofensivos ao recém-nomeado ministro da Guerra do governo getulista, general Augusto Inácio do Espírito Santo Cardoso. Em resposta, Cardoso o transferiu para a reserva em 8 de julho, por meio de uma reforma administrativa. Foi a gota d’água para que o movimento paulista deflagrasse a revolta no dia seguinte.
8) O alistamento no Exército Constitucionalista somou um total de 200 mil voluntários civis e militares, dos quais cerca de 60 mil participaram efetivamente dos confrontos.
9) A maçonaria paulista teve participação ativa no movimento, por meio de suas lojas e de seus membros. Entre os maçons envolvidos com o levante estavam o próprio interventor Pedro de Toledo (que assumiu o cargo de governador durante o período da revolta), Júlio de Mesquita Filho, diretor do jornal O Estado de S.Paulo, e o poeta Ibrahim Nobre.
87 dias de lutas
10) Os combates duraram ao todo 87 dias (de 9 de julho a 4 de outubro de 1932; os dois últimos dias foram posteriores à rendição paulista). Oficialmente, foram contabilizados 934 mortos, mas estimativas não oficiais indicam até 2.200 mortos.
11) O último destacamento constitucionalista a se render foi o comandado pelo coronel Jaguaribe de Mattos, na região de Bela Vista e Ponta Porã (atual Mato Grosso do Sul). A rendição ocorreu em 25 de outubro, perante as tropas federais comandadas pelo tenente-coronel Francisco Gil Castelo Branco.
12) Mesmo derrotados, os revoltosos conseguiram que o governo de Vargas atendesse a algumas de suas principais reivindicações, como a nomeação de um interventor civil e paulista, a convocação de uma Assembleia Constituinte e a promulgação de uma nova Constituição em 1934. Essa Constituição foi substituída em 1937 por outra, outorgada, uma iniciativa governamental acompanhada do fechamento do Congresso Nacional; foram os movimentos iniciais da implantação do regime ditatorial conhecido como Estado Novo.