Novo decreto do governo estabelece que cursos como Medicina e Direito precisarão ser exclusivamente presenciais. A regulação freia excessos do uso de ensino à distância (EaD) por uma inústria que vê alunos como clientes.Você confiaria sua saúde a um médico formado integralmente online, sem nunca ter tocado um paciente? Confiaria um caso importante a um advogado que nunca teve uma aula presencial?

Creio que não. Assim, ficará feliz de saber que os cursos de Direito, Medicina, Enfermagem, Odontologia e Psicologia deverão ser oferecidos, exclusivamente, no formato presencial.

A nova regra está presente no decreto Nº 12.456, publicado em 19 de maio pelo presidente Lula, que contém novas regras para a educação a distância (EaD).

Outra mudança é que as licenciaturas e cursos da área da saúde não poderão mais ser ofertados no modelo à distância, ou seja, precisarão ser ofertados no modelo presencial ou semipresencial.

Além disso, o próprio modelo à distância deverá ter, por regra, 10% da carga horária total presencial e 10% de atividades online ao vivo. Nenhum poderá ser 100% remoto.

Não nego, julgo todas essas mudanças como uma grande conquista. As mudanças, no geral, serão graduais e as instituições terão dois anos para a adaptação.

Contexto anterior clamava por intervenção

A educação se tornou um grande mercado e isso não é novidade e tampouco pode ser negado ou subestimado.

No contexto do ensino médio e fundamental, pais colocam os filhos em um colégio privado, sobretudo, almejando a aprovação em uma universidade pública. Já no contexto do ensino superior, se tornou comum a prática da venda de diplomas, dado o poder dessa validação no mercado de trabalho.

Essa venda, por vezes, assume uma forma mais grotesca, equivalendo a uma comercialização literal do diploma, sem qualquer aprendizado.

Mais comum, porém, é uma versão disfarçada e sutil, que embora lícita, é minimamente antiética. Me refiro aqui à grande indústria de universidades privadas produzindo diplomas aos milhares, sem qualquer preocupação com a qualidade da formação que oferecem.

Já vi propagandas que prometiam diploma por certos valores que não parecem fechar. Ou seja, não haverá estrutura alguma por trás da formação.

As consequências são catastróficas. Já vi analfabeto funcional graduado em Direito e já vi médicos sem domínio sobre a própria área.

Consequências

O contexto era assustador e com externalidades negativas para toda a sociedade.

Como assim? A única consequência não era: “Nossa, que pena de fulano, caiu em uma armadilha e não terá o suporte necessário para a sua formação”.

“Fulano” poderia ostentar um diploma de Psicologia sem condição alguma para lidar com a saúde mental de um indivíduo. Já “Sicrano”, um diploma de Odontologia sem conhecimento básico sobre a ciência por trás da formação.

A verdade é que já existem muitos casos assim e a indústria que os produziu não tinha qualquer interesse com a ética ou com a qualidade da formação oferecida. O único interesse era o dinheiro. Essa indústria via seus discentes unicamente como clientes, não importando as consequências.

Isso diminui a inclusão?

Uma característica do ensino online é a inclusão, mas aqui a discussão é mais densa e requer mais atenção.

Não acredito que o decreto terá qualquer impacto negativo no processo da inclusão. Na verdade, vejo apenas avanços e pontos positivos. Acredito que a discussão EaD versus inclusão mereça uma coluna própria e trarei essa discussão em meu próximo texto.

Já adianto meu posicionamento: criar diretrizes e regras para garantir a qualidade mínima da formação superior no Brasil não é elitismo, mas sim responsabilidade social.

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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do programa no Instagram em @salvaguarda1.

Este texto foi escrito por Vinícius De Andrade e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.