Ex-deputada Sahra Wagenknecht vai deixar a liderança da BSW, partido populista de esquerda que carrega seu nome. Anúncio aumenta dúvidas sobre a viabilidade do movimento fundado em 2024.A ex-deputada Sahra Wagenknecht anunciou na segunda-feira (10/11) que vai deixar a liderança do partido que leva seu nome, a Aliança Sahra Wagenknecht (BSW, na sigla em alemão), levantando dúvidas sobre o futuro da viabilidade da sigla populista de esquerda, fundada no ano passado e que vem sendo castigada por turbulência interna.

Ao anunciar a decisão, Wagenknecht disse que não pretende se candidatar à reeleição do cargo de liderança no próximo congresso da sigla em dezembro, se afastando do dia a dia organizacional. Por outro lado, ela deixou claro que ainda pretende exercer um papel de influência, especialmente na elaboração do programa e estratégia da BSW.

“Como presidente do partido, eu estava muito, muito envolvida em questões organizacionais. No futuro, quero ter minha cabeça livre novamente para as coisas nas quais posso realmente ajudar, onde estão meus pontos fortes”, justificou.

Sem nem ter completado dois anos de vida, a BSW passa por um momento delicado, especialmente em estados do leste alemão onde conseguiu eleger deputados estaduais em 2024.

Nos últimos meses, Wagenknecht vinha travando um conflito aberto com Katja Wolf, líder da BSW no estado da Turíngia. Já no estado de Brandemburgo, deputados da BSW que participam de um governo de coalizão local vêm se rebelando contra seus parceiros do Partido Social-Democrata (SPD). Na Saxônia-Anhalt, diretórios distritais do partido vêm tentando destituir a liderança estadual.

A saída de Wagenknecht do posto de líder organizacional não será a única mudança na BSW. O partido também anunciou que pretende mudar de nome em dezembro, passando a se chamar Aliança pela Justiça Social e Razão Econômica, o que vai permitir manter a sigla BSW. O posto de Wagenknecht será ocupado pelo ex-deputado Fabio De Masi, que vai dividir a liderança com a também ex-deputada Amira Mohamed Ali.

Impulso inicial em 2024, mas perda de fôlego na eleição de 2025

Wagenknecht, Masi e Mohamed Ali eram até 2023 membros de outro partido, A Esquerda (Die Linke, em alemão).

Junto com outros dissidentes, eles romperam com a velha sigla para formar a BSW em janeiro de 2024, que se apresentou com uma agenda heterodoxa: esquerdista em assuntos econômicos, porém mais próxima da ultradireita em questões como imigração e diversidade, além de defender uma reaproximação com a Rússia.

Por anos, Wagenknecht foi uma figura proeminente da legenda A Esquerda. No entanto, ela vivia às turras com seus antigos correligionários por causa da sua oposição à imigração ilegal e ao “identitarismo”.

Ao fundar a BSW, Wagenknecht deixou claro desejo de tentar atrair eleitores da classe trabalhadora que debandaram para o partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) nos últimos anos. Em discursos iniciais, Wagenknecht fez tanto críticas ao que chamou de “esquerdistas de estilo de vida” quanto ao desmonte do estado de bem-estar social alemão.

Inicialmente, a BSW obteve sucessos significativos:6,1% nas eleições europeias e formou bancadas estaduais nos estados orientais da Saxônia, Turíngia e Brandemburgo – passando a integrar coalizões de governo nos dois últimos como parceiro menor.

Em 2024, analistas chegaram a apontar que a nova legenda poderia acabar tomando quase todo o espaço do partido A Esquerda no Bundestag, a câmara baixa do Parlamento Federal da Alemanha. Pesquisas no final do ano passado sugeriram isso, apontando que a BSW poderia conquistar até 8% do eleitorado, e empurrar seus antigos colegas para baixo da cláusula de barreira de 5%.

No entanto, a eleição federal antecipada de fevereiro de 2025, convocada após o desmoronamento do governo do então chanceler federal Olaf Scholz, acabou se revelando uma pedra no caminho da BSW.

Sem ainda contar com uma organização consolidada um ano após sua fundação e sofrendo com falta de dinheiro para a campanha, a BSW perdeu fôlego nas pesquisas.

Para piorar, seus rivais do partido A Esquerda conseguiram recuperar terreno graças a vídeos virais e sua oposição aberta contra a AfD, que contrastava com a posição da BSW, que indicou ser menos intransigente em eventualmente colaborar com os ultradireitistas em certos temas.

Wagenknecht reagiu ao declínio das intenções de voto pouco antes das eleições acusando a imprensa de boicotar sua campanha – embora levantamentos apontem que ela foi uma das políticas que mais apareceu em canais de TV públicos durante o ciclo eleitoral.

Apuradas as urnas, a BSW terminou o pleito amargando 4,98%, pouco menos de 10 mil votos abaixo da cláusula de barreira. Dessa forma, o partido não elegeu deputados federais. Wagenknecht pediu uma recontagem – uma comissão parlamentar ainda está analisando os números. No entanto, poucos acreditam que a BSW possa reverter a derrota.

A saída de Wagenknecht da liderança anunciada nesta semana também ocorre num momento em que o partido busca se reestruturar para recuperar fôlego em uma série de eleições estaduais previstas para 2026.

No ano que vem, eleitores de cinco estados alemães irão às urnas para eleger governos locais. Entre eles estão dois estados do leste, Mecklemburgo- Pomerânia Ocidental e Saxônia-Anhalt, que ficam numa região que em 2024 se revelou o único porto seguro de votos para a BSW.