18/11/2025 - 18:43
Liderada pela Colômbia, coalizão se forma na conferência a favor do mapa para saída da era fóssil. Tema fora da agenda, a rota do caminho pode entrar no texto final de Belém.Uma aliança de países ricos e em desenvolvimento a favor de um prazo para o abandono dos combustíveis fósseis se formou em Belém na 30ª Conferência da ONU sobre o Clima, a COP30.
Anunciada nesta terça-feira (18/11) pela ministra de Meio Ambiente das Ilhas Marshall, Tina Stege, o grupo diz ter reunido a assinatura de 16 países até agora, mas espera contar com o apoio de 80.
No palco de uma das salas reservadas para coletivas de imprensa, os ministros disseram estar trabalhando em mutirão. A palavra, colocada pela primeira vez no contexto das negociações climáticas pelo embaixador brasileiro André Corrêa do Lago, presidente da COP, significa “fazer junto”, e seu espírito parece ter “pegado” entre os líderes.
A coalizão pede que a conferência no Brasil entregue um mapa indicando a rota de saída da dependência dos combustíveis fósseis. É a sua queima que, nos últimos duzentos anos, tem despejado em maior quantidade gases de efeito estufa que aceleram as mudanças do clima.
“Hoje nós trazemos aqui países com interesses muito diversos que apoiam o chamado para uma rota para uma transição ordenada, equitativa e justa para longe dos combustíveis fósseis”, anunciou Stege, afirmando que referência à tal rota, até o momento, é fraca no rascunho dos documentos em discussão.
A menção explícita ao fim da era fóssil ocorreu pela primeira vez há duas COPs, em Dubai.
Na ocasião, um grupo de nações também se mobilizou para que isso acontecesse, ancorado principalmente nos relatórios científicos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, em inglês).
“A transição para longe dos fósseis é chave para manter a chance de limitar o aquecimento da temperatura global em 1,5°C”, declarou a ministra Stege, fazendo menção à meta estabelecida pelos mesmos países no Acordo de Paris, há dez anos.
Liderança colombiana
A Colômbia parece liderar o empurrão para que o mapa do caminho (roadmap) seja traçado em Belém. A ministra Irene Vélez Torres anunciou durante a conferência que seu país se tornaria o primeiro detentor de Floresta Amazônica a banir empreendimentos de petróleo e mineração no bioma.
“Estamos criando uma reserva especial de recursos naturais para a Amazônia, o que inclui restrições à concessão de títulos de mineração de grande e médio porte, e também implica que não poderá haver renovação de contratos de petróleo”, detalhou a jornalistas depois da coletiva de imprensa.
O país usa combustível fóssil para gerar 41% de sua energia, apontam dados da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês). Na América Latina, Colômbia é o terceiro maior produtor de petróleo, atrás de Brasil e Argentina.
A coalizão formada, diz Torres, reforça o chamado de mutirão da presidência da COP30. “Aqui está um grupo de países, um bloco, que apoia a necessidade de um roteiro, um resultado claro desta COP, para permitir a eliminação gradual dos combustíveis fósseis”, reafirmou.
A Colômbia também defende a eliminação dos subsídios aos fósseis e o realocamento desses recursos em ações para construir o mapa desejado, combater o desmatamento e apoiar projetos que fomentem a economia de baixo carbono.
“Acreditamos que esta é a COP da verdade, a COP da Amazônia e a COP da América Latina, que se caracterizou por suas lutas, suas vozes de resistência, por dar um lugar central às comunidades e territórios, ecoando essa voz de resistência e essa fraternidade com os povos desta região”, pontua Torres.
Europeus e africanos
Depois do mal-estar causado pela fala do chanceler alemão Friedrich Merz em Berlim, que sugeriu que sua comitiva ficou aliviada em deixar o Brasil, o ministro de Meio Ambiente da Alemanha, Carsten Schneider, adotou uma postura elogiosa em relação ao país sul-americano em coletiva de imprensa.
“Aqui neste grande país nós estamos todos aprendendo a praticar o mutirão”, comentou Schneider, destacando as oportunidades econômicas da transição energética. “Pedimos que a presidência da COP30 coloque este chamado no texto final”, solicitou o alemão, agradecendo em português ao fim de sua fala.
Ed Miliband, que tem cargo equivalente a ministro de Meio Ambiente no Reino Unido, ressaltou que a coalizão tem um trunfo: reunir países do Norte mais rico e do Sul global. No começo de outubro, o governo do Reino Unido decidiu banir novas licenças de petróleo e gás alegando se tratar de uma decisão de proteção climática e econômica.
“Estamos dizendo em uma só voz que esse é um tema que não pode ser ignorado. Temos a oportunidade nos próximos dias de fazer da COP 30 este momento em que o levamos adiante a transição energética global a partir do trabalho feito na COP28”, defendeu.
“Limitar o 1,5°C é uma questão de sobrevivência para nós”, disse na conferência Jiwoh Abdulai, ministro de Meio Ambiente de Serra Leoa, na África. “Estamos na linha de frente das mudanças climáticas”, acrescentou, ressaltando as dificuldades de seu país para tirar a população da pobreza ao mesmo tempo em que se desvencilha de combustíveis fósseis.
O efeito Lula
No primeiro dia de COP, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu que os negociadores apresentassem ao mundo uma rota do caminho para longe dos fósseis. Se naquele dia ele estava sozinho, hoje ele tem 80 países sinalizando que estão do mesmo lado, analisa Marcio Astrini, diretor-executivo do Observatório do Clima.
“Isso daqui é legado do pedido do Brasil”, pontua o ambientalista, dizendo que não se ainda sabe como isso vai entrar no texto final. É possível que a presidência da COP espere mais apoios antes de escrever esse trecho do documento.
“Desde o início das negociações, a Colômbia apoiou o apelo do Brasil e ajudou a gerar o ímpeto político que hoje reúne mais de 80 países em torno desse objetivo”, comenta Laura Montaño, coordenadora regional da Rede de Justiça de Recursos.
O chamado mapa do caminho, ou roadmap, não está sendo discutido formalmente em nenhuma mesa em Belém. Ele só vai entrar após alguns países presentes apresentarem um pedido formal solicitando a inclusão do tema na agenda.
O mesmo aconteceu em Dubai: em nenhum momento daquela conferência o termo “transição para longe dos combustíveis fósseis” fez parte dos debates oficiais. A menção no documento final causou uma comoção.
“Se o mapa do caminho para abandono dos fósseis tiver que acontecer em algum momento é nesta COP”, analisa Astrini. “Isso está acontecendo por causa de uma construção de muito tempo”, adiciona, referindo-se à COP26.
