Alemanha pretende apoiar empresas com um alívio nos preços de energia elétrica. Mas críticos dizem que plano pode ameaçar a estabilidade do mercado e metas climáticas, além de provocar oposição entre parceiros da UE.Antes das eleições gerais de fevereiro na Alemanha, os líderes da indústria do país soaram o alarme. Eles instaram o futuro governo alemão a adotar medidas para combater os altos preços da eletricidade e alertaram sobre o possível fechamento ou realocação de empresas para o exterior se nada acontecesse.

Suas preocupações parecem ter sido ouvidas pelo novo governo de coalizão entre a conservadora União Democrata Cristã (CDU), do chanceler federal, Friedrich Merz, e o Partido Social-Democrata (SPD), que tomou posseno início de maio.

Após apenas algumas semanas no poder, o governo já tem em seus planos algumas medidas significativas para aliviar os custos de energia, mas alguns especialistas alertam para as potenciais desvantagens dessa estratégia.

Quão cara é a eletricidade para a indústria?

É difícil especificar um valor único, já que o alívio atual nos custos de eletricidade varia de acordo com o tamanho da empresa e o setor.

Segundo um estudo da Associação Industrial da Baviera (Vbw), sediada em Munique, em 2022 os preços da eletricidade industrial na Alemanha estavam próximos da média europeia. No entanto, o impacto da invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, abalou os mercados de energia, o que dificulta as comparações anuais.

Dados recentes da União Europeia (UE) mostram que a Alemanha ocupa o terceiro lugar no bloco em termos de preços de eletricidade para consumidores não residenciais – uma categoria que inclui não apenas as indústrias, mas também instituições públicas, como escolas e repartições, o que torna complicado tirar conclusões sobre o impacto específico sobre a indústria.

Quando se trata do preço da eletricidade no atacado – antes de impostos e taxas – a Alemanha está nem uma categoria intermediária na comparação com outros países, afirmou Bruno Burger, especialista em energia do Instituto Fraunhofer para Sistemas de Energia Solar, em entrevista ao jornal alemão Frankfurter Rundschau.

Alemanha correndo atrás de EUA e China

Uma coisa, porém, é certa: as empresas nos EUA e na China pagam significativamente menos.

Em 2023, os preços da eletricidade industrial giravam em torno de 8 centavos de dólar (cerca de R$ 0,45 reais) por quilowatt-hora nos Estados Unidos, de acordo com o Instituto Pesquisas Econômicas (Ifo), e cerca de 9 centavos de dólar na China, segundo dados da Vbw. Na Alemanha, porém, as empresas industriais pagam cerca de 20 centavos de euro (R$ 1,28), segundo o Ifo.

Os planos do governo em Berlim incluem, supostamente, medidas de alívio abrangentes para reduzir os preços da eletricidade industrial.

Na Alemanha, o preço da eletricidade é composto pelo preço de atacado, além um imposto sobre eletricidade, sobretaxas que financiam iniciativas específicas do governo e taxas pelo uso da rede elétrica.

Berlim agora planeja reduzir o preço da eletricidade em 5 centavos por quilowatt-hora para as empresas, reduzindo o imposto sobre eletricidade para o valor mínimo da UE e cortando as sobretaxas e taxas de rede.

O governo também quer estender e expandir o programa de compensação do preço da eletricidade, que reembolsa as indústrias com uso intensivo de energia pelos custos decorrentes dos preços associados às emissões de dióxido de carbono. O preço do CO2 é aplicado ao uso de combustíveis fósseis na Alemanha e na UE para desestimular as emissões.

Vantagens e desvantagens

Andreas Fischer, especialista em política energética e climática do Instituto Econômico Alemão (IW), com sede em Colônia, afirmou à DW que “da perspectiva do consumidor, o alívio abrangente é positivo”.

Max Jankowsky, CEO da Fundição Lössnitz e presidente da Câmara de Comércio e Indústria de Chemnitz, concorda. Em nota à DW, ele disse que a urgência de reduzir os preços da eletricidade para a indústria foi “reconhecida” pelo governo.

O plano, porém, também é alvo de críticas.

“Uma redução generalizada nos preços da eletricidade contradiz as necessidades de um sistema baseado em energia renovável”, avalia Swantje Fiedler, diretora científica do Fórum para a Economia de Mercado Socioecológica. Em vez disso, o sistema energético alemão precisaria de incentivos para armazenamento de energia e flexibilidade devido à flutuação no fornecimento de eletricidade renovável, com oferta abundante no verão e escassa no inverno, explicou a especialista à DW.

“Ao mesmo tempo, é importante considerar o quão flexível uma empresa pode ser”, diz Fischer, já que nem todas as empresas conseguem se adaptar rapidamente às mudanças no fornecimento ou nos preços de eletricidade.

Os prós e contras da eletricidade mais barata

Leonhard Probst, do Instituto Fraunhofer de Sistemas de Energia Solar, em Freiburg, na Alemanha, acredita que preços mais baixos de eletricidade podem reduzir os incentivos para que as empresas usem a eletricidade de forma mais eficiente.

Probst, que administra a plataforma Energy-Charts.de – o banco de dados mais abrangente sobre geração de energia na Alemanha – observou ainda que, por outro lado, a eletricidade mais barata pode facilitar a eletrificação de processos industriais, o que é melhor para o meio ambiente a longo prazo.

A Fundição Lössnitz seria um exemplo disso, já que o CEO da empresa, Max Jankowsky, planeja trocar o forno de coque por um de fundição elétrico. Até o momento, porém, os altos preços da energia o estão impedindo: “Parece que estou batendo em uma serra circular”, disse ele, referindo-se ao risco de preços de eletricidade permanentemente altos.

Possível objeção de Bruxelas

O plano dos dois partidos da coalizão de governo da Alemanha também inclui um alívio maior para empresas com uso intensivo de energia. Ainda não está claro, porém, se isso inclui um limite ao preço da eletricidade no atacado, embora alguns especialistas acreditem que essa seja a intenção do governo.

Como demonstramos nas análises de preços, impostos e sobretaxas representam apenas uma pequena parcela do custo final da eletricidade.

Probst, do Instituto Fraunhofer, alerta que a redução artificial de preços pode ter um efeito contraproducente: “Se a eletricidade for escassa, mas vendida a baixo custo, a escassez se intensifica e os preços sobem ainda mais”, argumentou.

Sebastian Bolay, diretor de energia, meio ambiente e indústria da Confederação Alemã das Câmaras de Indústria e Comércio (DIHK), enxerga ainda outro problema iminente para o governo.

“Um teto de preço poderia interferir nos preços de mercado e provavelmente não seria permitido pelas regras de auxílio estatal da UE”, disse o especialista à DW.

Probst concorda que um teto de preço poderia ser caro para os contribuintes, já que muitas empresas que não precisam de alívio – uma vez que seus custos de energia representam apenas uma pequena parte de sua geração de valor – “se beneficiariam desnecessariamente”.

Adaptar medidas às empresas

Swantje Fiedler está convencida de que uma implementação mais rápida de energia renovável na Alemanha poderia “reduzir os preços a longo prazo”.

Para Probst, “subsídios direcionados” são mais eficazes do que reduções generalizadas de preços e podem incluir tarifas especiais de eletricidade para o uso de bombas de calor.

Jankowsky também defende o que chamou de “medidas adaptadas” voltadas especialmente para o auxílio às pequenas e médias empresas, já que muitos dos subsídios existentes não se aplicam a elas. Ele defende que isso precisa ser alterado, “e precisa acontecer rapidamente”.