Chega ao fim hoje a CO24, Conferência do Clima da ONU, que reuniu esta semana 195 países na Polônia para desenhar o plano de ação do Acordo de Paris, firmado em 2015 com o propósito de conter as emissões de gases de efeito estufa e manter o aumento da temperatura global abaixo de 2º, se possível em até 1,5º. Nesta semana de grande expectativa pelos resultados da COP24, PLANETA conversou com Rubens Benini, líder da estratégia de restauração florestal da The Nature Conservancy (TNC) América Latina – maior organização de conservação ambiental do mundo. Entenda o que está em jogo, qual a situação do Brasil e porque tudo isso também tem a ver com a sua vida.

PLANETA – Quais chances de avanços temos com a COP24?
BENINI – Ainda sou bastante otimista que vamos avançar nessa agenda de mitigação das mudanças climáticas. Ao mesmo tempo que escutamos o governo Trump dizendo que vai sair do Acordo, assim como discursos dúbios no Brasil, o G20 confirmou a importância do Acordo de Paris e alguns países vêm tomando a liderança e fazendo até um pouco mais do que o planejado: a Noruega aumentou o apoio ao Fundo Amazônia, a União Europeia tem procurado aumentar suas mitigações e própria China está restaurando milhares de hectares de floresta.
Se não reduzirmos até 2030 as emissões em 50%, comparadas a 2010, a gente vai perder essa guerra. Vamos ter que falar de como nos adaptar a um clima caótico e como perder menos vidas humanas. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) apontou que a maior causa de doenças e perdas socioeconômicas neste século vai ser a mudança climática.
Além do que, não devemos colocar tudo nas costas dos governos federais e esperar que façam tudo. Apesar de os EUA não estarem aderindo, os estados da federação norte-americana estão fazendo a sua parte. A própria Califórnia é um grande exemplo. Não depende só da posição oficial de um país. Cada um de nós, cidadãos, temos a obrigação de repensar nossos atos, nossos comportamentos de consumo e fazer nossa parte.
Aqui no Brasil, você vê os Estados de São Paulo e do Espírito Santo com metas de recuperar floresta para mitigar os impactos ambientais. O Espírito Santo não só cumpriu como superou sua meta: que era de recuperar 80 mil hectares antes de 2020, e até agora já chegaram 120 mil hectares. São iniciativas paralelas que acontecem ao governo federal. O engajamento de todos os setores é importante.

PLANETA – Para você, qual é a questão mais importante a ser destravada nas negociações, na sua opinião?
BENINI – Acho que tem dois pontos muito importantes: a precificação de carbono (precisamos evoluir nisso e criar mercados de carbono que realmente funcionem) e outro é preciso que os países desenvolvidos consigam contribuir mais com os países em desenvolvimento. Este é o grande cerne da questão.

Rubens Benini, líder da estratégia de restauração florestal da The Nature Conservancy (TNC) América Latina (Divulgação)

PLANETA – O Brasil ficou com a imagem arranhada por não aceitar sediar a COP25, em 2019, sendo que sempre foram aqui as maiores reuniões mundiais sobre a questão do clima, desde a Rio92?
BENINI – A gente perde um pouco da liderança, sim. O Brasil sempre se colocou à frente nessa agenda, e trouxe muito benefício para o país. Eu prefiro acreditar que a gente só está postergando e vamos conseguir manter nossa postura e liderança. Vários países se candidataram, sinal de que estão vendo oportunidades.

PLANETA – O gasto é realmente alto ou estamos traumatizados com os últimos eventos que sediamos no Brasil?
BENINI – Verdade! Copa, Olimpíadas. Temos que tomar cuidado com o balança financeiro do nosso país. Mas não sei se é realmente alto o gasto para sediar a COP. Poderíamos conseguir muito financiamento externo para fazer isso acontecer. É questão de fazer as contas.

PLANETA – Você acredita que a população brasileira está esclarecida sobre as questões ambientais que estamos vivendo? Muita gente acha que Acordo de Paris é alguma coisa que a França inventou…
BENINI – Em função da baixa escolaridade, a gente não tem conseguido comunicar muito bem essa questão. Mas noto uma melhoria nas gerações mais novas. As gerações de 40 anos atrás ou mais tinham até incentivo para o desmatamento na Amazônica, por exemplo, porque isso era sinônimo de progresso. Agora temos que falar com essa geração que ainda é liderança no campo da responsabilidade que têm em recuperar o que fizeram, pelo menos a parte que está irregular. É complexo. Mas essa geração mais nova vai melhorando com programas de conscientização e educação ambiental. Só que é um processo que leva um tempo. Se continuarmos fazendo um bom trabalho em educação ambiental de base, daqui 10-15 anos vamos ter um ser humano com hábitos mais saudáveis para o planeta.

PLANETA – A eleição de Jair Bolsonaro, um presidente que ameaçou sair do Acordo e declara não acreditar nas mudanças climáticas, representa que estamos trazendo a mentalidade antiga de volta?
BENINI – Em relação ao novo governo, eu vejo que foram feitos alguns anúncios prematuros, que foram repensados. O fato de se repensar e não sair do Acordo e q vai escutar ciência, me deixa mais otimista e eu prefiro aguardar. Vamos tentar trabalhar junto.
No discurso do novo Ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, ele disse que o governo ouvir a ciência e que não vai sair do Acordo. Se de fato considerarem o que a ciência diz, hoje a ciência já comprovou as mudanças climáticas e poderemos falar tecnicamente, mostrar todos os impactos positivos não só para o planeta mas para a economia nacional. A gente sabe que se a gente perde mais de 20% de cobertura florestal de alguns biomas isso impacta todo o ciclo hidrológico, ou seja, as chuvas vão acontecer de forma diferente do normal, a chuva pode atrasar uns dias, acarretando em perdas de colheita. Isso é perda de dinheiro e para o PIB brasileiro. É um prejuízo econômico gigantesco.

PLANETA – Pode-se dizer que você tem uma visão bem otimista da COP24 e da situação Brasil, certo?
BENINI – Tenho que ter e buscar os caminhos para que isso aconteça. Não estamos falando de uma mera discussão sobre mudança do clima por si só, mas de todo o impacto que isso traz, inclusive, nas vidas humanas, nas vidas dos nossos filhos e netos. Por isso, precisamos engajar a sociedade civil, setores privados, governos estaduais para avançar nessa agenda. Tanto que criamos na semana passada uma campanha para ajudar o Brasil a alcançar as suas metas do Acordo de Paris e do Desafio de Bohn, que é recuperar 12 milhões de hectares. A Campanha Restaura Brasil pretende arrecadar 50 milhões de reais para destravar outros recursos públicos, como multa do IBAMA, para pagar a restauração florestal na ponta e assim ajudar na mitigação e no combate das mudanças climáticas.