29/04/2025 - 10:47
Autoridades não descartam nenhuma hipótese sobre queda de energia que deixou Península Ibérica sem luz por horas.O fornecimento de energia elétrica foi restaurado na maior parte da Espanha e Portugal na manhã desta terça-feira (29/04) após o maior apagão já ocorrido na Península Ibérica, enquanto as autoridades ainda tentam descobrir as causas do colapso.
“Após uma noite intensa, 99,95% da demanda de energia foi restaurada”, escreveu o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, em postagem na rede social X na manhã desta terça-feira, agradecendo à população por pela demonstração de “responsabilidade e espírito cívico” durante o incidente.
As autoridades ainda não determinaram a causa do apagão que durou entre 10 e 20 horas, dependendo da região, e o governo espanhol não descartou nenhuma hipótese.
O apagão começou logo após 12h30 (horário local) desta segunda-feira, e pode ter repercutido até na Groenlândia, que sofreu uma queda nas telecomunicações durante a noite, cujo sistema é parcialmente controlado pela Espanha.
A operadora de rede elétrica espanhola, Red Electrica (REE), afirmou que conseguiu suprir praticamente toda a demanda de eletricidade do país na manhã desta terça-feira, enquanto a portuguesa REN, assegurou que já no final da segunda-feira, todas as 89 subestações de energia do país estavam funcionando novamente, atendendo um total de 6,4 milhões de clientes.
O governo de Portugal informou que os aeroportos voltaram a funcionar, embora com atrasos, enquanto o metrô de Lisboa retomava as operações e os trens voltavam a circular.
Na Espanha, o transporte público foi reativado após longos atrasos, escolas e escritórios puderam retomar suas atividades e muitos hospitais recuperaram o fornecimento de energia, embora alguns continuassem a operar com geradores.
Desconexão com o resto da Europa
As autoridades agora estão sob pressão para explicar o que causou uma das maiores interrupções de energia já vistas na Europa. O primeiro-ministro Sánchez, afirmou na noite de segunda-feira que a Espanha sofreu uma perda abrupta de 15 gigawatts de geração de eletricidade em cinco segundos por volta do meio-dia, o equivalente a 60% da demanda nacional.
O diretor de operações da REE, Eduardo Prieto, explicou que houve “uma forte flutuação nos fluxos de energia”, acompanhada por “uma perda muito significativa de geração”.
“Esta perda de geração ultrapassou a perturbação de referência” utilizada para projetar e operar os sistemas elétricos na União Europeia (UE), causando “a desconexão do sistema elétrico da Península Ibérica do resto do sistema europeu” e o consequente colapso.
A instabilidade da rede elétrica causou a ruptura da interconexão elétrica espanhola e francesa através das montanhas dos Pireneus, resultando em um colapso geral do sistema espanhol, afirmou Prieto. Algumas áreas na França também sofreram breves interrupções.
O Ministro da Indústria da França, Marc Ferracci, disse nesta terça-feira que seu país estava mais bem preparado para evitar apagões como o sofrido pela Espanha e Portugal e que o impacto na França havia sido mínimo.
Investigações em andamento
A Espanha é um dos maiores produtores de energia renovável da Europa, mas os apagões desta segunda-feira geraram especulações sobre a volatilidade do fornecimento de energia solar ou eólica que teria tornado seus sistemas de energia mais vulneráveis a interrupções.
Sánchez, no entanto, descartou nesta terça-feira a possibilidade de um excesso de eletricidade gerada por fontes renováveis ter causado o apagão. O primeiro-ministro informou que o governo criou uma comissão para investigar as causas do colapso e disse que nenhuma hipótese foi descartada.
Sánchez negou ainda que o incidente tenha sido resultado da falta de energia nuclear e disse que aqueles que apontam para essa causa “estão mentindo ou mostrando sua ignorância”. A recuperação do fornecimento foi conseguida graças às interconexões com França e Marrocos, às usinas de ciclo combinado de gás e às usinas hidrelétricas, disse o premiê, que garantiu que, nessa crise, “as usinas nucleares, longe de serem uma solução, foram um problema”.
Cinco reatores nucleares foram desligados no momento do colapso do sistema “por decisão das próprias empresas operadoras” e foi necessário desviar grandes quantidades de energia para eles a fim de manter seus núcleos estáveis, nas palavras do governante.
“No momento, há duas usinas nucleares ativadas, não porque precisem, mas porque sua ativação já estava planejada”, acrescentou Sánchez, que explicou que, antes do apagão, havia geração nuclear em operação e que foi desconectada como as demais, portanto, não foi “mais resiliente do que nenhuma das outras tecnologias”. Ele indicou que as usinas nucleares que foram desconectadas na segunda-feira “ainda não foram incorporadas novamente ao sistema” e que se espera que isso seja feito nesta terça.
Sánchez afirmou ainda que os técnicos ainda estavam tentando descobrir a causa precisa e que os resultados dessas investigações serão usados para reforçar o sistema. “O que aconteceu ontem não pode acontecer novamente”, acrescentou. “Todas as medidas necessárias serão tomadas para garantir que isso não se repita.”
Nenhuma hipótese descartada
O Tribunal Superior da Espanha anunciou nesta terça-feira que abrirá um inquérito para descobrir se um ataque cibernético contra infraestruturas críticas espanholas pode ter causado o colapso. Se for comprovada a sabotagem, a Justiça espanhola investigará o caso como um crime de terrorismo.
Embora uma avaliação preliminar da REE tenha descartado essa possibilidade, Sánchez garantiu que ainda não há informações conclusivas e que nenhuma hipótese foi descartada, aguardando o relatório de especialistas independentes e o estudo que também foi solicitado ao Grupo Europeu de Coordenação de Eletricidade, vinculado à Comissão Europeia.
“Não vamos descartar nenhuma hipótese até que estejamos 100% esclarecidos”, disse o governante na entrevista coletiva concedida após o Conselho de Ministros, que tratou exclusivamente do apagão, e na qual insistiu que “não questiona” a declaração da Red Eléctrica.
O analista de energia e especialista em políticas públicas John Kemp observou que encontrar as causas básicas claras para a sequência de falhas que contribuíram para o apagão pode levar vários meses.
“A região tem uma das maiores penetrações do mundo em geração renovável, como eólica e solar, dessa forma, o apagão será um modelo de estudo sobre como os geradores renováveis impactam a confiabilidade, bem como a retomada após uma falha generalizada”, afirmou.
Retorno à normalidade após o caos
A volta à normalidade era ansiosamente aguardada na Espanha e em Portugal após um dia caótico sem metrô, ônibus superlotados, trens parados e comunicações interrompidas.
Tanto em Madri quanto em Barcelona, milhares de pessoas tiveram que atravessar as cidades a pé para chegar em casa. Longas filas se estendiam por centenas de metros nos pontos de ônibus. Nesta terça-feira, as autoridades de Madri disponibilizaram ônibus gratuitos. O metrô e alguns trens começaram a operar, embora com atrasos.
Somente na região de Madri, foram realizadas 286 operações para libertar pessoas presas dentro de elevadores, segundo autoridades regionais.
Durante a noite, passageiros ficaram retidos em alguns dos principais centros do país após todos os trens serem cancelados. Em Madri, alguns foram forçados a passar a noite na estação ou na casa de shows Movistar Arena, próxima ao local. Na estação ferroviária de Atocha, em Madri, policiais e funcionários da Cruz Vermelha distribuíram cobertores e garrafas de água.
Várias regiões da Espanha declararam estado de emergência nesta segunda-feira, com a mobilização de 30 mil policiais.
Em Barcelona, na manhã desta terça-feira, donos de bares e restaurantes contabilizaram os prejuízos com os produtos perdidos após meio dia com suas geladeiras e freezers desligados.
O apagão de segunda-feira lembrou eventos semelhantes na Europa, como quando uma queda de energia na Alemanha em 4 de novembro de 2006 deixou 10 milhões de pessoas na escuridão por quase uma hora. Três anos antes, em 28 de setembro de 2003, toda a Itália, exceto a Sardenha, ficou sem eletricidade.
rc/cn (Reuters, AP, AFP, EFE)