18/02/2022 - 13:00
Um novo dinossauro integrante de uma série de criaturas “incomuns” foi descoberto na Argentina. A nova espécie, Guemesia ochoai, pode ser o parente próximo dos ancestrais de um grupo de dinossauros sem braços, que vagava pelo hemisfério sul há mais de 70 milhões de anos. A descrição do dinossauro, liderada por pesquisadores argentinos, foi publicada na revista Journal of Vertebrate Palaeontology.
Um crânio parcialmente completo descoberto no norte da Argentina fornece novas evidências de um ecossistema único durante o Cretáceo Superior.
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O Guemesia ochoai era uma espécie de abelissaurídeo, um clado (grupo de espécies com ancestral comum) de carnívoros que vagavam pelo que hoje é a África, a América do Sul e a Índia. Datado de cerca de 70 milhões de anos, esse dinossauro pode ter sido um parente próximo dos ancestrais de todo o grupo.
A descoberta do crânio do Guemesia ochoai oferece uma visão valiosa de uma área que tem muito poucos fósseis de abelissaurídeos e pode explicar de alguma forma por que a área deu origem a animais tão incomuns.
Bastante incomum
A professora Anjali Goswami, líder de pesquisa do Museu de História Natural de Londres (Reino Unido) e coautora do estudo, disse: “Este novo dinossauro é bastante incomum para seu tipo. Ele tem várias características-chave que sugerem que é uma nova espécie, fornecendo novas informações importantes sobre uma área do mundo sobre o qual não sabemos muito. (…) Ele mostra que os dinossauros que vivem nessa região eram bem diferentes dos de outras partes da Argentina, apoiando a ideia de províncias distintas no Cretáceo da América do Sul. Também nos mostra que há muito mais a ser descoberto nessas áreas que recebem menos atenção do que alguns dos sítios fósseis mais famosos”.
Centenas de milhões de anos atrás, todos os continentes estavam combinados em um supercontinente conhecido como Pangeia. Com o tempo, à medida que as placas tectônicas se deslocaram, essa massa de terra começou a se fraturar, formando os continentes Gondwana e Laurásia.
Há 180 milhões de anos, esses dois continentes maciços começariam a se dividir. Gondwana se partiu e formou os principais continentes do hemisfério sul, assim como a Índia.
Enquanto os novos continentes se afastavam lentamente, as espécies ainda conseguiriam se mover entre eles, levando alguns cientistas a sugerir que a fauna de cada massa de terra teria permanecido praticamente a mesma.
Sem braços, mas não inofensivo
Um dos grupos que viviam em Gondwana na época eram os dinossauros abelissaurídeos. Tratava-se de um grupo dos principais terópodes predadores que podem ter se alimentado de grandes dinossauros, como os titanossauros. No entanto, apesar desse estilo de vida temível, eles eram capazes de derrubar suas enormes presas sem o uso dos membros superiores.
Muitas espécies de abelissauros tinham membros anteriores ainda mais curtos do que os do mais famoso Tyrannosaurus rex e efetivamente inúteis. Isso teria deixado as mãos dos abelissaurídeos incapazes de agarrar, forçando esses dinossauros a confiar em suas poderosas cabeças e mandíbulas para capturar presas.
Fósseis desses carnívoros foram encontrados em rochas em toda a África, América do Sul, Índia e Europa que datam do Cretáceo Superior, pouco antes de os dinossauros serem exterminados há 66 milhões de anos.
A Argentina é bem conhecida pelos fósseis de abelissauros, com 35 espécies já descritas em seu território. Mas quase todos eles são da Patagônia, no sul do país, e comparativamente poucos dos dinossauros foram encontrados no noroeste.
A descrição dessa nova espécie a partir de parte de um crânio fornece novos conhecimentos vitais para os cientistas que pesquisam esse período da história.
Antepassado abelissaurídeo?
A caixa craniana, incluindo as partes superior e posterior do crânio, foi encontrada na Formação Los Blanquitos, perto de Amblayo, no norte da Argentina, em rochas datadas entre 75 e 65 milhões de anos. Isso significa que esse animal viveu pouco antes da extinção em massa do final do Cretáceo, que viu a extinção da maioria dos dinossauros.
Uma característica única deste dinossauro são as fileiras de pequenos orifícios na frente de seu crânio, conhecidos como forames. Os pesquisadores sugeriram que esses buracos poderiam ter permitido que o animal esfriasse, com sangue sendo bombeado para a pele fina na frente da cabeça a fim de liberar calor.
Como muitos abelissaurídeos, o crânio tem uma caixa craniana “notavelmente pequena”. Mesmo assim, a nova espécie tem um crânio cerca de 70% menor do que qualquer um de seus parentes. Esse tamanho reduzido pode apontar para o crânio pertencer a um jovem, mas há evidências conflitantes sobre isso.
Uma falta de clareza semelhante se estende a suas outras características, incluindo partes finas do crânio e, ao contrário de outros abelissaurídeos, falta de chifres. Sugeriu-se que isso pode significar que a nova espécie está perto da base da árvore genealógica dos abelissauros ou intimamente relacionada aos ancestrais do resto do grupo.
Embora alguns dos detalhes ainda não estejam claros, existem características únicas suficientes do dinossauro para convencer os pesquisadores de que é um novo gênero e espécie, que eles chamaram de Guemesia ochoai. O nome se refere ao general Martin Miguel de Güemes, herói da da independência argentina, e a Javier Ochoa, técnico do museu que descobriu o espécime.
Região diferenciada
Embora muitas questões ainda envolvam o recém-descrito abelissaurídeo, ele se soma a um crescente corpo de evidências sugerindo que o noroeste da Argentina tinha um conjunto único de criaturas, diferente das encontradas em outras partes do mundo nesse momento. Esse grupo incluía tartarugas da família Podocnemididae, como Stupendemys geographicus, um dos maiores répteis aquáticos que já viveram.
Os cientistas agora esperam descobrir mais espécimes de Guemesia ochoai e seus parentes para descobrir mais sobre a vida na antiga Argentina. Eles estão particularmente focados no período imediatamente antes e após a extinção em massa do final do Cretáceo para entender como esse evento maciço moldou a vida na Terra.
Além do Guemesia ochoai, a equipe já descobriu várias outras espécies interessantes, de peixes a mamíferos, que estão descrevendo atualmente.
Segundo Anjali, ainda existe muito a aprender com os fósseis do norte da Argentina. “Entender grandes eventos globais, como uma extinção em massa, requer conjuntos de dados globais, mas há muitas partes do mundo que não foram estudadas em detalhes e toneladas de fósseis ainda a serem descobertos”, disse ela. “Deixamos alguns fósseis interessantes no solo em nossa última viagem, sem saber que levaria anos até que pudéssemos voltar aos nossos locais de campo. Agora esperamos que não demore muito mais para terminarmos de desenterrá-los. e descobrir muitas outras espécies dessa fauna única.”