14/07/2025 - 14:08
Clara dominância masculina sobre fêmeas foi observada em apenas 25 das 151 populações de primatas estudadas. Resultado contradiz argumentos que apresentam o patriarcado humano como um legado dos primatas.Em geral, acredita-se que em quase todas as espécies o macho lidera o grupo, mas a verdade é que as relações de poder entre machos e fêmeas não são tão claras e variam significativamente. Na maioria das espécies, não há uma dominância clara de um sexo sobre outro.
Fatores evolutivos determinam o poder, e os machos dominam quando superam fisicamente as fêmeas, enquanto as fêmeas buscam diferentes maneiras de se impor aos machos, pelo menos entre os primatas.
Essa é a principal conclusão de um estudo liderado por pesquisadores da Universidade de Montpellier, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva em Leipzig e do Centro Alemão de Primatas em Göttingen, cujos detalhes foram publicados na semana passada na revista científica PNAS.
O estudo também descobriu que as assimetrias de poder entre machos e fêmeas variam entre as sociedades de primatas.
De acordo com a pesquisa, que reuniu observações detalhadas do comportamento entre machos e fêmeas de 253 populações de 121 espécies de primatas, o domínio claro de um sexo é raro.
Batalha dos sexos
Uma análise dos dados disponíveis sobre agressão entre os sexos revelou que as disputas entre machos e fêmeas são surpreendentemente comuns: quase metade de todas as brigas em grupos sociais foi entre um macho e uma fêmea.
Até agora, as pesquisas se concentravam em brigas entre indivíduos do mesmo sexo, porque as teorias existentes sobre evolução social pressupõem que machos e fêmeas competem por recursos diferentes.
O estudo analisou o resultado das disputas entre indivíduos do sexo oposto. Os machos ganhariam mais? Isso ocorre da mesma forma em todas as espécies?
Por muito tempo, presumiu-se que, entre os primatas, o poder tende a ser dominado pelos machos e que as poucas espécies icônicas dominadas por mulheres, como os lêmures de cauda anelada ou os bonobos, representavam uma exceção que exigia uma explicação especial.
Mas o novo estudo revela a complexidade e a variabilidade das tendências de gênero nas relações de dominância nas sociedades de primatas.
Em 25 das 151 populações com dados quantitativos, os machos venceram mais de 90% das disputas com as fêmeas. Em contraste, há uma clara dominância feminina em 16 populações. Quanto ao restante (mais de 70%), o viés de gênero em relações de poder é moderado ou sequer existe.
Quais fatores estão associados à dominância por cada sexo?
A equipe de pesquisa testou cinco hipóteses para explicar as tendências de gênero nas relações de dominância e descobriu que a tendência feminina está associada a vários fatores-chave.
O poder feminino é observado principalmente em espécies onde as fêmeas são monogâmicas, de tamanho semelhante ao dos machos ou que se alimentam principalmente em árvores — situações em que as fêmeas têm mais opções para acasalar ou não com um determinado macho.
Além disso, a dominância feminina prevalece em situações em que as fêmeas enfrentam intensa competição por recursos, como em espécies solitárias ou que vivem em pares, bem como quando os conflitos entre machos e fêmeas são menos arriscados para sua prole dependente, porque, por exemplo, as mães deixam seus filhotes em um local seguro ao se alimentarem, em vez de levá-los consigo.
Em contraste, a dominância masculina prevalece em espécies terrestres, onde os machos possuem corpos ou armas maiores que as fêmeas e onde os machos acasalam com múltiplas fêmeas.
“É crucial notar que, enquanto os primatas machos obtêm poder por meio da força física e da coerção, o empoderamento feminino depende de caminhos alternativos, como estratégias reprodutivas para obter controle sobre o acasalamento”, observa Elise Huchard, da Universidade de Montpellier.
A descoberta desafia as visões tradicionais sobre as origens naturais dos papéis de gênero ao demonstrar que as fêmeas têm quase a mesma probabilidade de dominar os machos do que o contrário, e que na maioria das sociedades de primatas não há diferenças claras de poder entre os sexos.
Diante desses achados, os cientistas defendem a revisão de postulados que apresentam o patriarcado humano como um legado primata. Segundo eles, as relações de gênero devem ser analisadas considerando seus contextos sociais e ecológicos.
“Os humanos não compartilham todos os traços que caracterizam espécies em que os machos dominam estritamente as fêmeas”, argumentam os pesquisadores em artigo publicado no site do Insituto Max Planck. “Em vez disso, o conjunto de características humanas os coloca mais próximos de espécies que apresentam relações mais complexas, nas quais indivíduos de qualquer sexo podem se tornar dominantes.”
md/ra (AFP, EFE, DW)