03/01/2021 - 13:22
A sobrecarga de trabalho e o esgotamento devido a essa sobrecarga, que pode desencadear a síndrome de burnout, estão chamando a atenção dos profissionais da área médica do trabalho. Eles indicam a necessidade de maior atenção para os sintomas durante o período de tensão e fadiga provocado pela pandemia de covid-19, que trouxe a necessidade de manter o isolamento social pelo máximo de tempo possível.
Burnout é um transtorno psíquico de caráter depressivo, com sintomas parecidos com os do estresse, da ansiedade e da síndrome do pânico, mas no qual o especialista percebe a associação com a vida profissional da pessoa. A síndrome, que foi incluída na Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2019, em uma lista que entrará em vigor em 2022, se não tratada pode evoluir para doenças físicas, como doença coronariana, hipertensão, problemas gastrointestinais, depressão profunda e alcoolismo.
- Covid-19 mudará conceito de trabalho e moradia, dizem especialistas
- Eficácia de cada país no combate à covid-19 reflete senso de coletividade
Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que analisou o impacto da pandemia e do isolamento social na saúde mental de trabalhadores essenciais, mostrou que sintomas de ansiedade e depressão afetam 47,3% desses trabalhadores durante a pandemia, no Brasil e na Espanha. Mais da metade deles (e 27,4% do total de entrevistados) sofre de ansiedade e depressão ao mesmo tempo. Além disso, 44,3% têm abusado de bebidas alcoólicas; 42,9% sofreram mudanças nos hábitos de sono; e 30,9% foram diagnosticados ou se trataram de doenças mentais no ano anterior.
Crescimento da depressão
Segundo a OMS, no Brasil, 11,5 milhões de pessoas sofrem com depressão e até 2030 essa será a doença mais comum no país. A síndrome de burnout ou esgotamento profissional também vem crescendo como um problema a ser enfrentado pelas empresas. De acordo com um estudo realizado em 2019, cerca de 20 mil brasileiros pediram afastamento médico no ano por doenças mentais relacionadas ao trabalho.
“A pandemia tem sido muito prejudicial a toda a sociedade e os trabalhadores têm sofrido grande parte desses impactos. Por isso, agir e minimizar esse cenário é também uma responsabilidade das empresas, pois cabe a elas fomentar a saúde, segurança e qualidade de vida das suas equipes. O emocional das pessoas tem sido fortemente abalado pelo isolamento social, as incertezas do futuro, a pressão para alcançar resultados, as dificuldades do trabalho remoto, entre outros pontos”, disse o presidente da Associação Brasileira de Empresas de Saúde e Segurança no Trabalho (Abresst), médico e gestor em saúde, Ricardo Pacheco.
Relações afetadas
Segundo ele, o assunto tem merecido tanta atenção que em março de 2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu os impactos da pandemia na saúde mental e publicou um documento desenvolvido pelo Departamento de Saúde Mental, com mensagens de apoio e bem-estar de diferentes grupos-alvo.
“O intuito dessa ação foi promover o cuidado psicológico com a população mundial. Além das mensagens para as pessoas em geral, o documento contém uma sessão voltada aos trabalhadores. Isso acontece porque as relações profissionais foram muito afetadas pela covid-19, gerando, além das incertezas com a estabilidade do trabalho, a insegurança para sair de casa e trabalhar, ou mesmo a dificuldade para conciliar a quarentena em família e o home office”, disse Pacheco.
Uma das medidas importantes para prevenir a síndrome de burnout, de acordo com o médico, é a implantação de adequações para que o chamado novo normal funcione tanto agora quanto depois da pandemia. Para ele, é extremamente necessário que a saúde mental dos trabalhadores seja um dos itens de maior atenção por parte das empresas. Isso inclui o treinamento dos líderes e a criação de novas ações para diminuir os problemas emocionais da equipe, além de um acompanhamento de perto da saúde de cada funcionário.
Choro e pânico
A gestora de benefícios Patrícia Mota Mendes Luiz Santos está em tratamento depois de ser diagnosticada com a síndrome. Os sintomas começaram com dores de cabeça constantes até que um dia ela foi dormir e acordou com a dor. Ao chegar ao trabalho, sentiu uma dor mais forte e avisou a uma colega que não estava bem.
“Parecia que estava num lugar estranho, as coisas e o meu raciocínio começaram a ficar lentos. De repente, me deu uma crise de choro e pânico, um desespero. Adormeceram as minhas mãos, um lado do rosto, e eu pensei que estava enfartando. Um lado do corpo ficou paralisado. Fui levada ao pronto-socorro, mas não havia alterações e depois disso fui diagnosticada com burnout.”
A partir de então, Patrícia, que se autopressionava para ser excelente em tudo, precisou aprender a “colocar o pé no freio” e a lidar com um ritmo de vida mais vagaroso, sem ficar ansiosa por resolver tudo no mesmo dia. “O ponto inicial de tudo é a aceitação. Saber que naquele momento eu estou naquela situação e não sou aquilo. Por isso a terapia é fundamental. Os remédios ajudam, mas quem realmente tira da crise é a terapia.”
Atualmente, ela não toma mais medicamentos porque aprendeu a se controlar com muita terapia e autoconhecimento. “Eu acho que isso não tem cura, mas temos o controle e o entendimento de que precisamos nos dar o tempo necessário e que não conseguimos ser 100% em tudo, principalmente nós que somos mulheres. E a mulher tende a se cobrar muito nesse sentido, achando que tem de ser perfeita em todos os setores da vida, e aí acontecem os acúmulos que desencadeiam nas síndromes”, finalizou.