21/05/2020 - 10:48
Muitas evidências científicas ligando o exercício à saúde do cérebro já foram reunidas, e algumas pesquisas sugeriram que o preparo físico pode até melhorar a memória. Mas o que acontece durante o exercício para acionar esses benefícios?
Uma nova pesquisa da University of Texas Southwestern Medical Center (UT Southwestern, nos EUA) que mapeou alterações cerebrais após um ano de exercícios aeróbicos descobriu um processo potencialmente crítico: o exercício aumenta o fluxo sanguíneo em duas regiões relevantes do cérebro associadas à memória. O estudo mostrou que esse fluxo sanguíneo pode ajudar pessoas ainda mais velhas com problemas de memória a melhorar a cognição, uma descoberta que os cientistas dizem que poderia orientar futuras pesquisas sobre a doença de Alzheimer. O estudo a esse respeito foi publicado na revista “Journal of Alzheimer’s Disease”.
“Talvez um dia possamos desenvolver um medicamento ou procedimento que direcione com segurança o fluxo sanguíneo para essas regiões do cérebro”, diz Binu Thomas, cientista sênior de pesquisa em neuroimagem da UT Southwestern. “Mas estamos apenas começando a explorar a combinação certa de estratégias para ajudar a prevenir ou retardar os sintomas da doença de Alzheimer. Há muito mais para entender sobre o cérebro e o envelhecimento.”
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Fluxo sanguíneo e memória
O estudo documentou alterações na memória de longo prazo e no fluxo sanguíneo cerebral em 30 participantes, cada um com 60 anos ou mais e apresentando problemas de memória. Metade deles foi submetida a 12 meses de treinamento com exercícios aeróbicos; o resto fez apenas alongamentos.
O grupo de exercícios mostrou uma melhora de 47% em algumas pontuações de memória após um ano, em comparação com uma mudança mínima nos participantes do alongamento. As imagens cerebrais do grupo de exercícios, tiradas em repouso no início e no final do estudo, mostraram aumento do fluxo sanguíneo no córtex cingulado anterior e nas regiões neurais do hipocampo que desempenham papéis importantes na função da memória.
Outros estudos documentaram benefícios para adultos cognitivamente normais em um programa de exercícios, incluindo pesquisas anteriores de Thomas que mostraram que atletas idosos têm melhor fluxo sanguíneo no córtex do que adultos sedentários. Mas a nova pesquisa é significativa, porque representa uma melhora durante um período mais longo em adultos com alto risco de desenvolver a doença de Alzheimer.
“Mostramos que, mesmo quando sua memória começa a desvanecer, você ainda pode fazer algo adicionando exercícios aeróbicos ao seu estilo de vida”, diz Thomas.
Reunião de evidências
A busca por intervenções em demência está se tornando cada vez mais premente. Só nos Estados Unidos, mais de 5 milhões de pessoas têm a doença de Alzheimer, e o número deve triplicar até 2050.
Pesquisas recentes ajudaram os cientistas a entender melhor a gênese molecular da doença, incluindo uma descoberta de 2018 do Instituto do Cérebro Peter O’Donnell Jr. da UT Southwestern, que está orientando os esforços para detectar a condição antes que os sintomas surjam. No entanto, uma extensa pesquisa sobre como prevenir ou retardar a demência não produziu tratamentos comprovados que tornariam um diagnóstico precoce acionável para os pacientes.
Os cientistas da UT Southwestern estão entre muitas equipes em todo o mundo tentando determinar se o exercício pode ser a primeira intervenção desse tipo. Há evidências crescentes de que poderia, pelo menos, desempenhar um pequeno papel no adiamento ou na redução do risco de doença de Alzheimer.
Por exemplo, um estudo de 2018 mostrou que pessoas com níveis mais baixos de condicionamento físico sofreram deterioração mais rápida das fibras nervosas vitais no cérebro, a chamada substância branca. Um estudo publicado no ano passado mostrou que o exercício está correlacionado com a deterioração mais lenta do hipocampo.
Em relação à importância do fluxo sanguíneo, Thomas diz que um dia poderá ser usado em combinação com outras estratégias para preservar a função cerebral em pessoas com comprometimento cognitivo leve. “O fluxo sanguíneo cerebral é parte do quebra-cabeça, e precisamos continuar a montá-lo”, diz ele. “Mas vimos dados suficientes para saber que iniciar um programa de condicionamento físico pode trazer benefícios ao longo da vida tanto para o cérebro quanto para o coração.”