20/12/2025 - 11:59
Material é apenas 1% do que se acredita estar com o Departamento de Justiça e tem inúmeros trechos ocultados. Várias celebridades, como Michael Jackson, Mick Jagger e Bill Clinton, aparecem em fotos.O Departamento de Justiça dos EUA começou a divulgar nesta sexta-feira (19/12) os aguardados arquivos de sua investigação sobre o caso do criminoso sexual condenado Jeffrey Epstein, embora muitos documentos contenham tarjas pretas.
O Departamento de Justiça divulgou 3.965 arquivos, em aproximadamente 3 gigabytes, todos disponíveis para download em seu site. Isso é apenas 1% das centenas de milhares de documentos sobre o caso que o Departamento de Justiça possui, que, acredita-se, ocupem 300 gigabytes de dados.
Mesmo assim, os documentos agora públicos podem conter as informações mais detalhadas já divulgadas das quase duas décadas de investigações governamentais sobre o abuso sexual de mulheres jovens e menores de idade por Epstein.
O financista tinha extensas conexões na alta sociedade, o que sempre alimentou especulações sobre a dimensão do escândalo. Há um mês, uma lei assinada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, determinou a divulgação dos arquivos, e o Departamento de Justiça publicou este primeiro lote de dados poucas horas antes do prazo final.
Políticos e celebridades nas fotografias
A divulgação parcial inclui milhares de fotos e documentos das casas e de eventos sociais de Epstein, muitos com extensas partes borradas sem qualquer explicação. Os documentos divulgados não fornecem qualquer contexto sobre onde ou quando as fotos foram tiradas e, por si só, não comprovam atividades ilegais por parte das pessoas retratadas.
As fotos divulgadas frequentemente mostram políticos e celebridades conhecidos internacionalmente ao lado de mulheres cujos rostos foram ocultados por tarjas pretas.
Entre o material divulgado nesta sexta-feira, em sua maioria em formato de dados PDF, estão inúmeras fotografias mostrando o ex-presidente democrata Bill Clinton, cujos laços com o magnata já levaram Trump a pedir uma investigação, e outras figuras de destaque, incluindo Mick Jagger, Michael Jackson, Diana Ross e o empresário Richard Branson, fundador do Grupo Virgin, na companhia de Epstein.
Mas muitos dos documentos têm grandes seções ocultadas, o que lança dúvidas sobre se a divulgação colocará um fim às persistentes especulações sobre um acobertamento de alto nível do caso.
Mesmo parciais, os arquivos lançam alguma luz sobre os laços estreitos do financista com executivos de alto escalão, celebridades e políticos, incluindo o próprio Trump.
O enorme conjunto de documentos inclui sete páginas listando os nomes de 254 massagistas, todos completamente censurados, juntamente com a explicação “censurado para proteger informações de potenciais vítimas”.
Outro arquivo contém dezenas de imagens censuradas mostrando figuras nuas ou com pouca roupa. Outras mostram Epstein ao lado de mulheres com os rostos cobertos por tarjas pretas. Fotografias inéditas incluem uma de Bill Clinton reclinado numa jacuzzi, com parte da imagem obscurecida por um retângulo preto. Clinton nunca foi acusado de má conduta pelas vítimas conhecidas de Epstein.
O porta-voz de Clinton, Angel Urena, disse que a investigação sobre Epstein não é sobre Bill Clinton. “Há dois tipos de pessoas aqui”, disse Urena. “O primeiro grupo não sabia de nada e cortou relações com Epstein antes que seus crimes viessem à tona. O segundo grupo continuou os relacionamentos depois disso. Nós estamos no primeiro grupo. Nenhuma manobra de protelação por parte das pessoas do segundo grupo mudará isso.”
Trump está nos arquivos?
A quase ausência de Trump nos arquivos divulgados, apesar de sua antiga ligação com Epstein, intensificou os apelos por total transparência. Segundo a agência de notícias Associated Press, parece que o pequeno número de fotos que mostram o presidente republicano está em domínio público há décadas.
Uma análise inicial das centenas de milhares de páginas, feita pela agência de notícias Reuters, encontrou apenas uma foto de Epstein segurando um cheque gigante com o nome de Trump e outra em que o livro de Trump de 1997, Trump: A arte da volta por cima, pode ser visto numa estante atrás de Epstein.
Na sexta-feira, Trump embarcou num voo para um evento na Carolina do Norte, mas, em comentários rápidos a repórteres, não fez nenhuma menção à nova divulgação nem respondeu a perguntas. Entre os passageiros do voo estava o vice-procurador-geral Todd Blanche, o segundo funcionário mais importante do Departamento de Justiça, que supervisionou a revisão dos arquivos do caso Epstein.
Trump sempre negou qualquer irregularidade em relação a Epstein, mas está sob pressão para divulgar integralmente todos os arquivos do caso por parte de seus próprios apoiadores nacionalistas cristãos, muitos dos quais acreditam em teorias da conspiração – muitas delas alimentadas pelo próprio Trump – de que a elite política dos EUA está em conluio com pedófilos.
Reclamações pela pequena quantidade
Muitos senadores democratas criticaram a parcialidade da divulgação dos arquivos feita pelo governo Trump e afirmaram que vão tentar uma ação judicial contra a procuradora-geral Pam Bondi por ela alegadamente não ter cumprido a lei que exige a desclassificação total dos arquivos.
“Este conjunto de documentos, amplamente censurado, divulgado hoje pelo Departamento de Justiça, representa apenas uma fração de todo o conjunto de provas”, disse o líder da minoria no Senado, Chuck Schumer. “Por exemplo, todas as 119 páginas de um documento foram completamente censuradas”, acrescentou.
Algumas das vítimas de Epstein saudaram a divulgação, mas questionaram a falta de informações.
“Há muita informação, mas não tanta como gostaríamos de ver”, disse Dani Bensky, uma das vítimas, numa entrevista à emissora NBC News. Bensky acrescentou que, apesar disso, a revelação confirma a veracidade das denúncias das vítimas.
Maria Farmer, outra vítima do financista, elogiou a divulgação da denúncia de pornografia infantil que fez ao FBI. “Isso é incrível. Obrigada por acreditarem em mim. Sinto-me redimida. Este é um dos melhores dias da minha vida”, reagiu através dos advogados que a representam.
Uma das vítimas mais jovens de Jeffrey Epstein, Marina Lacerda, expressou frustração com a divulgação incompleta dos arquivos e pediu maior transparência por parte do Departamento de Justiça.
“Simplesmente divulguem os arquivos”, disse Lacerda, que é identificada como “Vítima Menor 1” na acusação federal contra Epstein. Ela afirma ter sido abusada sexualmente pelo financista quando tinha apenas 14 anos. “E parem de ocultar nomes que não precisam ser ocultados.”
Lacerda disse estar cética em relação às alegações de transparência do governo. “No começo, eles nos chamavam de farsa, certo?”, disse. “Agora dizem: ‘Acreditamos em vocês, vamos divulgar os arquivos’, mas ainda não divulgaram os arquivos e nem sequer há total transparência.”
Nenhuma nova investigação
As ligações entre os indivíduos que aparecem no material divulgado e Epstein eram conhecidas, e as fotos divulgadas até o momento não parecem retratar conduta criminosa.
Blanche alertou, antes da divulgação, que os documentos seriam parcialmente censurados para proteger as vítimas e que não se esperam novas acusações nesse caso, que abalou os Estados Unidos nos últimos meses. “No momento, não há novas acusações, mas estamos investigando”, afirmou Blanche em entrevista à emissora de TV Fox News.
Blanche advertiu que não seria possível divulgar todos os documentos exigidos por lei de uma só vez, devido ao seu volume, e disse que o Departamento de Justiça planeja divulgar “centenas de milhares de” arquivos nas próximas semanas.
Morte na cadeia
Epstein foi encontrado morto na sua cela em Nova York em 10 de agosto de 2019, antes de ser julgado por uma nova acusação, de tráfico sexual, o que alimentou inúmeras especulações de que ele teria sido assassinado para abafar um escândalo que envolvia figuras proeminentes do país.
Trump prometeu, durante a campanha presidencial de 2024, revelações bombásticas sobre o caso Epstein, um bilionário de quem foi amigo durante décadas. Depois, o republicano mudou o discurso e passou a classificar o caso como uma farsa montada pela oposição democrata.
as (AFP, Efe, DPA, Lusa, AP, Reuters)