26/02/2020 - 21:13
Um dos maiores eventos vulcânicos dos últimos 2 milhões de anos, a supererupção de Toba foi cerca de 5 mil vezes maior que a erupção do Monte Santa Helena (EUA) nos anos 1980. A erupção ocorreu 74 mil anos atrás, na ilha de Sumatra (Indonésia), e cientistas consideram que ela inaugurou um “inverno vulcânico” que se prolongou de seis a dez anos. O incidente teria provocado um período de resfriamento da superfície da Terra que durou mil anos.
As teorias alegavam que a erupção vulcânica levaria a grandes catástrofes, incluindo a dizimação de populações de hominídeos e mamíferos na Ásia e a quase extinção de nossa própria espécie. Dizia-se que poucos Homo sapiens na África sobreviveram desenvolvendo sofisticadas estratégias sociais, simbólicas e econômicas que lhes permitiram, posteriormente, reexpandir-se e povoar a Ásia há 60 mil anos em uma única e rápida onda migratória ao longo do litoral do Oceano Índico.
Um trabalho de campo realizado no sul da Índia em 2007 desafiou essas teorias, levando a grandes debates entre arqueólogos, geneticistas e outros cientistas sobre o momento das dispersões humanas fora da África e o impacto da supererupção de Toba no clima e nos variados ambientes. Um estudo atual, do qual participam alguns dos pesquisadores que atuaram em 2007, dá continuidade ao debate, fornecendo evidências de que o Homo sapiens estava presente na Ásia mais cedo do que o esperado e que a supererupção de Toba não foi tão apocalíptica quanto se acreditava. O trabalho foi apresentado em um artigo publicado na revista “Nature Communications”.
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A supererupção e a evolução humana
O estudo atual relata um registro estratigráfico exclusivo de 80 mil anos de duração em Dhaba, no Middle Son Valley, no norte da Índia. As ferramentas de pedra descobertas em Dhaba em associação com o momento do evento de Toba fornecem fortes evidências de que as populações que usavam ferramentas no Paleolítico Médio estavam presentes na Índia antes e depois de 74 mil anos atrás.
“Embora as cinzas de Toba tenham sido identificadas pela primeira vez no Middle Son Valley nos anos 1980, até agora não tínhamos evidências arqueológicas associadas, portanto o sítio de Dhaba preenche uma importante lacuna cronológica”, observou o professor J. N. Pal, pesquisador principal da Universidade de Allahabad (Índia).
O professor Chris Clarkson, da Universidade de Queensland (Austrália), principal autor do estudo, acrescentou: “As populações de Dhaba usavam ferramentas de pedra que eram semelhantes aos kits de ferramentas usados pelo Homo sapiens na África na mesma época. O fato de esses kits de ferramentas não desaparecerem no momento da supererupção de Toba ou mudarem drasticamente logo depois indica que as populações humanas sobreviveram à chamada catástrofe e continuaram a criar ferramentas para modificar seus ambientes”.
Essa nova evidência arqueológica apoia indícios fósseis de que os seres humanos migraram da África e se expandiram pela Eurásia antes de 60 mil anos atrás. Ele também apoia descobertas genéticas de que os humanos cruzaram com espécies arcaicas de hominídeos, como os neandertais, antes de 60 mil anos atrás.
Mudança climática e resiliência humana
Embora a supererupção de Toba tenha sido um evento colossal, poucos climatologistas e geocientistas continuam a apoiar a formulação original do cenário “inverno vulcânico”, sugerindo que o resfriamento da Terra foi mais brando e que Toba pode não ter realmente causado o período glacial subsequente. Evidências arqueológicas recentes na Ásia, incluindo as descobertas desenterradas nesse estudo, não apoiam a teoria de que as populações de hominídeos foram extintas devido à supererupção de Toba.
Em vez disso, evidências arqueológicas indicam que os seres humanos sobreviveram e lidaram com um dos maiores eventos vulcânicos da história da humanidade, demonstrando que pequenos grupos de caçadores-coletores eram adaptáveis diante das mudanças ambientais. No entanto, os povos que viveram em torno de Dhaba há mais de 74 mil anos não parecem ter contribuído significativamente para o acervo genético dos povos contemporâneos. Isso sugere que esses caçadores-coletores provavelmente enfrentaram uma série de desafios à sua sobrevivência a longo prazo, incluindo as dramáticas mudanças ambientais dos milênios seguintes.
Ao resumir as implicações mais amplas do estudo, o professor Michael Petraglia, do Instituto Max Planck (Alemanha), afirmou: “O registro arqueológico demonstra que, embora os humanos às vezes mostrem um nível notável de resiliência aos desafios, fica também claro que as pessoas não necessariamente prosperam no longo prazo”.