18/03/2025 - 18:12
Autoridades usarão softwares de reconhecimento facial para identificar participantes de eventos LGBTQ+. Medida se acrescenta a lei que visa “proteger as crianças” da “representação ou promoção” da homossexualidade.Milhares de pessoas saíram às ruas de Budapeste, na Hungria, para protestar contra uma nova lei anti-LGBTQ+ aprovada nesta terça-feira (18/05) que visa proibir as paradas do Orgulho LGBTQ+ e permitir que as autoridades usem softwares de reconhecimento facial para identificar quem participar dos eventos.
A ação dos legisladores húngaros é parte de uma repressão do Estado à comunidade LGBTQ+ do país promovida pelo partido nacionalista-populista Fidesz do primeiro-ministro, Viktor Orbán, aliado dos presidentes da Rússia, Vladimir Putin, e dos Estados Unidos, Donald Trump.
A medida, que lembra restrições semelhantes impostas contra minorias sexuais na Rússia, foi aprovada com 136 votos a favor e 27 contra. A lei apoiada pelo partido de Orbán e seu parceiro minoritário de coalizão, os democratas cristãos, foi votada no Parlamento em um procedimento acelerado após ter sido submetida na segunda-feira.
Legisladores de oposição realizaram um protesto em pleno Parlamento que envolveu bombas de fumaça coloridas.
O que a lei diz?
O projeto altera a lei do país sobre o direito de reunião para tornar ilegal realizar ou comparecer a eventos que violem a controversa legislação de “proteção à criança” da Hungria, que proíbe a “representação ou promoção” da homossexualidade para menores de 18 anos.
Participar de um evento proibido acarretará multas de até 200.000 florins húngaros (R$ 3 mil), que o Estado deve encaminhará para a “proteção à criança”, de acordo com o texto da lei. As autoridades podem usar ferramentas de reconhecimento facial para identificar os indivíduos que comparecerem a um evento proibido.
Os organizadores do Budapest Pride disseram em nota que o objetivo da lei era usar a comunidade LGBTQ+ como “bode expiatório” para silenciar vozes críticas ao governo de Orbán.
“Isso não é proteção infantil, isso é fascismo”, escreveram os organizadores do evento, que atrai milhares de pessoas a cada ano e celebra a história do movimento LGBTQ+ enquanto defende direitos iguais para a comunidade gay, lésbica, bissexual e transgênero.
O porta-voz do Budapest Pride, Jojó Majercsik, disse que, apesar dos anos de esforço de Orbán para estigmatizar pessoas LGBTQ+, a organização recebeu uma grande onda de apoio desde que o líder húngaro deu a entender, em fevereiro, que seu governo tomaria medidas para proibir o evento.
“Muitas, muitas pessoas foram mobilizadas”, disse Majercsik. “É uma coisa nova, comparado aos ataques dos últimos anos, recebermos muitas mensagens e comentários de pessoas dizendo: ‘até hoje não fui ao Pride, não me importava, mas este ano estarei lá e levarei minha família.'”
Repressão governamental
A nova legislação é a mais recente medida contra pessoas LGBTQ+ tomada por Orbán, cujo governo aprovou outras leis que grupos de direitos e políticos europeus condenaram como repressivas às minorias sexuais.
Em 2022, a Comissão Europeia entrou com uma açãono mais alto tribunal da União Europeia (UE) contra a lei húngara de “proteção à criança” de 2021. O órgão Executivo da UE argumentou que a lei “discrimina pessoas com base em sua orientação sexual e identidade de gênero”.
A lei de “proteção à criança” da Hungria – além de proibir a “representação ou promoção” da homossexualidade em conteúdo disponível para menores, incluindo na televisão, filmes, anúncios e literatura – também proíbe a menção de questões LGBTQ+ em programas educacionais escolares, assim como a representação pública de “gênero que se desvie do sexo no nascimento”.
Livrarias húngaras enfrentaram multas pesadas por não embrulharem livros que contêm temas LGBTQ+ em embalagens fechadas.
Uma lei anti-LGBTQ, que entrou em vigor em junho de 2024, torna a “mudança biológica de sexo com base no desejo e inclinação pessoal” um crime e pune pessoas transgênero que se submetem a cirurgias de afirmação de gênero e médicos que realizam cirurgias com até três anos de prisão.
Os críticos argumentaram que a campanha de Orbán equivale a uma tentativa de cortar a visibilidade LGBTQ+ e que, ao vinculá-la à proteção à criança, ela falsamente confunde homossexualidade com pedofilia.
O governo da Hungria argumenta que suas políticas são projetadas para proteger as crianças da “propaganda sexual”.
Orbán tenta distrair o eleitorado?
Os métodos da Hungria se assemelham às táticas de Putin, que em dezembro de 2022 expandiu a proibição da Rússia de “propaganda de relações sexuais não tradicionais” de menores para adultos, efetivamente proibindo qualquer endosso público de atividades LGBTQ+.
Orbán, no poder desde 2010, enfrenta um desafio sem precedentes de um partido de oposição em ascensão enquanto a economia da Hungria luta para emergir de uma crise de inflação e custo de vida, com eleições marcadas para o ano que vem.
Tamás Dombos, coordenador de projetos do grupo húngaro de direitos LGBTQ+ Háttér Society, disse que o ataque de Orbán às minorias foi uma tática para distrair os eleitores de questões mais importantes que o país enfrenta. Ele afirmou que o uso de software de reconhecimento facial em manifestações proibidas poderia ser aplicado contra outros protestos que o governo escolhe considerar ilegais.
“É uma estratégia muito comum de governos autoritários não falar sobre os problemas reais que afetam as pessoas: a inflação, a economia, a péssima condição da educação e da assistência médica”, disse Dombos.
Orbán, ele continuou, “está conosco há 15 anos mentindo na cara das pessoas, deixando o país basicamente apodrecer, e então surge com essas campanhas de ódio.”
rc (AP, AFP)