19/05/2025 - 10:37
Com a mudança climática intensificando as secas e reduzindo as chuvas, cientistas preveem que o risco de incêndios florestais mais que dobrará até 2100.Numa única semana do outono europeu de 2024, incêndios devastaram mais de 100 mil hectares em Portugal – mais ou menos o equivalente à área da cidade do Rio de Janeiro. As nuvens de fumaça podiam ser vistas do espaço. Aquele foi um dos maiores incêndios florestais na Europa no ano passado, causando a morte de ao menos sete pessoas.
Incêndios dessa magnitude deverão ocorrer com mais frequência, afirmam cientistas da European Academies Science Advisory Council (Easac), uma associação de academias de ciências, num relatório publicado nesta segunda-feira (19/05). As causas são uma combinação de efeitos da mudança climática, urbanização, mudanças no uso da terra e disseminação de monoculturas.
“Muitas partes da Europa estão enfrentando um grande aumento nas secas plurianuais, levando a uma maior probabilidade de incêndios extremos”, diz Thomas Elmqvist, diretor de meio ambiente da Easac. Segundo ele, algumas áreas no sul da Europa provavelmente sofrerão eventos severos a cada dois anos.
Todos os anos, cerca de 60 mil incêndios florestais atingem a União Europeia (UE), causando 2 bilhões de euros em perdas econômicas, afirmam cientistas da Easac. Cada ano, os incêndios queimam uma área de meio milhão de hectares, ou quase o dobro do território de Luxemburgo.
O que favorece os incêndios
A Europa é o continente onde o aquecimento global é o mais acelerado, com as temperaturas aumentando duas vezes mais do que a média global nos últimos 30 anos. Elmqvist lembra que existe uma relação entre as mudanças climáticas e um risco maior de incêndios. Secas maiores e menos chuvas deverão dobrar esse risco até 2100.
Outro culpado é o aumento da urbanização. Além disso, terras agrícolas abandonadas com crescimento descontrolado da vegetação criam vastas áreas de biomassa inflamável, dizem os cientistas. Por fim, monoculturas extensivas de árvores coníferas, pinheiros e eucaliptos favorecem a propagação do fogo.
Na Alemanha, por exemplo, o maior risco está na parte nordeste do país, com suas grandes plantações de pinheiros.
Menos, mas mais intensos
Após dois anos monitorando os incêndios florestais, Elmqvist concluiu que o número de incêndios e a área total queimada até mesmo diminuíram na Europa porque a capacidade de combatê-los melhorou. Porém, os incêndios deverão se tornar maiores e mais graves, e Espanha, Portugal, Itália e Grécia serão os mais afetados.
Os países mediterrâneos estão mais bem preparados para enfrentar incêndios do que outros países europeus, diz a pesquisadora Claudia Berchtold, da Fundação alemã Fraunhofer. “Na Alemanha ou na Holanda, por exemplo, um incêndio relativamente pequeno encontraria um sistema que não está tão bem preparado”, diz.
Berchtold está analisando pesquisas como este novo estudo da Easac para formular uma estratégia europeia para lidar com incêndios florestais.
O estudo mostra que, na Europa, há mais que o dobro de áreas urbanas consideradas sob risco de incêndio do que na América do Norte e na Ásia. “Urbanizações foram feitas em plantações de pinheiros sem pensar no que acontece quando há grandes incêndios”, diz o ecologista Pierre Ibisch, um dos autores do estudo. “Isso é, claro, muito arriscado.”
Um exemplo é a pequena cidade de Borkenwalde, no estado alemão de Brandemburgo. Desde 2000, as pessoas estão construindo cada vez mais perto da floresta, mesmo após grandes incêndios levarem à evacuação de uma cidade próxima.
Restauração de ecossistemas
Problemas desse tipo poderiam ser evitados se planejadores urbanos, silvicultores e agricultores unissem forças, dizem os cientistas da Easac. Eles também dizem ser necessário elevar a conscientização e o debate público sobre os incêndios.
“As pessoas que vivem perto de florestas ou que se mudam para lá não sabem o quanto o fogo veio para ficar. Temos uma chance de reduzir os riscos por meio do gerenciamento da terra”, diz Ibisch.
Os especialistas também dizem que é fundamental implementar políticas como a Lei de Restauração da Natureza da UE de forma rápida e consistente, em especial para gerenciar florestas de forma sustentável e restaurar turfeiras, que armazenam muito carbono.
Outra sugestão é mapear as florestas digitalmente para permitir um melhor monitoramento. A inteligência artificial também pode ajudar a analisar imagens de incêndios florestais tiradas por drones ou a monitorar a rapidez com que vegetação inflamável volta a crescer em áreas de pastagem.