País festeja 80º aniversário do partido governante com a presença de líderes da China e da Rússia. Desfile sublinha crescente poder e importância internacional de Kim.Na noite desta sexta-feira (10/10), dezenas de milhares de soldados marcharão novamente por Pyongyang para exibir o vasto arsenal das Forças Armadas da Coreia do Norte.

O desfile celebrará o 80º aniversário de fundação do Partido dos Trabalhadores da Coreia (PTC), cujo secretário-geral é Kim Jong-un. Ao lado de Kim estarão o premiê chinês, Li Qiang, e o ex-presidente russo Dmitri Medvedev. “Amigos estão juntos, inimigos estão ficando nervosos”, escreveu Medvedev no novo app de mensagens russo Max.

O desfile é uma demonstração do crescente poder de Kim, de 41 anos, que nunca esteve tão firme no comando do país ou foi internacionalmente tão importante desde que substituiu seu pai, Kim Jong-il, como líder supremo, há quase 14 anos.

Em setembro, Kim apareceu lado a lado com os presidentes chinês, Xi Jinping, e russo, Vladimir Putin, pela primeira vez, num desfile militar em Pequim. “Kim no mesmo nível dos autocratas mais poderosos do mundo: uma demonstração de vínculo estratégico como essa ainda não havia existido”, escreveu o jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung.

Catalisador foi a guerra da Ucrânia

O crescimento do poder de Kim se deve à guerra da Rússia contra a Ucrânia e à disputa econômica e de poder entre os EUA e a China. Isso fez da Coreia do Norte um parceiro importante, sobretudo para a Rússia, o que levou a China a se aproximar novamente de Pyongyang para evitar perder sua influência.

“O status da Coreia do Norte cresceu significativamente”, afirma o ex-diplomata e desertor norte-coreano Lee Il Kyu. “Nesse sentido, a decisão de apoiar a guerra russa foi acertada.”

Como resultado dessa mudança de cenário, Kim conseguiu afrouxar um pouco os efeitos das sanções econômicas impostas ao seu país pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas devido aos testes de bombas e mísseis nucleares. A Rússia está fornecendo combustível e alimentos à Coreia do Norte, entre outras coisas, e a Coreia do Norte enviou enormes quantidades de munições e milhares de soldados para lutar na guerra contra a Ucrânia. A China também parece ter relaxado a aplicação das sanções.

Potência nuclear

A estratégia de longo prazo de garantir a sobrevivência da sua família no poder por meio do desenvolvimento das capacidades nucleares do país se mostrou acertada para Kim. A Agência de Inteligência de Defesa (DIA) dos EUA estimou em maio que a Coreia do Norte está em sua posição estratégica mais forte em décadas e representa uma ameaça potencial às forças americanas e seus aliados na Ásia Oriental.

A Coreia do Norte também elevou sua capacidade de ameaçar o território americano. O relatório conclui que Kim está cada vez mais confiante em sua legitimidade política internacional e na segurança de seu regime.

O principal meio para elevar a importância internacional da Coreia do Norte é sua almejada ascensão ao grupo das potências nucleares de facto, ao lado de Paquistão, Índia e Israel. Para isso, Kim não se limita a testar mísseis de longo alcance. Uma lei aprovada em setembro de 2022 legalizou o uso preventivo de armas nucleares e declarou o status nuclear “irreversível”. Um ano depois, o parlamento norte-coreano incluiu a doutrina nuclear na Constituição, o que torna improvável um congelamento ou mesmo desmantelamento da capacidade de ataque nuclear do país.

Novo encontro com Trump?

O regime agora está colhendo os frutos dessa estratégia. Em julho, o ministro do Exterior da Rússia, Serguei Lavrov, declarou durante uma visita à Coreia do Norte que Moscou respeita e compreende a decisão de Pyongyang de continuar desenvolvendo seu programa nuclear.

A China oficialmente rejeita as armas nucleares norte-coreanas, mas há muito deixou de exigir a desnuclearização.

Agora, Kim espera que o presidente dos EUA, Donald Trump, finalmente rompa o banimento. Ele condicionou novas conversas com os EUA ao abandono da “absurda obsessão pela desnuclearização”. Especula-se que Trump possa se encontrar com Kim na linha de demarcação do paralelo 38, como fez em junho de 2019. O presidente dos EUA visitará a Coreia do Sul no fim de outubro e participará da cúpula da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec).

Com o desfile militar de aniversário, o Partido dos Trabalhadores da Coreia também celebra seu principal membro. Kim reavivou o partido como instrumento de poder e o moldou à sua vontade. Se seu pai, Kim Jong-il, nunca realizou um único congresso partidário, o jovem líder deixou uma marca pessoal no partido. O sétimo congresso, em 2016, reafirmou o “Kimilsungismo-Kimjongilismo”, uma síntese das ideias de Kim Il-sung e Kim Jong-il (avô e pai do atual líder), como princípio norteador e estipulou que o partido operasse “sob a liderança monolítica” do Comitê Central.

No oitavo congresso, em 2021, o PTC abandonou a doutrina de “militares em primeiro lugar” (Songun) de Kim Jong-il e estabeleceu a doutrina de “povo em primeiro lugar” como a nova forma fundamental do socialismo. Kim foi nomeado secretário-geral do Comitê Central, expandindo ainda mais seu poder.

Em setembro deste ano, Kim anunciou que o nono congresso apresentaria uma doutrina de desenvolvimento simultâneo de forças armadas nucleares e convencionais. Isso significa que os preparativos para o próximo congresso do partido, presumivelmente em 2026, já estão em andamento.

O próximo ano é também uma opção porque o antecessor do PTC, a União Abaixo o Imperialismo, foi fundado há cem anos, em outubro de 1926, supostamente por Kim Il-sung, depois de ele e seus pais terem se exilado na China. Kim Il-sung tinha então 14 anos.