22/08/2025 - 13:43
Segundo relatos da imprensa do México, narcotraficantes podem ter enviado alguns de seus membros como mercenários para treinar o uso de drones. Especialistas divergem sobre a plausibilidade.A mídia do México vem publicando relatos da possível presença de membros de cartéis de tráfico de drogas na frente de batalha na Ucrânia, onde teriam se alistado como mercenários com o objetivo de obter treinamento no uso de drones.
A informação veio do site francês Intelligence Online, especializado na cobertura de agências de inteligência, que cita, como fonte principal, um relatório do Centro Nacional de Inteligência (CNI) do México que teria sido enviado aos serviços secretos ucranianos.
A DW tentou confirmar a existência desse relatório e seu conteúdo, mas não obteve uma resposta do CNI até a publicação deste texto. No entanto, isso parece plausível, segundo Manuel Morato, presidente do Instituto de Debate e Análise de Políticas de Segurança, sediado em Madri.
“Sem dúvida, é um bom lugar para aprender neste momento”, afirma Morato à DW. “A Ucrânia é um campo de manobras perfeito, onde há armas das mais sofisticadas e modernas, ao lado das mais econômicas.”
Juan Jaramillo, pesquisador do InSightCrime, sediado em Bogotá, concorda que “a Ucrânia se tornou um laboratório do uso de armas de diferentes tipos, não apenas drones”, mas expressa dúvidas sobre a presença de membros de cartéis mexicanos. “Eles não costumam se expor muito”, diz à DW.
Ele cita que, quando os cartéis começaram a treinar seus membros no uso de drones, levaram ao México ex-militares colombianos especialistas e equipamento, mas não se deslocaram. Por que iriam se arriscar a ir para um campo de batalha, questiona Jaramillo.
Apenas o ex-presidente russo Medvedev citou assunto
Há outros dois motivos que levam Jaramillo, que investigou de perto o uso de drones pelos cartéis, a mostrar cautela. “É muito importante ressaltar que não vimos, até o momento, uma sofisticação no uso de drones no México que nos leve a concluir que houve uma troca de conhecimento com a Ucrânia, onde estão sendo utilizadas tecnologias muito avançadas”, afirma.
Ele pontua que vários cartéis adotaram o uso de drones por meio do que chamam de “operadores de drones”, uma “divisão especializada que tem se mostrado bastante útil para eles”. “Por exemplo, dentro do Cartel Jalisco Nueva Generación, mas também as facções do Cartel de Sinaloa e da Família Michoacana estão usando-os”, embora sem ir além do uso dos drones para vigilância ou anexando-lhes de forma artesanal granadas ou pequenos explosivos, indica.
Além disso, destaca o especialista, “não há outra fonte que tenha confirmado isso, portanto, é muito difícil afirmar que isso, de fato, esteja acontecendo”.
A única fonte oficial que se referiu à possível presença de narcotraficantes mexicanos na linha de frente ucraniana foi o ex-presidente russo Dimitri Medvedev, atual vice-presidente do Conselho de Segurança da Rússia, que, em uma mensagem no Telegram, encorajou os americanos a irem lutar contra os cartéis de drogas na Ucrânia.
Morato, um coronel aposentado que foi adido militar em Moscou, afirma que “o fato de ele ter dito isso naquele momento, sem dúvida, faz parte da narrativa que interessa à Rússia”. Mesmo assim, ele considera provável que a informação tenha fundamento.
Medvedev, nas palavras de Morato, “é a pessoa com representação dentro da Rússia que mais ataca e diz coisas mais duras contra o Ocidente”. Não à toa, o presidente americano, Donald Trump, o chamou de “boca grande” após declarações em que ele se gabava do armamento nuclear da Rússia.
Jornalistas ucranianos da DW afirmam que é uma prática comum russa passar informações para um meio de comunicação pouco conhecido e depois citar a notícia e usá-la para divulgar suas mensagens.
Qual seria a utilidade para cartéis?
Várias fontes, incluindo jornalistas ucranianos da DW, afirmam que mercenários mexicanos combatem na frente ucraniana, embora não se trate de um grupo tão numeroso quanto o dos colombianos.
Não é de se estranhar que o site para se alistar na Legião Internacional da Ucrânia tenha uma versão em espanhol. “Um dos problemas mais graves do Exército da Ucrânia é justamente a escassez de ‘mão de obra’, para dizer de forma vulgar”, diz Morato, referindo-se às dificuldades no recrutamento de pessoal após mais de três anos de guerra.
Segundo ele, é possível que algum membro dos cartéis de droga mexicanos tenha se infiltrado. “Eles têm os contatos e a logística” para tentar, admite Jaramillo. Mas, por enquanto, não há informações que confirmem isso, conclui.
“Não descarto”, afirma o especialista em segurança mexicano Guillermo Valdés à DW, embora considere mais provável que os mexicanos suspeitos na frente da Ucrânia pertençam a alguma empresa de segurança privada que possa querer se capacitar no uso de drones.
E questiona: “Para que tipo de operações os cartéis desejariam essa tecnologia de precisão muito maior?”. Valdés, que já foi diretor do serviço secreto mexicano, então chamado Centro de Investigação e Segurança Nacional, afirma que “devido à forma rudimentar das operações em que se envolvem, que buscam causar o maior dano possível, eles não precisam de tecnologia muito sofisticada”.
“Eles poderiam estar pensando em fazer outro tipo de operação muito mais sofisticada e de maior impacto, não descarto essa possibilidade, mas não é o que temos visto”, acrescenta. “Se forem os cartéis, então estão pensando em operações muito mais sofisticadas e cirúrgicas para dar golpes mais estratégicos”, dando como exemplo o uso de drones com reconhecimento facial para atacar o líder de um grupo rival.