04/09/2025 - 14:03
Cientistas afirmam que incêndios devastadores neste verão europeu foram 40 vezes mais prováveis devido ao aumento da temperatura global pela queima de combustíveis fósseis.Incêndios florestais intensos que devastaram grandes áreas da Espanha e Portugal neste verão europeu — ceifando pelo menos 8 vidas e forçando a evacuação de dezenas de milhares de pessoas — foram maciçamente alimentados pelas mudanças climáticas, afirma um novo relatório publicado nesta quinta-feira (04/09).
O documento afirma que as mudanças climáticas — impulsionadas principalmente pela queima de petróleo, gás e carvão — tornaram as condições climáticas que alimentaram os incêndios florestais 40 vezes mais frequentes e 30% mais intensas. A análise foi feita pela World Weather Attribution, um grupo de cientistas internacionais que estuda o papel do aquecimento global em eventos climáticos extremos.
A magnitude dos incêndios tem sido “assombrosa”, disse Clair Barnes, uma das autoras do relatório e pesquisadora do Centro de Política Ambiental do Imperial College London. “Condições mais quentes, secas e inflamáveis estão se tornando mais severas com as mudanças climáticas e estão dando origem a incêndios de intensidade sem precedentes.”
Mudanças climáticas tornam incêndios mais frequentes e intensos
Os incêndios florestais, que começaram no final de julho e se estenderam por semanas, queimaram mais de 380 mil hectares na Espanha e 260 mil hectares em Portugal. Juntos, eles representaram dois terços das terras queimadas na Europa, que este ano quebraram recordes ao ultrapassar 1 milhão de hectares, uma área maior que a ilha de Chipre.
Embora os incêndios florestais sejam uma ocorrência anual natural, a seca intensa e o aumento das temperaturas estão criando um clima quente, seco e com muito vento, que os faz queimar mais rápido, por mais tempo e com mais ferocidade. Na Europa, assim como em todo o mundo, eles estão se tornando mais frequentes, intensos e disseminados.
A rápida análise examinou observações meteorológicas da região, incluindo os dez dias consecutivos mais quentes já registrados na Espanha e que antecederam os incêndios. A conclusão foi que as mudanças climáticas tornaram a onda de calor espanhola 3 graus Celsius mais quente e 200 vezes mais provável de ocorrer.
Em um mundo sem mudanças climáticas, ondas de calor de intensidade semelhante seriam esperadas com menos frequência, mais ou menos a cada 2.500 anos. Hoje, porém — com os níveis atuais de aquecimento de 1,3°C —, elas são esperadas a cada 13 anos, afirmam os cientistas.
Incêndios mais difíceis de combater
Neste verão do hemisfério norte, a Espanha fez seu primeiro pedido de apoio internacional para ajudar a combater incêndios florestais. O Mecanismo Europeu de Proteção Civil, um sistema criado pela UE para fornecer resposta a desastres aos Estados-membros, também foi contatado pela Grécia, Bulgária, Albânia e Montenegro para obter ajuda no combate a incêndios.
“Os incêndios florestais estão atingindo novos extremos na Espanha e em Portugal”, disse Theodore Keeping, um dos autores do relatório e pesquisador do Centro de Política Ambiental do Imperial College London. “Cada vez mais, bombeiros trabalham em condições caóticas e imprevisíveis, combatendo incêndios que se comportam de maneiras nunca vistas antes.”
Keeping apontou ainda que incêndios florestais intensos podem criar seus próprios ventos, que espalham chamas mais longas e podem causar brasas voadoras que, por sua vez, acabam provocando novos incêndios nas proximidades.
O terreno íngreme que caracteriza o norte de Portugal e a região noroeste da Galícia, na Espanha, onde os incêndios estavam concentrados, tornou o combate ainda mais difícil, disse Ricardo Trigo, um dos autores do relatório e professor associado do Departamento de Geofísica, Engenharia Geográfica e Energia da Universidade de Lisboa.
Gestão de florestas é fundamental na prevenção
Keeping acrescenta que essas áreas estão entre as mais propensas a incêndios florestais na Europa, pois recebem quantidades significativas de chuva entre outubro e março — permitindo o crescimento de muita vegetação, que então se transforma em combustível durante os verões secos e quentes.
O relatório enfatiza a importância do controle da vegetação em áreas regularmente impactadas por incêndios florestais, destacando como o movimento de populações do campo para áreas urbanas deixou muitas florestas e fazendas sem manejo adequado e cobertas de vegetação seca.
Com os recursos de combate a incêndios esgotados, especialistas argumentam que o foco precisa mudar para medidas de prevenção, como o manejo sustentável da terra e a melhoria da resiliência das florestas.
Métodos para isso incluem o desbaste e o espaçamento adequado das árvores e a redução da vegetação rasteira por meio de queimadas controladas. Outras alternativas incluem a introdução de mais animais de pasto, como gado e cabras, que comem os arbustos secos que servem de combustível para as chamas.
Abandonar as monoculturas e introduzir aceiros ou zonas de proteção contra incêndios também pode ajudar.
Abandonar combustíveis fósseis é necessidade urgente
Até agora, neste ano, os incêndios florestais na UE liberaram 38 milhões de toneladas de dióxido de carbono, o principal gás de efeito estufa responsável pelo aquecimento do planeta. Isso coloca o continente no caminho para quebrar recordes de emissão de CO2 em 2025.
A fumaça dos incêndios florestais também impacta significativamente a saúde, com partículas emitidas capazes de entrar nos pulmões e na corrente sanguínea. Estudos recentes relacionaram a fumaça dos incêndios florestais a 1,53 milhão de mortes por ano em todo o mundo.
Especialistas no relatório alertam ainda que os incêndios na Espanha e em Portugal são um sinal do que está por vir diante do aumento contínuo das temperaturas. Eles enfatizam, portanto, a urgência de interromper a queima de combustíveis fósseis.
“Os incêndios florestais na Europa mostram que 1,3°C de aquecimento hoje já é incrivelmente perigoso”, disse Friederike Otto, uma das autoras do relatório e professora de ciência climática no Centro de Política Ambiental do Imperial College London. “Sem uma transição mais rápida para o abandono dos combustíveis fósseis, podemos atingir 3 graus Celsius neste século. Incêndios florestais nesse nível seriam catastróficos.”