A música eletrônica é um desses gêneros sobre os quais as pessoas respondem “tudo menos isso”. Se perguntar a alguém de que tipo de música ela gosta, muitas vezes a resposta é: “tudo menos sertanejo” ou “tudo menos música clássica”. Com freqüência também se ouve: “tudo menos música eletrônica”. Mas a pessoa pode não ter notado que ela já ouve música eletrônica frequentemente.

A música eletrônica ou electro é cercada de preconceitos: de que é monótona e unidimensional, muito fria ou algo que só pode ser apreciado sob efeito de álcool ou drogas em uma discoteca escura. Esses clichês são tão comuns como o de que esse gênero origina-se nos anos 80.

Mas a música eletrônica é muito mais abrangente e tem uma longa e diversificada história, explorada na exposição Electro. De Kraftwerk ao Techno, na cidade alemã de Düsseldorf, que incubou pioneiros do gênero como a banda Kraftwerk. A mostra mapeia os mais de 100 anos de história da música eletrônica, desde seus primórdios até composições por inteligência artificial.

Do Theremin ao Hammond

As primeiras experiências com geradores eletrônicos de som ocorreram em meados do século 19 e levaram ao desenvolvimento dos pianos eletromecânicos, que antecedem o teclado eletrônico.

Um dos mais famosos instrumentos eletrônicos pioneiros foi o eterofone, mais tarde batizado de Theremin em homenagem ao seu inventor, o russo Leon Theremin. Desenvolvido nos anos 20 em Leningrado, o som parece emergir como por magia. O aparelho tem duas antenas e um oscilador, e os movimentos das mãos interrompem as vibrações elétricas, modulando o som.

Logo depois, Friedrich Trautwein criou o trautônio, um precursor do sintetizador eletrônico, tocado aqui com um fio em vez de teclas, que também foi essencial para a música eletrônica.

Também foi importante nessa fase inicial o órgão eletromecânico Hammond, desenvolvido em 1935 como alternativa a um órgão de igreja, que se tornou parte essencial do blues, do jazz e da música funk.

Do Krautrock ao dub

Enquanto nos Estados Unidos compositores como John Cage e Steve Reich estavam ampliando os limites do gênero, na Europa a música eletrônica do pós-guerra é associada ao nome de Karlheinz Stockhausen, um pioneiro em experimentações sonoras no Estúdio de Música Eletrônica em Colônia.

Influenciados pela New Music, muitos representantes do rock experimental e Krautrock também usaram elementos eletrônicos nos anos 60 e 70. Em seguida, bandas como The Who e depois Pink Floyd na Inglaterra usaram fitas reproduzidas na ordem inversa, sintetizadores e samples.

Nos anos 70, o bastão da música eletrônica foi passado para Düsseldorf, onde a banda Kraftwerk, em seu estúdio Kling-Klang, desenvolveu o som que moldou decisivamente a música eletrônica até os dias de hoje.

Enquanto o rock experimental e bandas de Krautrock como Can ou Neu! adicionaram teclados em seu monótono som motorik, foi o Kraftwerk que deu ao gênero popularidade e credibilidade mundial.

Artistas tão diversos como David Bowie, Afrika Bambaata, Joy Division, New Order, Depeche Mode e Blur foram inspirados pela banda eletrônica alemã, que o jornal The New York Times descreveu uma vez como “os Beatles da música eletrônica dançante”.

“Pense na banda como um técnico de laboratório sintetizando o DNA que forneceu o código para o rap, o disco, o electro-funk, a new wave, a industrial e o techno”, escreveu o jornal americano.

Os artistas franceses também foram centrais para a renascença da música eletrônica. Jean-Michel Jarre trouxe o sintetizador para o mainstream com álbuns revolucionários como Oxygène, antes que artistas parisienses como Laurent Garnier, Air e Daft Punk popularizassem o French house.

Enquanto isso, na Jamaica, produtores e músicos pioneiros como Lee “Scratch” Perry aplicaram efeitos eletrônicos a versões instrumentais de músicas reggae, inventando a música dub nesse processo.

Nos Estados Unidos, Detroit e Chicago desenvolveram cada uma as suas próprias variedades de música techno e house, que tiveram grande influência na crescente cultura da música eletrônica de dança (EDM) na Europa, e especialmente na capital do techno, Berlim, onde a Love Parade se tornou a maior festa EDM do mundo.

Sucessos populares e batidas de trip-hop

Inúmeros subgêneros de EDM, incluindo acid house, drum’n’bass, dubstep, trance e two-step definiram uma nova e crescente cultura mundial de rave nos anos 90.

Enquanto isso, as batidas de downtempo dub e as paisagens sonoras experimentais moldavam o novo som de trip hop que saiu de Bristol com bandas como Massive Attack e Portishead, e da dupla austríaca Kruder & Dorfmeister.

Por volta da virada do milênio, bandas britânicas como The Prodigy, Chemical Brothers e Radiohead combinaram eletrônica e rock, enquanto a islandesa Björk e o artista americano Trent Reznor infundiram elementos indie e rock com batidas elétricas, sons de computador e sintetizadores.

E, em Berlim, Atari Teenage Riot e a cantora e compositora canadense Peaches construíram pontes entre a arte da performance, o punk e o techno.

Gênero musical sempre em evolução

De volta a Düsseldorf, onde bandas como Kraftwerk e Neu! tornaram a cidade sinônimo dos primórdios da música eletrônica, a exposição Electro. De Kraftwerk ao Techno presta agora tributo à ascensão de um fenômeno musical inovador.

As mais de 500 peças em exposição no Kunstpalast incluem instrumentos, geradores de som caseiros, fotografias, gravações de áudio, vídeos e peças de arte visual.

A exposição foi realizada pela primeira vez no Musée de la Musique, em Paris, e foi criada em estreita colaboração com o cofundador do Kraftwerk Ralf Hütter.

“Eletro. De Kraftwerk ao Techno”, no Kunstpalast em Düsseldorf até 15 de maio de 2022.