20/07/2022 - 12:04
O Museu de História Natural de Karlsruhe (SMNK), na Alemanha, será obrigado a devolver ao Brasil o fóssil do dinossauro Ubirajara jubatus, uma importante peça paleontológica encontrada no Ceará e retirada ilegalmente do país por pesquisadores estrangeiros em 1995.
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Após tensa disputa, a decisão foi tomada por autoridades do estado de Baden-Württemberg, onde Karlsruhe está localizada, atendendo a pedido da secretária estadual de Ciência, Pesquisa e Arte, Theresia Bauer.
Segundo Bauer, que é do Partido Verde, “as circunstâncias em torno da importação do fóssil não são claras, e há dúvidas sobre a legalidade da aquisição da propriedade pelo estado de Baden-Württemberg”, citou a imprensa local na terça-feira (19/07).
Dessa forma, o fóssil deve ser devolvido pelo museu de Karlsruhe ao Estado brasileiro, recomendou a Secretaria de Ciência ao gabinete estadual, que acatou o pedido. Quando e como a devolução ocorrerá ainda está sendo negociado com as autoridades brasileiras.
Agora, o museu também será obrigado a verificar se sua coleção contém outros objetos adquiridos em circunstâncias pouco claras.
O Ubirajara jubatus viveu no período Cretáceo, cerca de 110 a 115 milhões de anos atrás. Carnívoro e com apenas cerca de um metro de altura, é considerado o primeiro dinossauro não voador com penas encontrado na América Latina.
O imbróglio
A disputa começou depois que a espécie foi apresentada num artigo científico pela primeira vez em 2020, na revista especializada Cretaceous Research. Cientistas brasileiros alegaram que o fóssil não fora exportado legalmente e iniciaram uma campanha para ele ser devolvido ao Brasil. O artigo na Cretaceous Research chegou a ser retirado temporariamente do ar.
Em seguida, outros artigos críticos foram publicados em revistas internacionais, como National Geographic e Science, também contestando a exportação do fóssil.
O museu de Karlsruhe, por sua vez, vinha negando devolver o fóssil, argumentando que ele chegara ao país antes da entrada em vigor da disposição que estabelece a devolução dos artefatos e que, por isso, seria legalmente propriedade de Baden-Württemberg.
“Ele foi adquirido antes da entrada em vigor da Convenção da Unesco sobre os Meios de Proibir e Prevenir a Importação, Exportação e Transferência Ilícita de Propriedade de Bens Culturais, e foi importado em conformidade com todas as regulamentações alfandegárias e de entrada”, argumentava o governo de Baden-Württemberg em 2021.
Embora a convenção da Unesco seja da década de 1970, uma lei da Alemanha de 2016 determina que todo material importado antes de 26 de abril de 2007 é considerado como legalizado no país.
A posição da instituição alemã irritou a comunidade paleontológica brasileira e repercutiu nas redes sociais. Foram lançadas na internet campanhas pedindo o retorno do fóssil e acusando os alemães de desrespeitarem as leis internacionais e a legislação brasileira.
Artes e hashtags foram compartilhadas em diferentes idiomas. A UbirajarabelongstoBR (“Ubirajara pertence ao Brasil”) foi usada por perfis estrangeiros que apoiam a causa.
Transferência para a Alemanha
O fóssil foi encontrado em uma pedreira na região da Bacia do Araripe, entre os municípios de Nova Olinda e Santana do Cariri, no Ceará, e transportado para a Alemanha em 1995 para a realização de um artigo de uma revista científica.
Segundo o estudo publicado, a autorização para essa transferência foi concedida pelo escritório regional do antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), atual Agência Nacional de Mineração (ANM). Mas o documento que autorizou a retirada usa uma linguagem genérica, falando apenas de “caixas com fósseis”, com assinatura de um funcionário condenado por fraudar laudos para a extração de esmeraldas.
Após apurações sobre a suposta autorização, o Ministério Público Federal (MPF) encontrou versões conflitantes entre o que dizia o museu e os servidores envolvidos no caso. A Sociedade Brasileira de Paleontologia (SBP) também afirma que, de acordo com a legislação brasileira, seria necessário um aval do Ministério da Ciência para autorizar o transporte para fora do país.
Desde 1942, fósseis são considerados patrimônio nacional no Brasil. É proibido vendê-los e é obrigatório ter uma autorização para retirá-los do país. Além disso, uma portaria do Ministério da Ciência, de 1990, proíbe a saída do território nacional de holótipos – exemplares usados como referência na descrição das espécies –, como é o caso do fóssil do Ubirajara.
ek/av (EPD, DPA, ots)