22/01/2022 - 6:58
As estatísticas são sombrias: a Bulgária tem a maior taxa de mortalidade por covid-19 da União Europeia (EU) por milhão de habitantes. No entanto, a maioria dos búlgaros ainda não está disposta a se vacinar contra o coronavírus.
O país tem a menor taxa de imunização da UE. Estima-se que pouco menos de 29% da população esteja totalmente vacinada. Além disso, há manifestações antivacinas constantes. O país do sudeste europeu parece estar perdendo a batalha contra a covid-19.
No dia 12 de janeiro, centenas de cidadãos se reuniram na praça em frente ao parlamento búlgaro na capital, Sófia, para protestar contra o chamado “passaporte verde”. Introduzido na Bulgária em outubro de 2021, o documento comprova se a pessoa está vacinada contra covid-19, recuperada da doença ou se tem um teste negativo recente.
O passaporte é exigido para entrar em restaurantes, bares e shoppings. Muitos também precisam do documento para trabalhar.
No protesto, uma manifestante fez um discurso que viralizou na internet e nas redes sociais. “Não direi meu nome, caso contrário, aqueles que se sentam no parlamento me perseguirão”, gritou. “Estudei biologia por seis anos, então sei que as vacinas contra o coronavírus não são vacinas! São coquetéis experimentais que contêm um chip e coisas que destroem nossa liberdade. São controladas por sistemas 5G. Ninguém deve ser vacinado!”
Como a maioria dos manifestantes, a mulher é apoiadora do Vazrazhdane (Renascimento), um partido nacionalista cético em relação à covid-19 que chegou ao parlamento búlgaro pela primeira vez nas eleições de novembro passado, com quase 5% dos votos.
Sistema de saúde sob extrema pressão
O matemático Petar Velkov participa frequentemente de debates na TV com membros de Vazrazhdane e outros negacionistas da pandemia e céticos das vacinas. Ele tenta convencer seus compatriotas sobre a necessidade da imunização. É uma tarefa difícil.
“Em outros países, as medidas de vacinação e proteção contra a nova onda deram aos profissionais de saúde uma pausa muito necessária, com hospitalizações e mortes permanecendo em um nível relativamente baixo. Não foi o caso da Bulgária”, disse Velkov à DW.
Ele explica que a nova onda da variante ômicron está atingindo o país em um momento em que o sistema de saúde já está sob extrema pressão.
“Na Bulgária, quando a nova onda começou, estávamos vendo cerca de cinco a seis vezes mais hospitalizações do que no início das ondas anteriores. É por isso que as unidades de terapia intensiva já enfrentam problemas”.
Parlamentares antivacinas recebem doses
Apesar dos níveis recordes de infecção atuais e da alta taxa de mortalidade, muitos búlgaros ainda acreditam que a vacina contra covid-19 é mais perigosa do que a própria doença. “Menos de 30% dos adultos na Bulgária estão vacinados”, disse Dimitar Ganev, pesquisador de opinião do instituto de pesquisa Trend. “Há 20% que não estão vacinados, mas pretendem tomar a vacina. E cerca de 50% se opõem à vacinação”.
O Vazrazhdane se beneficia desse ceticismo. “Quase 70% dos búlgaros também se opõem ao passaporte verde”, explica Ganev. “A campanha contra o passaporte de vacinação permitiu que Vazrazhdane entrasse no parlamento”.
O partido eurocético e pró-Kremlin foi fundado em 2014, mas até recentemente nunca havia conseguido superar a barreira dos 4%. A esmagadora maioria das pesquisas realizadas antes das eleições de novembro de 2021 não previu sua entrada no parlamento.
Durante os protestos de 12 de janeiro, os deputados do Vazrazhdane tentaram permitir a entrada dos manifestantes antivacinas no Parlamento. No entanto, apenas alguns dias antes, uma investigação jornalística revelou que um terço dos parlamentares do Vazrazhdane estavam, de fato, vacinados. O líder do partido, Kostadin Kostadinov, descreveu repetidamente a vacina como um “líquido experimental”. Agora, porém, ele está recuando, dizendo que apoia a liberdade de escolha pela vacinação – inclusive para membros de seu partido.
Razões históricas e má educação
“Houve muito ceticismo entre a população búlgara desde o início da pandemia e quando as primeiras vacinas chegaram”, diz Ganev.
Ele acredita que isso pode ser explicado, pelo menos em parte, por fatores históricos. “Como parte do Império Otomano, a Bulgária perdeu o Iluminismo nos séculos 18 e 19. Neste país, o poder sempre foi percebido como algo estrangeiro. Historicamente, mantivemos distância do respectivo poder por muito tempo, mesmo sob o regime comunista”. E o poder, de acordo com Ganev, também inclui medicina e ciência para muitas pessoas.
Além disso, “muitos estudos mostraram que o analfabetismo funcional é muito difundido na Bulgária”, diz Velkov.
“Se uma pessoa não consegue processar as informações disponíveis, não pode avaliar o risco. Ela também não consegue avaliar o risco de efeitos colaterais da vacina em comparação com o risco de adoecer de covid-19”, explica Velkov.
O matemático cita vários fatores: educação precária, desconfiança no governo, disseminação de teorias da conspiração, até mesmo por médicos. Tudo isso alimenta os temores dos búlgaros, afirma.
Onda deve atingir pico em fevereiro
Para acalmar o debate público, o novo primeiro-ministro búlgaro, Kiril Petkov, nomeou um grupo de trabalho para discutir medidas anticovid. Representantes de Vazrazhdane também foram convidados a participar.
Para incentivar a população idosa a se vacinar, o governo paga 75 leva (cerca de R$ 235) a cada aposentado que se imunize. No entanto, parece que o país está lutando uma batalha perdida.
“A ômicron é altamente infecciosa. Após a primeira dose, você tem que esperar 20 dias antes de administrar a segunda. Depois, leva mais 14 dias para a pessoa desenvolver imunidade estável e ser capaz de resistir ao vírus. Mas se a ômicron for dominante, o número de pessoas infectadas dobrará a cada dois a cinco dias”, prevê Velkov.
“Isso significa que provavelmente veremos o pico da onda [da ômicron] no início de fevereiro. Portanto, não há tempo para qualquer campanha de vacinação ter efeito sobre essa onda. Uma grande parte da população búlgara será infectada com o vírus”, lamenta.