Os cigarros eletrônicos – usados ​​regularmente nos Estados Unidos por mais de 10% dos adolescentes e mais de 3% dos adultos (no Brasil, seu uso é proibido pela Anvisa) – foram apresentados inicialmente como uma alternativa saudável aos cigarros de tabaco. Mas a pesquisa vincula cada vez mais o uso de cigarros eletrônicos, ou vaping, a muitas das mesmas doenças fatais que afligem os fumantes convencionais.

Pesquisadores da Escola de Medicina Keck da Universidade do Sul da Califórnia (EUA) analisaram células epiteliais retiradas da boca de vapers (usuários de cigarros eletrônicos), fumantes e pessoas que nunca fumaram ou vaporizaram. Eles descobriram que vapers e fumantes tinham níveis semelhantes de danos ao DNA – mais do que o dobro da quantidade encontrada em não usuários. O dano ao DNA foi maior entre aqueles que vaporizaram ou fumaram com mais frequência. Também foi maior em vapers que usaram aparelhos dos tipos pods e mods, bem como dispositivos com sabor doce, fruta ou menta.

Distinção clara

“Pela primeira vez, mostramos que quanto mais vapers usavam cigarros eletrônicos, e quanto mais tempo os usavam, mais danos ao DNA ocorriam em suas células orais”, disse o dr. Ahmad Besaratinia, professor de pesquisa populacional e ciências da saúde pública na Escola de Medicina Keck e autor sênior do estudo. “O mesmo padrão se manteve em fumantes.”

O dano ao DNA das células epiteliais orais, que revestem a boca, é uma alteração precoce associada a um risco aumentado de muitos tipos de doenças crônicas, incluindo câncer e doenças inflamatórias.

A pesquisa, publicada na revista Nicotine & Tobacco Research, é a primeira a distinguir claramente entre os danos ao DNA que ocorrem em vapers exclusivos versus fumantes e a fornecer detalhes sobre os riscos que os vapers enfrentam com base na frequência com que vaporizam e em quais dispositivos e sabores eles usam. Os vapers são difíceis de estudar porque normalmente têm um histórico de tabagismo ou são usuários duplos, que vaporizam e fumam cigarros de tabaco.

Alterações biológicas

“Projetamos nosso estudo para descobrir os efeitos do vaping em usuários de cigarros eletrônicos que não eram fumantes nem usuários duplos em qualquer momento de suas vidas”, disse Besaratinia.

O novo estudo se baseia em pesquisas anteriores de Besaratinia e sua equipe, que mostraram que o vaping está ligado a alterações na expressão gênica, alterações epigenéticas e outras mudanças biológicas implicadas no desenvolvimento da doença.

“Os dispositivos e sabores mais populares e altamente consumidos por vapers jovens, assim como adultos, são os que estão associados a mais danos ao DNA”, disse Besaratinia. “Claramente, esses resultados têm implicações significativas, tanto para a saúde pública quanto para as agências reguladoras.”

Mais uso, mais danos

Os pesquisadores recrutaram 72 adultos saudáveis ​​e os dividiram em três grupos, pareados por idade, raça e sexo: vapers atuais (que nunca fumaram), fumantes atuais (que nunca fumaram) e pessoas sem histórico de fumar ou usar cigarros eletrônicos. Eles verificaram o histórico de cada participante usando questionários detalhados, entrevistas e testes bioquímicos para garantir que quaisquer efeitos observados pudessem estar diretamente ligados ao vaping ou ao fumo.

Besaratinia e sua equipe também coletaram dados sobre com que frequência e por quanto tempo os participantes fumaram ou vaporizaram e, no caso de vaping, quais dispositivos e sabores eles usaram. Em seguida, eles coletaram uma amostra de células epiteliais da boca de cada participante e testaram danos a genes específicos conhecidos por indicar agressão ao genoma.

Os testes mostraram níveis semelhantes de danos ao DNA entre vapers e fumantes: 2,6 vezes e 2,2 vezes mais que os não usuários, respectivamente. Em termos de dispositivos, os vapers que usaram pods tiveram os níveis mais altos de danos ao DNA, seguidos pelos que usaram mods. Em termos de sabores, os vapes com sabor doce foram associados aos níveis mais altos de danos ao DNA, seguidos pelos vapes com sabor de menta/mentol e frutas.

Popular, mas prejudicial

As descobertas são altamente relevantes para agências de saúde pública e reguladores que visam manter produtos perigosos longe de grupos vulneráveis, incluindo crianças e adolescentes, disse Besaratinia. Os produtos mais populares, incluindo vapes com sabor – que são usados ​​por cerca de 85% dos adolescentes que vaporizam – também parecem ser os mais prejudiciais, em termos de produção de danos ao DNA.

A próxima tarefa da equipe é replicar as descobertas em um grupo maior de participantes. Eles também planejam estudar outros efeitos biológicos resultantes de danos no DNA que estão ainda mais relacionados ao aparecimento de doenças crônicas.