14/10/2022 - 8:00
Em outubro de 2018, uma pequena estrela foi dilacerada ao vagar muito perto de um buraco negro em uma galáxia localizada a 665 milhões de anos-luz da Terra. O fenômeno não surpreendeu os astrônomos, que vez por outra observam esses incidentes violentos ao examinar o céu noturno. Quase três anos após a destruição, porém, o mesmo buraco negro está iluminando os céus novamente, e sem engolir nada de novo, dizem os cientistas.
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“Isso nos pegou completamente de surpresa – ninguém nunca viu nada assim antes”, disse Yvette Cendes, pesquisadora associada do Centro de Astrofísica | Harvard & Smithsonian (CfA, dos EUA) e autora principal de um novo estudo analisando o fenômeno. O trabalho foi publicado na revista The Astrophysical Journal.
De acordo com a equipe de pesquisadores, o buraco negro está agora ejetando material que viaja à metade da velocidade da luz, mas não sabe ao certo por que o fluxo foi atrasado em vários anos. Os resultados podem ajudar os cientistas a entender melhor o comportamento alimentar dos buracos negros, que Cendes compara a “arrotar” após uma refeição.
Reanimação misteriosa
A equipe detectou a explosão ao revisitar os eventos de ruptura de marés (TDEs, na sigla em inglês) – quando estrelas são “espaguetificadas” por buracos negros – que ocorreram nos últimos anos.
Dados de rádio do Very Large Array (VLA) no Novo México (EUA) mostraram que o buraco negro aparecia misteriosamente reanimado em junho de 2021. Cendes e a equipe se apressaram então para examinar o evento mais de perto.
“Solicitamos o Tempo Discricionário do Diretor em vários telescópios, que é quando você encontra algo tão inesperado que mal pode esperar pelo ciclo normal de propostas de telescópios para observá-lo”, explicou Cendes. “Todos os pedidos foram imediatamente aceitos.”
A equipe coletou observações do TDE, denominado AT2018hyz, em vários comprimentos de onda de luz usando o VLA, o Observatório ALMA, no deserto chileno do Atacama, o MeerKAT, na África do Sul, o Australian Telescope Compact Array e dois observatórios no espaço, o Chandra X-Ray Observatory e o Neil Gehrels Swift Observatory.
Intervalo inédito
As observações de rádio do TDE provaram ser as mais impressionantes. “Estudamos TDEs com radiotelescópios há mais de uma década, e às vezes descobrimos que eles brilham em ondas de rádio à medida que expelem material enquanto a estrela está sendo consumida pelo buraco negro”, disse Edo Berger, professor de astronomia na Universidade Harvard e no CfA, e coautor do novo estudo. “Mas no AT2018hyz houve silêncio de rádio nos primeiros três anos, e agora ele está dramaticamente iluminado para se tornar um dos TDEs mais luminosos de rádio já observados.”
De acordo com Sebastian Gomez, pós-doutorando no Space Telescope Science Institute (EUA) e coautor do novo artigo, o AT2018hyz não era digno de nota em 2018, quando o estudou pela primeira vez usando telescópios de luz visível. Gomez, que estava trabalhando em sua tese de doutorado com Berger na época, usou modelos teóricos para calcular que a estrela dilacerada pelo buraco negro tinha apenas um décimo da massa do nosso Sol. “Monitoramos o AT2018hyz em luz visível por vários meses até que ele desapareceu e depois o tiramos de nossas mentes”, disse Gomez.
Os TDEs são bem conhecidos por emitir luz quando ocorrem. À medida que uma estrela se aproxima de um buraco negro, as forças gravitacionais começam a esticar, ou “espaguetificar”, a estrela. O material alongado acaba por espiralar ao redor do buraco negro e se aquecer, criando um clarão perceptível a milhões de anos-luz de distância.
Digestão complicada
Algum material “espaguetificado” é ocasionalmente lançado de volta ao espaço. Os astrônomos o comparam a buracos negros sendo comedores desordenados – nem tudo o que eles tentam consumir chega à boca. Mas a emissão, conhecida como fluxo de saída, normalmente se desenvolve rapidamente após a ocorrência de um TDE – não anos depois. “É como se esse buraco negro tivesse começado a expelir abruptamente um monte de material da estrela que comeu anos atrás”, explicou Cendes.
No atual caso, os arrotos podem ser classificados como retumbantes. A saída de material está viajando à metade da velocidade da luz. Em comparação, a maioria dos TDEs tem um fluxo de saída que viaja a 10% da velocidade da luz, disse Cendes.
“Esta é a primeira vez que testemunhamos um atraso tão longo entre a alimentação e a saída”, afirmou Berger. “O próximo passo é explorar se isso realmente acontece com mais regularidade e simplesmente não estamos analisando os TDEs muito tarde em sua evolução.”