22/11/2022 - 12:48
País-sede do Mundial de 2022 é acusado de pagar voos e hotéis a torcedores para garantir clima de festa nas ruas e posts positivos nas redes sociais. A DW checou os fatos.Alegação: “Catar compra torcedores da Copa!” foi a manchete do jornal alemão Bild, relatando que torcedores internacionais foram convidados pelo emirado com uma “viagem gratuita para a Copa do Mundo de futebol”. Outros meios de comunicação internacionais relataram o mesmo. A emissora holandesa NOS afirmou que torcedores ganharam voos e hotéis em troca de postagens nas redes sociais.
Checagem pela DW: Verdadeiro.
O Catar convidou torcedores de futebol internacionais para a Copa e pagou seus voos, hotéis e despesas de acomodação. Questionado pela DW, o Comitê Supremo (SC), responsável pela organização da Copa do Mundo, confirmou isso. O programa Fan Leader Network é voltado para “torcedores apaixonados por futebol” que devem “compartilhar informações importantes sobre a Copa do Mundo com seus amigos”.
Segundo informações da plataforma theleader.com, o programa deve abranger até 1.600 torcedores do mundo todo. O SC nega as alegações de que os torcedores estejam sendo pagos em troca de “promoção coordenada para a Copa do Mundo”. “Esta alegação é absolutamente falsa”, disse em um comunicado.
Mas fato é que o Comitê Supremo do Catar espera exatamente isso dos torcedores em um contrato de publicidade. A DW teve acesso a esse “Código de Conduta”, publicado pela primeira vez pela emissora holandesa NOS. Nele consta que os torcedores se comprometem contratualmente a “apoiar” a Copa do Mundo no Catar “curtindo e compartilhando” postagens nas redes sociais, usando a hashtag #IAMAFAN e marcando o canal Roadto2022.
O Catar também avisa os torcedores participantes que suas postagens serão “monitoradas”. O emirado pode exigir que os torcedores excluam publicações que violem o Código de Conduta. E “depreciar” a Copa do Mundo ou o Comitê Supremo do Catar “obviamente não seria apropriado”.
Essas demandas aos torcedores estão diretamente relacionadas aos benefícios monetários, ou seja, passagens aéreas gratuitas, hospedagem em hotéis e ingressos para jogos, bem como uma quantia em dinheiro paga, pois são fixados contratualmente. Portanto, isso pode definitivamente ser visto como uma contrapartida para a promoção da Copa do Mundo nas redes sociais. E os organizadores do Mundial escrevem em seu próprio site: “A Fan Leader Network desempenha um papel fundamental na promoção da Copa do Mundo da Fifa 2022 no Catar.”
Torcedores participantes confirmaram à DW a oferta do Catar. “A oferta incluía a passagem de avião, o hotel e um ingresso para o jogo de abertura”, diz Joseph Delage, torcedor da França. “Mas seria preciso ficar durante toda a primeira rodada. A ideia também era que se participasse de atividades culturais e esportivas.” Delage, no entanto, recusou a oferta e acredita que o programa visa comprar torcedores para terem uma atitude positiva em relação ao país-sede.
Lee Kormish, do Canadá, aceitou a oferta e viajou para o Catar. Ele diz que não recebeu um código de conduta do Catar, mas confirmou à DW que, além dos voos, hotel e ingresso gratuito para o jogo de abertura, recebe uma “diária de refeição”. Em seu videoblog, ele relata suas experiências aparentemente positivas no Catar.
Migrantes pagos para desfiles organizados?
Alegação: Vídeos de “desfiles de torcedores” por Doha também circulam desde meados de novembro. Nas imagens podem ser vistos apoiadores de várias nações participantes da Copa. No entanto, vários usuários de redes sociais duvidam de sua autenticidade. “O Catar comprou torcedores falsos porque ninguém quer ir para lá”, escreve um usuário, e outro diz: “Ok, eles compraram 'torcedores'.”
Checagem pela DW: Não comprovado.
Não encontramos nenhuma evidência de que torcedores apresentados nos vídeos tenham sido pagos para participar de desfiles.
Fato é que milhares de supostos torcedores das nações participantes desfilaram por Doha no dia 11 de novembro, passando pelo Palácio Real, entre outros locais. De acordo com nossas informações, a maioria deles são trabalhadores estrangeiros e muitos vêm da Índia.
Um deles foi Rashiq, que vestindo a camisa da Inglaterra disse à agência de notícias AFP: “Sou da Índia. Trabalho no Catar há nove anos. Adoro o futebol inglês, por isso torço pela Inglaterra. Somos todos de Kerala, na Índia.”
De acordo com informações da agência de notícias AFP, a marcha dos torcedores foi comunicada à polícia com antecedência e esta permaneceu à distância − ao contrário do que é comum em casos de aglomerações no Catar. Muitos dos participantes são trabalhadores migrantes, confirmou um organizador à AFP. O Catar ofereceu aos trabalhadores estrangeiros no país ingressos com grandes descontos para os jogos da Copa, por dez dólares.
A DW entrou em contato com envolvidos na organização da marcha de torcedores, mas não obteve resposta.