14/11/2025 - 13:37
Professores de ciência driblam a indústria de combustíveis fósseis e o próprio governo de Donald Trump para refutar desinformação climática e orientar as próximas gerações sobre como proteger o planeta.Como ensinar crianças e adolescentes sobre ciência e mudanças climáticas em tempos de governo negacionista e um lobby dos combustíveis fósseis onipresente? O professor de ensino médio Jeff Grant tem buscado encarar essa questão em sua rotina em sala de aula.
Como leitor ávido de revistas e livros científicos, e alguém que passa muito tempo ao ar livre, ele tem uma compreensão clara de como o aumento das temperaturas está afetando o planeta.
“É algo que, na última década, tenho visto os efeitos pessoalmente”, diz, citando mudanças que ele acompanhou desde a infância em paisagens aquáticas, florestais e de pradarias. Ele então passou a “incorporar” suas experiências em torno das mudanças climáticas em suas aulas.
Apesar da resistência de alguns setores, essa abordagem na sala de aula é, de forma geral, bem-vinda. Uma pesquisa da Universidade de Yale mostrou que três quartos dos adultos nos Estados Unidos dizem que querem que as escolas ensinem as causas, consequências e possíveis soluções para o aquecimento global.
“Os alunos de hoje são os consumidores, trabalhadores e eleitores de amanhã, e eles enfrentarão uma série de desafios devido às perturbações causadas pelas mudanças climáticas”, disse Glenn Branch, vice-diretor do Centro Nacional para a Educação Científica (NCSE, na sigla em inglês), uma organização sem fins lucrativos. E para lidar com esses desafios, eles precisarão de “pelo menos um entendimento básico das mudanças climáticas, seus impactos e soluções”, defende.
Cada lugar, um currículo escolar
O NCSE é um dos vários órgãos que trabalham para garantir que os alunos de todo o país recebam informações climáticas precisas. Mas a natureza descentralizada do sistema educacional dos EUA significa que as decisões curriculares são tomadas por cada distrito escolar. E com mais de 13 mil deles em todo o país, a margem de variação é enorme.
Os professores nos EUA podem consultar algumas diretrizes para o ensino de ciências, chamadas de Padrões de Ciência da Próxima Geração, mas essas orientações não são obrigatórias e, segundo Grant, não vão fundo no tema das mudanças climáticas.
“Nem todos os estados têm isso como parte de seu currículo”, explica. Mesmo que tenham, não oferecem planos de aula, acrescenta.
“Cabe aos professores ou aos distritos escolares desenvolver essas questões ou encontrar meios que os ajudem nessa apresentação para as crianças.”
E isso é um problema, já que muitos educadores nunca aprenderam sobre mudanças climáticas. Eles se deparam com um grande volume de material para destrinchar e com interesses conflitantes de grupos poderosos que tentam levar suas próprias agendas para as salas de aula.
Lobby dos combustíveis fósseis na sala de aula
Branch fala de “tentativas sistemáticas de fornecer aos professores informações erradas sobre as mudanças climáticas, na esperança de que eles as transmitam aos alunos”, com material proveniente de think tanks “fortemente motivados ideologicamente” que negam as mudanças climáticas, como o Heartland Institute, e da própria indústria de combustíveis fósseis.
Grupos como o Conselho de Recursos Energéticos de Oklahoma (OERB), uma agência estadual privatizada, atuam em vários estados americanos, sempre com um braço educacional. “Esse material é menos evidente”, disse Branch. “Mas ainda assim pode ter uma influência distorcida.”
No caso do OERB, o material inclui uma série de livros ilustrados em que o protagonista “Petro Pete” elogia a dependência humana dos combustíveis fósseis. A agência também oferece workshops e currículos que fornecem informações sobre a indústria de petróleo e gás. Os educadores que se inscrevem são recompensados com créditos de desenvolvimento profissional, bolsas e excursões escolares.
Melissa Lau, que leciona ciências em seu estado natal, Oklahoma, disse que essas ofertas miram professores que não sabem o suficiente sobre mudanças climáticas.
“Isso é muito atraente de várias maneiras. Se um professor pensa: ‘isso parece legítimo…’, quero dizer, não há nada de errado com a ciência. Só dá a impressão de ‘veja como a indústria de combustíveis fósseis é boa’. Isso minimiza o impacto.”
A OERB não respondeu a um pedido da DW por mais informações.
Tornando o tema acessível para alunos e professores
Lau disse que levar as mudanças climáticas para as salas de aula em Oklahoma é ainda mais complicado pelo fato de que a agricultura — responsável por quase 12% das emissões globais — e os combustíveis fósseis estão entre as principais indústrias do estado.
“Muitas vezes é: ‘Sabe, meu pai está apenas tentando ganhar a vida, estamos tentando alimentar nossa família, manter um teto sobre nossas cabeças’. Isso se torna pessoal.” No caso de Lau, ter familiares em ambas as indústrias a ajudou a abordar o que ela chama de temas “delicados” com seus alunos. “Acho que isso os deixa à vontade.”
Essa abertura não é vista em todos os professores do estado – especialmente quando o governo que ocupa a Casa Branca é tão firme em sua negação das mudanças climáticas. Mas Lau, assim como seu colega Jeff Grant, em Illinois, está determinada a insistir nessa tecla.
Ambos estão empenhados na criação de recursos e na divulgação do assunto, da maneira que podem. Grant, por exemplo, organizou uma conferência de um dia para centenas de educadores aprenderem sobre ciência climática. Lau disse que um evento semelhante seria difícil de realizar em Oklahoma, um estado “profundamente conservador”.
“Muitos professores se sentem mais censurados do que nunca no clima político atual”, disse ela. “Acho que, neste momento, eles sentiriam que isso os colocaria em algum tipo de lista.”
Com quase três décadas de carreira, ela está disposta a falar por aqueles que estão apenas começando, porque a crise climática, segundo ela, precisa ser discutida e despolitizada.
“Não se trata de difamar indivíduos. Não é uma questão de moralidade. Não é uma questão de identidade. É a maior crise existencial da humanidade.” E é também, acrescentou ela, uma oportunidade de dizer aos seus alunos que, embora os seres humanos sejam a causa de muitas das coisas que estão acontecendo em nosso planeta, eles também podem ser a solução.
É uma mensagem que reverbera nas atitudes de Jeff Grant, que está planejando outra conferência de ensino para o próximo ano chamada H.O.P.E (How Our Planet is Evolving, ou Como nosso planeta está evoluindo). Ele espera um público ainda maior do que no ano passado.
“Acho que a maioria dos professores está no mesmo barco”, disse ele. “Estamos todos tentando ajudar as crianças a navegar melhor pelo mundo.”
