Vários países ocidentais planejam reconhecer o Estado palestino durante a Assembleia Geral da ONU. A Alemanha, aliada de Israel, não está entre eles. Mas o governo alemão, no entanto, está cada vez mais sob pressão.Nesta segunda-feira, 22 de setembro, em Nova York, à beira do rio Hudson, será chegada a hora. Em meio a Assembleia Geral da ONU, França, Canadá, Bélgica e provavelmente o Reino Unido, devem reconhecer o Estado palestino. O objetivo é pressionar Israel a encerrar a guerra na Faixa de Gaza e iniciar um novo processo de paz.

Quase 150 dos 193 membros da ONU já reconheceram o Estado palestino, com a França, o Reino Unido e o Canadá, pesos pesados do G7 – o grupo das sete nações industrializadas mais ricas do planeta – devem se juntar a eles. Os Estados Unidos, por outro lado, rejeitam terminantemente a medida, assim como Israel, cujo primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, argumenta que isso seria isso “uma recompensa ao terror” do grupo radicalHamas. “Não haverá um Estado palestino. Essa terra nos pertence”, disse Netanyahu na semana passada.

Para a Autoridade Palestina, o reconhecimento por parte de nações tão importantes seria um ganho de prestígio e, para Israel, uma derrota diplomática, especialmente agora, em meio à escalada do conflito em Gaza e a expansão de colônias na Cisjordânia ocupada.

Pré-requisito irrealista: a solução de dois Estados

O governo da Alemanha, no entanto não pretende se juntar aos países que vão reconhecer um Estado palestino. “Não nos uniremos a esta iniciativa”, disse o chanceler federal Friedrich Merz, da conservadora União Democrata Cristã (CDU), em agosto.

A justificativa de Merz foi de uma natureza mais formal. “Atualmente, não consideramos que os pré-requisitos para o reconhecimento estatal estejam preenchidos de forma alguma.” Na visão do chanceler federal, o reconhecimento deve ser a etapa final em um processo de paz que levaria a uma solução de dois Estados.

O problema, porém, é que a solução de dois Estados não está no horizonte. Desde os ataques terroristas do Hamas em Israel, em 7 de outubro de 2023, e a subsequente ofensiva israelense na Faixa de Gaza, que ainda está em andamento, as chances de isso acontecer são praticamente nulas. Os críticos, portanto, acreditam que o governo alemão simplesmente apresenta essa exigência irrealista do reconhecimento estatal para evitar tomar uma decisão.

As lágrimas de Friedrich Merz

O governo alemão se vê em um dilema particular em relação ao tema Israel e Palestina. Diante dos milhões de judeus assassinados durante a era nazista, grande parte da classe política alemã sente uma responsabilidade especial pela segurança de Israel, que normalmente é descrita como uma “razão de Estado”. Embora não exista oficialmente na Constituição alemã, a “razão de Estado” é regularmente invocada por grande parte da classe política do país europeu para justificar o apoio aos israelenses e as relações estreitas com Israel.

Para Merz, isso é obviamente mais do que apenas palavras. Ao discursar há alguns dias na reabertura de uma sinagoga em Munique destruída pelos nazistas, Merz mal conseguiu conter as lágrimas ao afirmar: “Desde 7 de outubro, temos vivenciado – vocês têm vivenciado – uma nova onda de antissemitismo, em velhas e novas formas; flagrante e mal disfarçada; em palavras e ações; nas redes sociais, nas universidades, em espaços públicos”. Isso o envergonhou, disse Merz, visivelmente lutando para manter a compostura.

O chanceler federal, no entanto, separa a luta contra o antissemitismo de sua avaliação das políticas de Israel, especialmente das ações militares israelenses na Faixa de Gaza. Em outros cenários, Merz criticou duramente esses aspectos e, como consequência, suspendeu todas as exportações de armas para Israel que poderiam ser usadas na guerra no enclave palestino, mas manteve outros contratos militares, especialmente no setor naval.

Em uma cerimônia que marcou o 75º aniversário da fundação do Conselho Central dos Judeus na Alemanha, Merz declarou que “críticas às políticas do governo israelense devem ser possíveis; podem até ser necessárias. Discordar sobre o assunto não é deslealdade à nossa amizade.”

Pressão interna e externa

Mas a pressão sobre o governo alemão para que adote uma posição mais firme vem aumentando, por exemplo, por parte da União Europeia (UE). A chefe da diplomacia da UE, Kaja Kallas, exige que a Alemanha tome parte nas sanções contra Israel. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, por exemplo, propõe que a UE suspenda acordos comerciais com Israel.

Para Jens Spahn, líder da bancada parlamentar da CDU de Merz no Bundestag (Parlamento), isso traz lembranças dos capítulos mais sombrios da história alemã. “Qual será o resultado então? ‘Não comprem mais de judeus’? Já tivemos tudo isso antes”, afirmou à emissora alemã ZDF, aludindo aos chamados nazistas por boicotes a empresas judaicas na década de 1930. Quando se trata do tema de Israel e Gaza, especialmente na Alemanha, “o equilíbrio se perde rapidamente e cai em território antissemita”, afirmou Spahn.

A pressão também aumenta dentro do país. Os social-democratas que integram a coalizão de governo ao lado da CDU, podem certamente cogitar sanções.

O Partido Verde, da oposição, vai ainda mais longe. Sua líder, Franziska Brantner, disse à agência alemã de notícias DPA que Merz e o Ministro alemão do Exterior, Johann Wadephul (também da CDU), devem tomar uma decisão. “Eles se aliam às forças comprometidas com a paz para todos os povos de Israel e também da Palestina? Ou ficam de braços cruzados enquanto o governo israelense, parte do qual é extremista de direita, continua a causar estragos em Gaza, enquanto a perspectiva de paz e a libertação dos reféns [israelenses em Gaza] se torna cada vez mais remota?”

Uma aliança de dezenas de organizações da sociedade civil também está pedindo ao governo alemão, através de uma petição, que dê continuidade às suas críticas a Israel por meio de ações.

Maioria na Alemanha é a favor do reconhecimento

O reconhecimento do Estado palestino, porém, é uma questão diferente. O chanceler federal parece estar firme em sua posição, embora aparentemente tenha a maioria da população alemã contra ele. Uma pesquisa do instituto Forsa realizada no início de agosto relevou que 54% dos alemães eram a favor do reconhecimento, enquanto 31% eram contra.

O não reconhecimento nem sempre foi a regra na história alemã, ou pelo menos em parte da história. A antiga Alemanha Oriental comunista, por exemplo, reconheceu o Estado palestino em 1988, mas a dissolução do país dois anos depois e sua unificação com a Alemanha Ocidental posteriormente anularam o reconhecimento.

Agora, com aliados próximos da Alemanha, como França, Reino Unido e Canadá, mudando de lado, a Alemanha ficará ainda mais na defensiva. Os Estados Unidos, em particular, permanecem no mesmo “campo” da Alemanha – o que não facilita necessariamente as coisas para o governo alemão em termos diplomáticos, dada as polêmicas recentes criadas por Donald Trump.

Os Estados Unidos, onde se localiza a sede da ONU, estão impedindo a entrada no país de Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina. Portanto, mesmo com vários países planejando usar a Assembleia da ONU em Nova York para reconhecer o Estado palestino, Abbas não poderá usar o evento como uma plataforma.